“Nunca deixámos de investir em Macau” – Wilfred Wong Vice-Presidente do Conselho Administrativo da Sands China

Em 2004 a Sands Macao veio mudar o jogo. Em 2007 o The Venetian Macao inaugurou o que é hoje o Cotai Strip. Ao longos dos anos, a Sands China foi lançando as primeiras pedras da Las Vegas asiática. São 20 anos de desenvolvimento, partilhando os frutos com a população local.

por Nelson Moura
Guilherme Rego

Em entrevista ao PLATAFORMA, o vice-presidente do Conselho Administrativo, Wilfred Wong, aborda o futuro sob as novas concessões – do que está feito e o que está para vir. “Investir cada vez mais” na diversificação económica, alicerçando-se na contínua formação de talentos locais. “Queremos que sejam líderes”

“Se não acreditássemos no nosso futuro em Macau, não faríamos todos estes investimentos”

– Comemoram-se os 20 anos da Sands Macau, seguidos do crescimento da Sands China. É justo estabelecer um paralelismo com o desenvolvimento de Macau?

Wilfred Wong – Sim, os últimos 20 anos foram de liberalização do jogo e tivemos a sorte de poder operar em Macau como uma das concessionárias. O nosso desenvolvimento nestas duas décadas é quase sinónimo do “novo” desenvolvimento de Macau em termos de resorts integrados e jogo. Cada vez que abrimos um novo estabelecimento, é um marco. Há 20 anos abrimos o Sands Macau, inaugurámos a Venetian Macau em 2007 e isso mudou imediatamente a paisagem do Cotai Strip. Nessa altura éramos os únicos no Cotai.

O que se vê hoje é realmente notável. Nunca deixámos de investir em Macau e mesmo durante a pandemia continuámos a construir (The Londoner Macao). Acreditamos no futuro de Macau e sabíamos que, apesar de estarmos temporariamente fechados, voltaríamos a abrir ao mundo e seríamos os primeiros a oferecer novos produtos.

Na verdade, somos cinco ou seis empresas numa só, ao combinar MICE, hotéis, entretenimento, retalho… até transportes temos.

Estamos muito satisfeitos por termos trazido o modelo de resort integrado, que tem estado a funcionar com muito sucesso em Las Vegas. O Governo apoia muito o que fazemos. O objetivo é proporcionar aos nossos clientes uma experiência total e ininterrupta quando vêm a Macau. Penso que estabelecemos este modelo, e os outros operadores também o estão a fazer, porque querem manter-se competitivos.

Quando começámos a perceber que em muitas alturas [as PME] não conseguiam vender os seus produtos, especialmente no Ano Novo Chinês, começámos a organizar o Sands Shopping Carnival gratuitamente.” 

– No início de 2020, Macau foi confrontada com uma nova realidade. Enquanto outros países e regiões abriram gradualmente, a cidade permaneceu “fechada” por 3 anos. Para uma empresa de turismo e lazer, devem ter sido anos muito difíceis. Que lições podem servir no futuro?

W.W. – Aprendemos que somos uma parte integrante de Macau e não conseguimos operar sozinhos. Estamos agora a recuperar desses três anos e queremos que os nossos atuais 26.000 trabalhadores saibam que a nossa prioridade é assegurar o seu emprego. Em segundo lugar, sempre quisemos cuidar das PME. Com a pandemia, muitas das nossas aquisições diminuíram de volume, mas telefonámos aos nossos colaboradores – cerca de 2.000 – e perguntámos-lhes como é que podíamos ajudar. Cerca de 20% das nossas aquisições diárias provêm das PME, pelo que queremos protegê-las.

Por outro lado, quando começámos a perceber que em muitas alturas não conseguiam vender os seus produtos, especialmente no Ano Novo Chinês, começámos a organizar o Sands Shopping Carnival gratuitamente. Todas as PME e retalhistas são bem-vindas. Este é o quinto ano que organizamos esta iniciativa que, durante 4 dias, recebe cerca de 10.000 visitantes. Está a tornar-se numa marca por si, e funciona tanto para a população local como para os turistas.

Além disso, como Macau quer ser conhecida como uma cidade de gastronomia, abrimos vários restaurante logo após a Covid-19, como o Gordon Ramsay, ou o Mews. Temos tudo, é só escolher. Também sublinho que não deixámos de treinar a nossa equipa. Temos os produtos, mas também precisamos do serviço. Continuámos a ter todos estes cursos e formámos as pessoas para que tivessem a opção de progredir horizontalmente. Houve cerca de mil empregados que optaram por trabalhar noutras áreas que não a sua função original. Sentimos que foi um período muito difícil, mas aprendemos que somos uma parte muito importante do tecido social e que tudo o que fazemos tem impacto na comunidade.

– Em 2022, foram assinadas as novas concessões, com o Governo a colocar grande ênfase no papel reforçado das concessionárias para a diversificação económica. Isto representa uma grande mudança na estratégia da Sands China?  

