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Rua das Estalagens: Uma Rua de Património e Mudança

Ao longo dos séculos, a Rua das Estalagens foi ponto de encontro de comerciantes chineses e portugueses, palco de inovações industriais e testemunha de incontáveis mudanças sociais, económicas e políticas. No seu auge, era a alma pulsante do comércio local. Agora, é um microcosmo onde a tradição coexiste com a modernidade, forjando um futuro onde a história não é esquecida

Plataforma Studio
Outrora um centro movimentado de artesãos e comerciantes, a Rua das Estalagens acolhe agora uma nova vaga de empreendedores que misturam tradição com novas ideias. A Sands China lançou uma publicação bilingue In Search of Its Roots – An Illustrated History of Rua das Estalagens, revelando as histórias desta rua e convidando os residentes e visitantes de Macau a redescobrir as suas lojas centenárias e atmosfera cultural. Todos os meses, o Plataforma e a Sands China destacam a comunidade, os negócios e os esforços de revitalização que propõem dar nova vida a uma das ruas mais antigas de Macau. Através de histórias cativantes, exploramos a sua transformação, honrando o seu passado enquanto moldamos o seu futuro. Cada reportagem será publicada em chinês, inglês e português na última sexta-feira de cada mês em formato impresso e digital.

Um Olhar Histórico

Rua das Estalagens

A Rua das Estalagens era a principal ligação entre o Porto Interior e o centro urbano de Macau. Até à inauguração da Avenida de Almeida Ribeiro em 1918, era o trajeto mais movimentado por comerciantes e trabalhadores. Crónicas Macaenses

A história da Rua das Estalagens começa em 1557, com a chegada dos portugueses. Nessa altura, nem sequer uma rua era; apenas um lamaçal conhecido como “Chou Toi” (pilha de erva), pois lá se descarregava lenha e ervas vindas do Rio Xijiang, com destino à Rua da Palha, para servir de combustível, construção de abrigos e para alimentar os cavalos e mulas dos militares.

A sua função muda em 1684, com o levantamento da proibição marítima a comerciantes estrangeiros na dinastia Qing. Macau consolidou-se como um dos pontos estratégicos do comércio chinês com o mundo e, à medida que o comércio crescia, aumentava a necessidade de infraestrutura, com os terrenos antes alagados a serem gradualmente reclamados.

Em diferentes épocas, reuniam-se aqui uma dúzia ou mesmo vinte lojas do mesmo setor, coisa que outros bairros antigos não tiveram

Siguo Chen, autor do livro In Search of Its Roots – An Illustrated History of Rua das Estalagens.

Durante a dinastia Ming, a Rua das Estalagens servia como zona de descarga de lenha e ervas, que originou o seu primeiro nome em cantonês de “Chou Toi”. Ilustração no livro In Search of Its Roots – An Illustrated History of Rua das Estalagens.

Em 1817, durante o reinado do imperador Jiaqing, um comerciante cantonês recebeu autorização do magistrado do condado de Xiangshan para construir as primeiras lojas permanentes na área. Pouco depois, seguiram-se outros comerciantes, resultando na criação de mais de 60 estabelecimentos comerciais na rua.

Este período marcou a transição de um mercado informal para uma rua comercial organizada, que rapidamente se tornou um dos principais polos económicos e políticos de Macau, juntamente com a Rua dos Mercadores e a Rua dos Ervanários.

“Em diferentes épocas, reuniam-se aqui uma dúzia ou mesmo vinte lojas do mesmo setor, coisa que outros bairrosl antigos não tiveram”, diz ao PLATAFORMA Siguo Chen, responsável por gravar a história da rua no livro In Search of Its Roots – An Illustrated History of Rua das Estalagens.

O nome “Rua das Estalagens” reflete a função que a rua assumiu ao longo do século XIX, à medida que as estalagens surgiram para acomodar comerciantes e viajantes que ali se detinham em trânsito.

A área consolidou-se como um eixo essencial para o comércio de tecidos e ourivesaria, atraindo alfaiates e joalheiros que serviam tanto a elite local como os mercadores estrangeiros.

Barcos de pesca paravam regularmente no Porto Interior para que os pescadores pudessem ir à Rua das Estalagens comprar ouro. Ilustração no livro In Search of Its Roots – An Illustrated History of Rua das Estalagens.

Entre os estabelecimentos de maior renome destacavam-se a Loja de Fazendas Ngan Kong e a Ourivesaria Tin Seng, ambas ainda em operação. Em 1893, a chegada do jovem médico Sun Yat-sen, que abriu a Farmácia Chong Sai, colocou a Rua das Estalagens na história política do país.

