Consulado português no Rio de Janeiro é investigado por suspeitas de auxílio a redes criminosas

Vários membros das principais organizações criminosas brasileiras terão usado um esquema fraudulento em vigor no consulado português DO Rio de Janeiro, Brasil, para entrar na Europa

por Gonçalo Lopes

Outros cidadãos brasileiros, mas também portugueses a viver no Brasil, recorreram ao mesmo subterfúgio, amplamente divulgado do outro lado do Atlântico, para ter prioridade no atendimento no consulado que, no início deste mês, foi alvo de buscas levadas a cabo por 23 elementos da Polícia Judiciária (PJ) enviados para o Rio de Janeiro, no âmbito da operação “Agendódromo”. Em Portugal, o Ministério dos Negócios Estrangeiros, também foi alvo de buscas.

As suspeitas começaram quando, no ano passado, o Ministério dos Negócios Estrangeiros recebeu uma denúncia de um utente que não conseguia ser atendido no consulado do Rio de Janeiro. Sempre que recorria à plataforma eletrónica esta apresentava todas as vagas de agendamento preenchidas, tornando impossível a obtenção de vistos para entrar em Portugal ou, para os portugueses a viver no Brasil, a renovação do passaporte e cartão de cidadão ou o registo dos bebés que ali nasciam.

“Largas dezenas” beneficiaram do esquema

Uma primeira inspeção feita pelos serviços do Ministério dos Negócios Estrangeiros mostrou que algo suspeito estava a condicionar os agendamentos e, há um ano, o caso foi comunicado ao Ministério Público, que delegou a investigação na Unidade Nacional de Combate à Corrupção (UNCC) da PJ. Ainda a partir de Portugal, os inspetores perceberam que o consulado estava dominado por um esquema de corrupção.

Esquema que permitia que os emigrantes portugueses pagassem entre 200 e 300 euros para terem prioridade no agendamento dos serviços pretendidos. A mesma quantia era paga pelos brasileiros que queriam evitar a espera de vários meses pela concessão de vistos para entrar em Portugal. Fonte ligada à investigação garante que “largas dezenas” de pessoas beneficiaram com este esquema e que “há fortes suspeitas” que organizações criminosas, como o Primeiro Comando da Capital e o Comando Vermelho, tenham recorrido a este estratagema para, através de Portugal, enviar alguns dos seus operacionais para a Europa, com o intuito de ativar núcleos internacionais. Nestes casos, eram usados documentos falsos ou de pessoas já mortas para iludir o sistema de fiscalização instalado nos aeroportos.

Ex-funcionários do consulado eram intermediários

O agendamento fraudulento era feito por funcionários do próprio consulado, que tinham acesso à plataforma eletrónica e preenchiam as vagas disponíveis com os nomes de quem lhes pagava. Alguns destes nomes eram indicados por antigos trabalhadores do consulado, que funcionavam como intermediários do esquema.

No dia 7 deste mês, 21 inspetores da UNCC e dois peritos informáticos da PJ chegaram ao Brasil e, acompanhados, por duas procuradoras, fizeram uma busca no consulado. Os inspetores e magistradas acompanharam ainda buscas realizadas pela Polícia Federal brasileira às casas dos funcionários e intermediários envolvidos na fraude, situadas no Rio de Janeiro e em Saquarema.

Ao mesmo tempo, foram efetuadas buscas nas instalações do Ministério dos Negócios Estrangeiros em Lisboa. O JN apurou que esta diligência visou apenas recolher documentação e não há suspeita de que algum funcionário esteja relacionado com um caso que envolve a prática dos crimes de corrupção passiva e ativa, participação económica em negócio, peculato, acesso ilegítimo, usurpação de funções, abuso de poder, concussão e falsificação de documentos.

Devido à dificuldade de apresentar os suspeitos num tribunal português, ninguém foi detido e, sem medidas de coação decretadas, os suspeitos continuam a trabalhar no consulado.

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