Na primeira sessão do ciclo de quatro conferências – Plataforma Talks – que esta semana assinalou na Fundação Rui Cunha os dez anos deste jornal, Oriana Pun, sócia da PCC e secretária-geral da Associação de Advogados; e Frederico Rato, sócio fundador da Lektou, com escritórios em Macau, Hengqin e Lisboa, concordaram com a proteção dos advogados locais contra a concorrência externa. Antes defendem a multiplicação de redes entre profissionais de várias jurisdições e mercados – de língua chinesa e portuguesa, mas não só – como oportunidade de crescimento para os escritórios de Macau; dessa forma contribuindo para a plataforma lusófona e a internacionalização.
A China vê mais longe que nós; olha para nós como pessoas especiais, preciosas, que falam chinês, português, inglês…Muitas vezes nós é que não temos essa consciência”
Oriana Pun, sócia-gerente da PCC e secretária-geral da Associação de Advogados
Frederico Rato levanta mesmo a dúvida de saber se “há – ou não – um problema com a internacionalização”. Porque “há muito que Macau deixou de ser uma vila de pescadores para se transformar num porto de comércio internacional de trocas, não só de bens, mas também de ideias, conhecimento, culturas… e, até, tecnologias”. Circunstância, essa, preservada mesmo em momentos difíceis como a Revolução Cultural. Em 1966, quando “muitos pensaram que os guardas vermelhos em Macau eram uma ameaça, eles estavam ali para barrar” eventuais excessos revolucionários. Hoje em dia, conclui, a ambição renovada dessa cidade internacional precisa apenas de “apoio e medidas dos governos Central e local”; uma vez que “a História, e a própria diversidade da população”, garantem essa condição.
“Há muito que Macau deixou de ser uma vila de pescadores para se transformar num porto de comércio
internacional e de trocas, não só de bens, mas também de ideias, conhecimento, culturas… até de tecnologias
Frederico Rato, sócio fundador da Lektou
Oriana Pun considera “muito importante” um terceiro eixo: “A mudança de mentalidade”; porque “a oportunidade existe, o conhecimento e a capacidade também”. O que é preciso, diz, é “vermos a ‘big picture’”, seguindo o guião da China, que “vê mais longe que nós; olha para nós como pessoas especiais, preciosas, que falam chinês, português, inglês… Muitas vezes nós é que não temos essa consciência”. Nascida em Macau, de origem chinesa, desde muito cedo estudou português, e considera o “bilinguismo muito importante” para Macau. Mas também o seu sistema jurídico, fundado nos Grandes Códigos, de filosofia jurídica romano-germânica. “Por ser um sistema semelhante ao da China, ao de Portugal, e de outros Países de Língua Portuguesa, é fácil de ser percebido” por outras jurisdições. Por outro lado, é “claro e transparente”, com “as decisões da segunda e terceira instâncias divulgadas publicamente”. A “defesa intransigente da independência dos tribunais, que não dependem da ratificação de instâncias da China”, é aliás destacada por Frederico Rato” como “essencial” para a credibilidade internacional e confiança do investimento.
A mudança de mentalidades que Oriana Pun defende tem a ver com uma cidade “habituada a viver em paz, satisfeita com o que tem”, mas “pouco dada à concorrência e à luta por novas conquistas”. Por isso; “se queremos agir no cenário internacional, temos que trabalhar para isso; promover o nosso sistema jurídico, participar em conferências internacionais, acompanhar empresas chinesas no exterior; não só nos Países de Língua Portuguesa, mas em todo o mundo”.