W.W. – Sempre que o Governo decide um caminho, temos de ajustar a nossa estratégia. Felizmente, como a Sands China sempre se baseou num modelo de resort integrado, já somos diversificados. Apenas 4% do nosso espaço é dedicado ao jogo, os outros 96% são hotéis, centros comerciais, teatros, lojas, restaurantes, etc. Na nova concessão comprometemo-nos a investir cerca de 30 mil milhões de patacas nos próximos 10 anos, e mais de 90% será em áreas não relacionadas com o jogo. Vamos construir um novo pavilhão MICE com 18.000 metros quadrados, ligado ao atual pavilhão de exposições do Venetian. Com salas maiores, também precisamos de analisar o número de quartos disponíveis para receber tanta gente. Estamos a fazer esse inventário com o Governo.  

Estamos a olhar para o futuro a longo prazo da empresa. Muitas destas [novas] instalações só serão concluídas no último ciclo da concessão.  

– Hengqin é uma possibilidade?  

W.W. – Estamos a analisar todas as possibilidades. O Governo está a dar-nos algumas indicações sobre onde poderemos aumentar o número de quartos. Mas ainda estamos a dar os primeiros passos. Não é algo que vá acontecer de um dia para o outro. Estamos a olhar para o futuro a longo prazo da empresa. Muitas destas instalações só serão concluídas no último ciclo da concessão. Se não acreditássemos no nosso futuro em Macau, não faríamos todos estes investimentos. Quando me perguntam se estamos confiantes relativamente ao futuro da Sands China em Macau, respondo que basta olhar para o que estamos a fazer. 

Se fizéssemos algo por nós próprios [nas zonas a revitalizar], estaríamos em concorrência direta com as PME e isso não é bom. 

– A Sands China será agora responsável pela requalificação urbana de várias zonas, nomeadamente a Rua das Estalagens. Qual é a sua opinião sobre estes projetos? 

W.W. – Foram-nos atribuídas algumas zonas com características muito diferentes, pelo que não há uma abordagem uniforme para a revitalização. Mas o que vamos fazemos é integrar o velho e o novo, para que o bairro não perca o seu carácter. Na rua que acabou de mencionar, olhamos para o que já existe. Há cerca de 90 fachadas de lojas e cerca de um terço está vago. Se fizéssemos algo por nós próprios, estaríamos em concorrência direta com as PME e isso não é bom.

Em vez disso, lançámos um programa de recrutamento: se forem empreendedores e apresentarem uma proposta de negócio com algum do vosso próprio dinheiro – limite mínimo de 300.000 patacas e máximo de 1 milhão de patacas -, serão submetidos a uma sessão de apresentação em que teremos um painel, constituído por funcionários do Governo, câmaras de comércio e outras entidades.

Se gostarmos do que estão a propor, se for inovador e enquadrar-se no ambiente, igualamos o capital inicial até uma a duas patacas. Ou seja, se tiveres meio milhão, nós damos-te 1 milhão, e ficas com 1.5 milhões. Também contactámos os bancos e dissemos: “Esta é uma empresa que têm de apoiar. Podem dar-lhes algum capital operacional”.

Assim, facilmente podem ter algo como 2 milhões para iniciar uma pequena empresa no local. Queremos garantir o seu sucesso, e pedimos a todos os senhorios que deixem estes empreendedores verem os locais vagos, para poderem decidir e negociar diretamente com os proprietários. A nós, cabe-nos ajudá-los a desenhar as propostas para apresentar ao painel de juízes. Temos 170 candidatos locais para 10/11 lojas.

No final deste mês terão de fechar o plano de negócios e em junho farão a apresentação e haverá a avaliação. Esperamos fazer o anúncio dos candidatos selecionados em julho. Esta é a nossa forma de garantir que a comunidade é revitalizada com novas ideias e que as PME beneficiam.  

Estamos em contacto com uma associação de artistas locais para [embelezarem as zonas a revitalizar]. Vamos pedir aos artistas para que olhem para as raízes, o passado das ruas que nos foram atribuídas, e que pintem os edifícios para aumentar o interesse dos turistas.  

– Será que isso chega para atrair os turistas? 

W.W. –  Para isso, também achamos importante embelezar as ruas. Estamos em contacto com uma associação de artistas locais para isso. Vamos pedir aos artistas para que olhem para as raízes, o passado das ruas que nos foram atribuídas, e que pintem os edifícios para aumentar o interesse dos turistas. 
Outra zona pela qual somos responsáveis, o Pátio da Eterna Felicidade, está agora a ser renovada pelo Governo. É um projeto de preservação. Vimos que já tem muitas atividades artísticas, com muitos artistas já com os seus ateliers. Estamos a pensar em criar uma aldeia de artistas, criando galerias, oficinas, e outras instalações.

