Associação quer “apoiar projetos de países menos desenvolvidos”

por Filipa Rodrigues
Catarina Brites Soares

A cooperação entre a Lusofonia, a China continental e Macau no campo científico foi o que levou à recém-criada Associação de Promoção da Ciência. A direção defende que a cidade só tem a ganhar com a iniciativa. “Se a associação puder apoiar projetos – que obrigatoriamente vão ter de passar por Macau e colocar investigadores daqui a trabalhar em conjunto com os da Lusofonia e da China – a cidade beneficiará dos frutos desses projetos”, afirma David Gonçalves.

Faz uso de um dos slogans mais repetidos pelo Governo para promover Macau, lá fora e cá dentro. A intenção de fazer da região uma ponte entre a China e os Países de Língua Portuguesa (PALOP) é muitas vezes apenas isso: um slogan. A Associação de Promoção da Ciência quer concretizá-lo. “Uma das principais razões de existência desta associação é precisamente a de acharmos que Macau é o local que quer ser uma plataforma entre a China e os países de língua portuguesa, mas que muitas vezes falta materializar esses projetos ou ficam pouco visíveis. A associação visa dar mais dinamismo a essa ideia, neste caso no campo científico”, afirma David Gonçalves, eleito presidente da direção para os próximos três anos.

“É frequente haver dificuldades em aspetos tão simples como a comunicação e pontos de contacto. Os investigadores da China têm dificuldade com o mundo lusófono e vice-versa. Nesse aspeto, acho que Macau pode ajudar. Estamos habituados a fazê-lo”, defende.

A associação vai apoiar atividades que tenham relação com o mundo sino-lusófono, mas que incluam Macau, vinca o biólogo. “Não estamos focados em projetos que existam entre a China e os PALOP, não é esse o nosso foco”, diz.

Apesar de criada em 2019, a entidade só agora começa a dar os primeiros passos. Ainda numa fase embrionária – a direção foi eleita há um mês -, a missão está definida e começará pela recolha de ideias para o primeiro triénio, alargar a base de sócios e arranjar recursos para levar a cabo as iniciativas que podem ser reuniões científicas, investigações, seminários, ações de formação, entre outros. “Há uma série de ideias em cima da mesa que vamos ter de escrutinar e ver quais são mais interessantes e exequíveis”, sublinha Gonçalves.

Macau em contacto

Das Humanidades às Ciências Sociais, passando pelas ciências puras, todas as áreas estão abrangidas. “A ideia é acolher os projetos interessantes que tenham esta componente de colaboração entre investigadores localizados nos PALOP e no domínio chinês. Esse é o ADN da associação: apoiar colaborações, mas não as que estão a decorrer só num lado”, vinca o também professor na Universidade de São José.

David Gonçalves explica que as parcerias já existiam, mas ao nível das universidades. O objetivo agora é criar uma estrutura que consiga agregar todos esses projetos que estão a correr de forma individual e que implicam cooperação nas geografias vitais.

Além deste, houve outro motivo para avançar com o grupo: “Achar que existem obstáculos dentro das universidades e outras entidades, que têm a ver com procedimentos, que dificultam a colaboração, assinala. “Uma associação seria uma forma de os ultrapassar”, defende.

No site estará disponível uma rede de representantes de universidades da China continental e do mundo lusófono que serão os responsáveis por fazer a ponte. “A ideia é que outras associações e universidades se associem através de um ponto de contacto. São essas pessoas que vão estabelecer a relação entre investigadores”, detalha David Gonçalves, com a ressalva de que também pode haver sócios institucionais. 

Por agora, estão incluídas todas as universidades locais: a de Macau, de São José, de Ciência e Tecnologia, e da Cidade de Macau.

Disparidades à parte

O presidente da associação sublinha o sentido de oportunidade já que, realça, se nota que Macau tem vindo a evoluir no que respeita à Ciência – uma consequência que associa tanto ao apoio do Governo a projetos que têm lugar na região, como aos que são feitos em conjunto com a China, Portugal e outros territórios. “Basta olhar para os índices de produtividade científica, que têm vindo a aumentar ao longo dos anos. Diria que a ciência em Macau está num ponto interessante, tem vindo a madurar, a desenvolver-se e creio que Macau vai beneficiar desse investimento que está a fazer na ciência”, prevê.

São conhecidas as clivagens entre uns e outros pontos que a Associação pretende aproximar. Se a China assume a dianteira no que respeita à aposta na Ciência, grande parte dos PALOP – sobretudo os territórios africanos – estão bem longe do topo da tabela dos rankings de desenvolvimento científico. O da Nature – revista internacional que publica os melhores trabalhos de investigação sobre Ciência e Tecnologia – coloca o Continente em segundo lugar em termos de investigação científica, depois dos Estados Unidos que lideram a tabela referente a 2020. Nos primeiros 50 países, só Brasil e Portugal aparecem.

A Academia de Ciências da China, em Pequim; a Universidade de Ciência e Tecnologia da China, em Hefei; a Universidade de Pequim; a de Tsinghua, igualmente na capital; e a de Nanjing são indicadas como as instituições de topo no país em todos os campos das Ciências Naturais. Também estão entre as 25 melhores do mundo no ranking da revista da especialidade.

David Gonçalves olha para as disparidades como mais um argumento que fundamenta a relevância do coletivo. “Podemos de alguma forma ajudar a desenvolver a ciência onde ela ainda está pouco ou menos desenvolvida através das parcerias com quem já está noutro patamar. Apoiar trabalhos que de alguma forma permitam o desenvolvimento de países menos desenvolvidos, sob o ponto de vista científico e através da ciência, é uma das missões da associação”, vinca. As diferenças ao nível de recursos – incluindo de acesso a financiamento – fazem David Gonçalves reiterar a mais-valia das parcerias. “Para algumas áreas científicas importa muito ter acesso a geografias vastas e esta rede permite chegar quase ao mundo todo. Ter uma rede de investigadores que estão localizados em todas estas geografias permite desenvolver investigações interessantes, mesmo existindo essa disparidade ao nível da velocidade de desenvolvimento da ciência dos países. Mesmo assim pode ser curioso colocar investigadores a trabalhar em colaboração para determinadas questões científicas”, refere. “Projetos conjuntos são benéficos para todos”, conclui.

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