Saída da F3 é “despromoção” da imagem internacional

A substituição da prova de Fórmula 3 por um escalão inferior é uma “despromoção” do nível desportivo do Grande Prémio de Macau e da sua imagem internacional, segundo o antigo presidente do Instituto do Desporto, Manuel Silvério. O mesmo pede que a organização do evento passe para uma concessionária ou secretariado permanente que possa negociar diretamente com a Federação Internacional de Automobilismo. O piloto local, André Couto, estranha a justificação dada para a mudança, mas acredita que o “espetáculo” vai continuar

por Gonçalo Lopes
Nelson Moura

Macau vai “perder” a Fórmula 3, revelou esta semana a Federação Internacional de Automobilismo (FIA). No seu lugar, será realizada a Fórmula Regional. No comunicado, garante que o evento torna-se “mais acessível do que nunca, abrindo-o a um vasto conjunto de potencial pilotos que competem regionalmente”. Por outro lado, “a F3 de Macau construiu a sua reputação lendária como um evento que reuniu os melhores pilotos juniores das séries nacionais de todo o mundo naquele que é o circuito de rua mais desafiante do mundo. A mudança para máquinas de Fórmula Regional revive esse espírito e é uma ótima solução a longo prazo”, pode ler-se.

É necessário lembrar que o contrato assinado entre a FIA e a Comissão Organizadora do Grande Prémio (COGPM) para a F3 era válido por mais dois anos – foi assinado em novembro de 2023. Sendo assim, Macau deixa de receber uma prova que chegou à cidade em 1983, e só não marcou presença durante a pandemia, nas edições de 2020 a 2022.

No rescaldo do comunicado da FIA, a COGPM indicou que os veículos utilizados na Fórmula Regional seriam os “mais adequados para competir” no Circuito da Guia. “Após análise da FIA, a prova será denominada por FIA Formula Regional World Cup e Macau continuará a ser o único anfitrião mundial desta modalidade da Taça do Mundo da FIA e irá atrair os pilotos internacionais de topo para competirem em Macau.” A 71.ª edição do Grande Prémio de Macau irá realizar-se entre 14 e 17 de novembro.

Manter a emoção

André Couto, piloto de Macau que ganhou a competição F3 na edição local de 2000, estranha o argumento utilizado – que na sua opinião se centra na segurança da prova -, destacando as competições de F3 no Mónaco, um circuito urbano, tal como Macau. “Se o F3 corre no Mónaco, também pode correr em Macau. Se é a segurança, não acho que seja assim um grande motivo, deve haver outra história por detrás”, diz.

“A Fórmula Regional vem ocupar um patamar abaixo da F3 internacional”
André Couto, piloto de Macau

Em termos do carro em si, o piloto aponta que basicamente a Fórmula Regional tem menos ‘downforce’, menos potência e um chassis diferente, mas é uma competição “bem mais barata” de participar para as equipas.

“Uma época de F3 internacional na Europa custa 1.5 milhões de euros, enquanto a Fórmula Regional é mais ou menos 600 mil euros”, explica. Mesmo assim, nota que como todos os pilotos que correm na Fórmula Regional são também os que irão correr no F3 internacional, o nome muda, mas a “competitividade e espetáculo” vão continuar no Circuito da Guia. Contudo, acredita que o prestígio da prova será afetado.

“No cenário de desportos motorizados e dentro da pirâmide da FIA temos os campeonatos de karting, F4, Fórmula Regional, F3, F2 e F1. Portanto, a Fórmula Regional vem ocupar um patamar abaixo da F3 internacional”, aponta.

“Despromoção” a resolver com privatização

Para o antigo Presidente do Instituto de Desporto de Macau (IDM), Manuel Silvério, a mudança é uma óbvia “despromoção”, não só em termos desportivos, mas também da projeção internacional da cidade. “A Fórmula 3 foi organizada em Macau a partir de 1983, ano em que o Ayrton Senna se sagrou campeão. Depois de tantos investimentos e dependência para com o Grande Prémio no cartaz turístico de Macau, este é um balde de água fria”, frisa.

O antigo dirigente, que presidiu o IDM entre 1996 e 2008, também estranha a decisão, tendo em conta o compromisso de três anos existente com a FIA. “Neste caso ou faltou diálogo, ou capacidade de diálogo. Depois da pandemia, a própria FIA estabeleceu um novo contrato para Macau de três anos para a F3, e o primeiro já foi realizado”, salienta. “Se existe esse contrato, deve ser cumprido e as alterações devem ser acordadas por ambas as partes. Ou houve uma decisão unilateral da FIA, ou esta alteração teve concordância de Macau”, comenta.

Neste caso ou faltou diálogo, ou capacidade de diálogo. Depois da pandemia, a própria FIA estabeleceu um novo contrato para Macau de três anos para a F3

Manuel Silvério, antigo presidente do Instituto do Desporto

O PLATAFORMA tentou saber junto do Instituto do Desporto se a decisão para a substituição foi acordada pelas duas partes ou se o contrato acabou por não ser cumprido pela FIA, mas não obteve resposta até ao fecho da edição.

O antigo presidente do IDM associa também o problema à própria estrutura à volta do Grande Prémio, que ao longo do tempo passou da alçada do Instituto de Assuntos Municipais para o Instituto do Desporto, mas sempre dependente da estrutura, mais profissional, da FIA. “Macau nunca mandou muito no Grande Prémio; muitas vezes por culpa própria, pois faltou profissionalização ou formação para a Comissão Organizadora.

Atualmente a COGPM é presidida pelo Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura e é constituída por membros de entidades públicas que vão desde os Serviços de Saúde e a Direcção dos Serviços de Obras Públicas, à Associação Geral de Automóvel de Macau-China.

De maneira a resolver esse problema, sugere a criação de um secretariado permanente – focado apenas na prova -, ou a “privatização”, através de uma concessão pública. “O Grande Prémio merece este investimento. Já no passado se investiu tanto, mas foi apenas na montagem do circuito. O investimento deve ser feito acima de tudo no segmento humano e técnico”, sublinha.

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