Talvez pudéssemos também subsidiar os artistas para os ajudar a desenvolver as suas atividades. Gostamos de pensar que somos a semente e que, uma vez lançada, queremos garantir a sustentabilidade dos projetos. Isto é muito importante, porque não os podemos carregar durante muito tempo. A Antiga Fábrica de Panchões Iec Long, as Casas da Taipa, são projetos que também são da nossa responsabilidade e exigem uma abordagem diferente.

Quando estiver tudo feito, obviamente teremos de trabalhar com a comunidade na promoção daquela zona. E temos as nossas próprias vias, ao trazer operadores de grupos turísticos a Macau, ou a convidar celebridades, como o David Beckham, e levá-los a essas ruas e promover nas redes sociais.  

Estamos a dar todas as oportunidades às pessoas locais. Damos-lhes a melhor formação, não apenas competências profissionais, mas também competências de gestão e formação ética. Queremos que sejam líderes.

– Uma das preocupações da população é como se enfrenta todos estes novos desafios socioeconómicos, fazendo do emprego local uma prioridade. Têm uma estratégia para esse efeito? 

W.W. – Cerca de 92% da nossa equipa de gestão é constituída por pessoas locais. Há 20 anos era apenas 20%. Damos todas as oportunidades às pessoas locais. Damos-lhes a melhor formação, não apenas competências profissionais, mas também competências de gestão e formação ética. Queremos que sejam líderes. Temos pessoas que se juntaram a nós há 20 anos e que estão agora ao nível de vice-presidentes e a liderar departamentos inteiros.

Não estou preocupado com isso. Somos muito rigorosos no nosso planeamento de sucessão. Todos os anos, fazemos um exercício para nos certificarmos de que, sempre que houver necessidade, temos pessoas cá dentro que podemos promover. Neste momento, penso que a nossa média de horas de formação é quase o dobro do padrão mundial. Se o padrão mundial é, digamos, 50 horas de formação, nós fazemos, em média, 100 horas por cada empregado.  

Estamos também a trabalhar arduamente com o IPIM para garantir conferências internacionais, uma vez que demoram anos a decidir. Se ganharmos alguma conferência internacional importante, talvez as seis concessionárias tenham de se juntar, porque o número de quartos disponíveis será um desafio. 

– Turistas estrangeiros. Temos as infraestruturas necessárias? 

W.W. – Macau é a cidade com o maior número de hotéis de cinco estrelas no mundo. Ultrapassou Londres no ano passado. É essa a nossa posição atual. Temos de nos certificar de que o nosso padrão de serviço lidera a Ásia. É por isso que fazemos um grande esforço na formação da nossa equipa. Um ambiente de trabalho multicultural que é recetivo a turistas de todo o mundo é muito importante. Formação e recrutamento de pessoas com culturas diferentes permite-nos satisfazer as necessidades dos países estrangeiros.

Além disso, estamos a trazer operadores de grupos turísticos a Macau, temos representantes no estrangeiro para promover a cidade, vamos a exposições itinerantes no estrangeiro por nossa conta e em conjunto com a Direcção dos Serviços de Turismo. Fazemos tudo o que está ao nosso alcance. Também estamos a formar o nosso pessoal em línguas. Esperamos que a percentagem de turistas estrangeiros possa aumentar. Mas, obviamente, estamos a enfrentar uma situação difícil após a Covid-19. As viagens de longa distância ainda não são tão populares e vai levar algum tempo a retomar esse hábito.  

– No contexto da diversificação, Las Vegas é sempre apontada como um exemplo a seguir. Atualmente, mais de 60% das receitas de Las Vegas são extra-jogo. Na sua opinião, quais são as áreas em que Macau precisa de crescer para se aproximar destes números?  

W.W. – Las Vegas é uma capital do entretenimento. Não se trata apenas do jogo, mas também dos hotéis, MICE e entretenimento. Macau está a caminhar nessa direção. O Governo deu orientações sobre a forma como a indústria do jogo se deve desenvolver e estabeleceu limites. Esperamos investir cada vez mais em atividades culturais, eventos desportivos, gastronomia e na construção de novas instalações MICE. Estamos também a trabalhar arduamente com o IPIM para garantir conferências internacionais, uma vez que demoram anos a decidir.

Se ganharmos alguma conferência internacional importante, talvez as seis concessionárias tenham de se juntar, porque o número de quartos disponíveis será um desafio. Só temos 47.000 quartos, enquanto Las Vegas tem 150.000 quartos. E estas conferências maiores podem trazer, à vontade, até 10 mil pessoas. A Associação Internacional de Congressos e Exposições (ICCA, na sigla inglesa) fez aqui o seu congresso regional recentemente. E eles organizam estas atividades MICE a nível mundial, portanto são importantes para decidir se Macau está apto a receber grandes eventos no futuro.  

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