No início do século XX, a Rua das Estalagens consolidou-se como a principal ligação entre o Porto Interior e o centro urbano de Macau. Até à inauguração da Avenida de Almeida Ribeiro em 1918, era o trajeto mais movimentado para comerciantes e trabalhadores.

Durante a década de 1920, cerca de 75% da população (60.000) estava ligada à indústria piscatória, e as ourivesarias da Rua das Estalagens desempenhavam um papel crucial neste contexto. Para os pescadores, oferecer ouro aos familiares e amigos era um costume tradicional, sendo também a forma mais segura de armazenar riqueza durante as longas viagens no mar.

“Embora atualmente as lojas de ouro estejam mais concentradas em torno da Avenida de Almeida Ribeiro e da Avenida do Infante D. Henrique, entre cerca de 1900 e 1990, a Rua das Estalagens foi muito próspera. Mesmo depois da inauguração da Avenida de Almeida Ribeiro, ainda havia mais lojas de ouro concentradas na Rua das Estalagens”, conta Siguo Chen, lembrando como esta rua “contribuiu significativamente para a economia de Macau e ocupou uma posição muito importante na história secular de Macau.”

A memória da Rua das Estalagens mantém-se viva, misturando hoje edifícios e negócios centenários com novos empreendimentos. Plataforma

A rua começa a perder a sua influência na segunda metade do século XX, quando Macau passou por um processo de modernização e descentralização comercial. Com a realocação do terminal de carga do Porto Interior, surgiram novos polos comerciais, desviando o fluxo de clientes para outras áreas da cidade.

O setor têxtil, outrora um dos mais fortes na Rua das Estalagens, perdeu força com a industrialização e a concorrência dos centros comerciais modernos.Muitas lojas encerraram e o dinamismo da rua diminuiu, pesando ainda a pandemia de Covid-19, mais recentemente.

Contudo, a memória da Rua das Estalagens mantém-se viva, misturando hoje edifícios e negócios centenários com novos empreendimentos, fruto do programa de revitalização encabeçado pela Sands China.

Este esforço, que conta também com o apoio do Governo e da própria comunidade, procura devolver à Rua das Estalagens o seu antigo esplendor, respeitando o seu passado enquanto se adapta às novas exigências do futuro.

Mudar o Futuro

Em abril do ano passado, a Sands China Ltd. dava um dos primeiros passos na revitalização da Rua das Estalagens. A concessionária lançava o Programa de Recrutamento para Empreendedores. Houve 600 participantes e 120 aplicações elegíveis e, no fim, foram escolhidos sete projetos. Desde 15 de julho de 2024, seis já se encontram a operar na Rua das Estalagens, com o sétimo a abrir portas até ao verão.

Mas não são apenas os novos empreendimentos que beneficiam. Várias das fachadas das lojas tradicionais foram pintadas, numa parceria entre a Sands China e a Macau Artist Society, com o objetivo de criar um novo ecossistema na área.

Outro aspeto importante é o envolvimento da comunidade no novo capítulo. A Sands China tem trabalhado com a Associação de Beneficiência de Assistência Mútua dos Moradores das 6 Ruas «Chou Toi», garantindo que a renovação respeita aqueles que ali vivem e trabalham há décadas.

Mais do que um local de passagem, o projeto visa que a Rua das Estalagens volte a ser um ponto de encontro. A sua nova era está a ser escrita, como um símbolo de resiliência, para esta e futuras gerações.

“Com o passar do tempo, a Rua das Estalagens tornou-se ainda mais preciosa pelo seu espírito comunitário e património únicos. Percorrê-la é como recuar no tempo, enquanto o sentido de comunidade e o apoio de vizinhança das gerações anteriores se mantêm intactos. As lojas que ainda se mantêm ao longo da rua não são apenas locais de negócio; são tesouros de nostalgia do bairro e de memórias partilhadas, guardando inúmeras histórias fascinantes para aqueles que dedicam algum tempo a explorá-las”, pode ler-se no prefácio da Sands China Ltd. Em In Search of Its Roots – An Illustrated History of Rua das Estalagens.

Saiba mais sobre In Search of Its Roots – An Illustrated History of Rua das Estalagens

  • Produtor: Sands China Ltd.
  • Editora: Associação dos Artistas de Macau
  • Autor: Siguo Chen
  • Ilustradora: Shirley Lu
Na edição de 25 de abril, leia sobre como os líderes comunitários estão a participar na revitalização da Rua das Estalagens.

Veja também a versão impressa do Special Report

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