China repensa estratégia depois das eleições em Taiwan

O Presidente chinês, Xi Jinping, pede que o Partido Comunista faça mais para conquistar os corações dos taiwaneses, depois destes elegerem o candidato menos próximo de Pequim

por Gonçalo Lopes
Guilherme Rego

Lai Ching-te levou o DPP a uma vitória inédita em Taiwan, já que nunca um partido político tinha assegurado três mandatos consecutivos desde as primeiras eleições por sufrágio direto na ilha, em 1996. Mas também é um facto que o DPP perde cerca de 2.5 milhões de votos em relação aos conquistados pela anterior liderança, caindo inclusive a maioria absoluta na Assembleia, sendo agora obrigado a negociar as leis no arco parlamentar.

Lai promete continuar o trabalho da sua antecessora, Tsai Ing-wen, que não podia concorrer a um terceiro mandato. Lev Nachman, cientista político e professor assistente na Universidade de Chengchi, em Taipé, disse mesmo que “o apelo de Lai aos eleitores foi o de que ele seria Tsai 2.0”, conforme publicou nas redes sociais.

O DPP tem sido assertivo: Taiwan não é subserviente da China e o futuro da ilha deve ser determinado apenas pelos seus habitantes. A maioria dos 23 milhões de residentes defende a manutenção do ‘status quo’, evitando declarações formais de independência ou de ser parte integrante da China. Pequim cortou as comunicações com o Governo de Taiwan depois de Tsai ter sido eleita, em 2016.

Depois de ser conhecido o resultado, Xi virou o seu discurso para o Partido Comunista Chinês, pedindo que este faça melhor trabalho na conquista dos corações dos taiwaneses. As observações foram publicadas pela primeira vez no jornal do Partido Comunista Qiushi, segunda-feira passada.

Lai, em resposta aos resultados das eleições, pediu à China que percebesse que apenas a paz beneficia os dois lados. “Paz global e estabilidade depende da paz no Estreito de Taiwan”, disse, acrescentando que espera que a China entenda a situação, “porque também tem essa responsabilidade”.

Resposta de Pequim

Presidente chinês, Xi Jinping, apelou esta segunda-feira ao Partido Comunista Chinês para que
faça melhor trabalho na conquista dos corações dos taiwaneses.

Numa declaração após o resultado final das eleições, Chen Binhua, porta-voz do Gabinete de Assuntos de Taiwan do Conselho de Estado, indicou que a vitória de Lai e do DPP não representa a vontade da maioria dos taiwaneses. “Esta eleição não pode mudar o padrão básico e o desenvolvimento das relações através do Estreito, nem pode mudar o desejo comum dos compatriotas de ambos os lados do Estreito de Taiwan de se aproximarem.”

Chen acrescentou que o Continente continuará a trabalhar com os partidos políticos relevantes e grupos setoriais em Taiwan para desenvolver o intercâmbios e cooperação entre os dois lados do Estreito, nomeadamente no que toca à promoção da cultura chinesa, desenvolvimento pacífico, integração e reunificação nacional.

O Departamento de Estado dos EUA parabenizou a vitória de Lai nas eleições: “Mais uma vez, demonstraram a força do seu sistema democrático robusto”. Por outro lado, menciona que aguardam com expetativa “a oportunidade de trabalhar com o Dr. Lai e com os líderes de Taiwan de todos os partidos para promover os nossos interesses e valores comuns e para aprofundar a nossa relação não oficial de longa data, em conformidade com a política de Uma só China dos EUA, orientada pela Lei das Relações com Taiwan, pelos três Comunicados Conjuntos e pelas Seis Garantias. Estamos confiantes de que Taiwan continuará a servir de exemplo para todos os que lutam pela liberdade, democracia e prosperidade”.

Em resposta, o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros da China disse que o comunicado “vai contra o compromisso político dos EUA de manterem apenas relações culturais, comerciais e outros assuntos não oficiais com a região de Taiwan, e envia um sinal errado grave para as forças separatistas”.

Entretanto, Biden já veio acalmar as tensões, afirmando que “não apoia a independência de Taiwan”. Os Estados Unidos mudaram o reconhecimento diplomático de Taipé para Pequim, em 1979, e há muito que afirmam não apoiar uma declaração formal de independência de Taiwan. Mantêm, no entanto, relações não oficiais com a ilha e continua a ser o seu maior apoiante e fornecedor de armas.

Biden já havia perturbado o Governo chinês quando pareceu sugerir que os Estados Unidos defenderiam a ilha se esta fosse atacada – um desvio na posição de longa data de “ambiguidade estratégica”. Os seus comentários de sábado parecem ser um esforço para tranquilizar Pequim. Mesmo assim, Washington advertiu, poucas horas antes da abertura das urnas, que “seria inaceitável” que “qualquer” país interferisse nas eleições.

Perda diplomática

Um dos últimos aliados diplomáticos de Taiwan cortou as relações com a ilha a favor de Pequim, poucos dias depois das eleições. Nauru, uma pequena ilha da Micronésia, era um dos 13 países que ainda mantinham relações diplomáticas com Taipé.

“Este timing não é apenas uma retaliação da China contra as nossas eleições democráticas, mas também um desafio direto à ordem internacional”, afirmaram as autoridades de Taiwan depois de o Governo de Nauru ter anunciado que “já não reconhece [Taiwan] como um país separado, mas sim como uma parte inalienável do território da China”.

Em 2002, Nauru havia optado por uma mudança diplomática semelhante em relação à China, tendo posteriormente restabelecido relações com Taiwan em maio de 2005.

Segundo os analistas, a decisão de Nauru era expectável. “A probabilidade de Nauru mudar o reconhecimento de Taiwan para a China já era prevista há algum tempo”, considera Anna Powles, professora associada de estudos de segurança na Universidade Massey da Nova Zelândia.

40% dos votos

Apesar de perder cerca de 2.5 milhões de votos, Lai Cheng-te levou o DPP a uma vitória inédita,
já que nunca um partido político tinha assegurado três mandatos consecutivos.

O candidato do Partido Democrático (DPP), William Lai Ching-te, ganhou as eleições de Taiwan com um total de 5.5 milhões de votos (40%), mais sete por cento que o candidato do Partido Nacionalista (KMT, na sua sigle em inglês), Hou You-yi, que recolheu 4.5 milhões de votos. Por último ficou Ko Wen-je, do Partido Popular de Taiwan (TPP, na sua sigla em inglês), focado em atrair votos de eleitores descontentes com os dois maiores partidos. Ko recolheu 3.6 milhões votos, quase 26 por cento do total.

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