Por que a Revolução Industrial não ocorreu na China (I)

por Gonçalo Lopes
Jorge Oliveira, Consultor financeiro e business developer

Por que ocorreu a Revolução Industrial na Europa e não na China? Uma das teses prevalecentes sustenta que a principal razão radica no confucionismo que, após dominar a cultura chinesa desde a Dinastia Han, impregnou a doutrina e a práxis do Estado Chinês. Esta escola de pensamento promove a harmonia e o conformismo, a obediência inquestionável à autoridade, o respeito e veneração pelo passado e a tradição. Fê-lo em termos tais que conduziu o mandarinato, os académicos e até os artistas na sociedade chinesa a repetir esses ensinamentos e o que vem de trás, prevenindo ou não-estimulando o pensamento e o comportamento independentes, muito menos o divergente ou o disruptivo, bem como a curiosidade subjacente à pesquisa e investigação científicas.

A sociedade tradicional chinesa estava estratificada em classes. No topo, abaixo do imperador e sua família, estavam os “mandarins”, altos-oficiais do império selecionados através de provas de acesso abertas e com base no mérito. Mas nessas provas, e noutras subsequentes de progressão na administração civil, o que era esperado era o regurgitar de textos sobre ortodoxia [neo-]confucionista. Os mandarins, académicos e oficiais públicos tinham o maior desprezo pelos mercadores e comerciantes que pertenciam ao terceiro nível da estratificação social – juntamente com os plebeus e os criados. Para a classe dominante, a ciência não devia ser funcionalizada a melhorias de processos produtivos ou a atividades empresariais, porque o trabalho e o comércio eram atividades das classes mais baixas.

O ponto de viragem no estudo da ciência e dos fenómenos naturais ocorreu quando a abordagem científica passou da vertente meramente investigatória, em abstrato, para uma preocupação em utilizar esse conhecimento para melhorar o processo produtivo e ganhar dinheiro. Na Europa isso ocorreu nos séculos XV~XVIII, houve um retorno ao conhecimento clássico (Ptolomeu, Hipócrates, Arquimedes); mas muitos dos estudiosos começaram a questionar o que estavam a estudar. Esta possibilidade e capacidade de desafiar a sabedoria recebida foi irreprimível. No século XVII, os europeus construíram microscópios, telescópios, barómetros e outros instrumentos científicos que lhes permitiram estudar a natureza de uma forma que os clássicos nunca conseguiram. Daí passaram a outra experimentação ligada a atividades produtivas. E, de avanço em avanço, se fez gradualmente a Revolução Industrial com processos mecanizados de produção e com utilização de novas formas de energia. Com os mercadores e comerciantes a financiar o engenho e a inovação tecnológica.

Não obstante, não é menos certo que num período bem anterior ao da explosão da investigação aplicada europeia, quando o confucionismo era já dominante na sociedade e no Estado Chinês, houve tremenda inovação e progresso tecnológico e científico na China – na Dinastia Song (960-1279). Estes incluíram a impressão móvel (1000), o forno de explosão (1050), os relógios mecânicos de água (1090), os navios de roda de pás (1130), a bússola magnética (1150), a maquinaria têxtil alimentada a água (1200), bem como enormes juncos oceânicos com anteparas estanques, com capacidade de transporte de 200 a 600 toneladas, e uma tripulação de cerca de mil homens (1200).

Por que não progrediu a China então, 500 a 600 anos antes da Europa, para uma Revolução Industrial?

*Consultor financeiro e business developer

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