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Famílias voltam a comprar mais comida e também mais carros

Diário de Notícias

As famílias residentes em Portugal parecem estar a resistir à inflação, indicam os dados do consumo alimentar do primeiro trimestre, ontem divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), no destaque das contas nacionais do primeiro trimestre. A despesa em “bens duradouros”, como automóveis, também subiu e muito.

Durante quatro trimestres consecutivos, o volume de bens de alimentação esteve a cair em termos reais, ou seja, as famílias gastaram muito mais nessas compras, mas o volume (descontando a inflação) caiu abruptamente, o que significa que as pessoas cortaram nas quantidades que levaram para casa de forma a acomodarem o agravamento do custo de vida.

A redução em volume entre o primeiro e o último trimestre do ano passado foi até mais severa do que no tempo dos anos da austeridade do programa de ajustamento da troika e do governo PSD-CDS.

No entanto, mostra o INE no novo destaque das contas nacionais trimestrais, no arranque deste ano parece ter havido um pequeno ajustamento pela positiva. As famílias conseguiram levar para casa ligeiramente mais alimentos (mais 0,2% do que no primeiro trimestre do ano passado, período marcado pelo início da guerra e pela subida da inflação).

Aqui, nos primeiros três meses deste ano, aconteceram duas coisas: os lares portugueses aumentaram como nunca a despesa dedicada à alimentação, com a respetiva despesa corrente a subir mais de 19% em termos homólogos.

Mas, ao contrário do que sucedeu em 2022, este aumento na despesa nominal em comida acontece num quadro de inflação ainda elevada, é certo, mas a abrandar.

Seja como for, o aumento da despesa corrente em bens alimentares registou o valor mais alto (os referidos 19,3%) das séries do INE, que remontam a 1996.

Em 2022, tal como noticiou o Dinheiro Vivo (DV) no início de março, as famílias residentes reduziram de forma significativa (maior corte de que há registo) o volume de alimentos comprados em 2022.

No entanto, o valor pago em comida na fatura dos lares subiu no ano passado a um ritmo recorde puxado pela inflação galopante e atingiu o maior valor das séries oficiais, indicou o INE.

Ou seja, o ano passado foi marcado por sinais inequívocos de que muitas famílias — sobretudo as mais pobres, com menos rendimento disponível e mais vulneráveis à subida das taxas de juro porque têm dívidas bancárias a aumentar com o avanço das taxas de juro — foram mesmo forçadas a cortar na alimentação para conseguir poupar ou aguentar o embate do agravamento do custo de vida, designadamente desse custo relacionado com a habitação.

As prestações ao banco dispararam, por exemplo. Há casos em que duplicaram, sobretudo nos contratos de empréstimo celebrados mais recentemente, onde, claro, o capital em divida é significativo.

Em todo o caso, a fatia dos orçamentos familiares que vai para comida continua em níveis recordes.

Segundo cálculos do DV, este tipo de gasto absorve 21% da despesa de consumo final total das famílias, no primeiro trimestre.

“O consumo privado, que representa mais de 65% do Produto Interno Bruto (PIB) português, acelerou em cadeia, mas desacelerou em termos homólogos”, observa Teresa Gil Pinheiro, economista do BPI.

Portugueses compram mais carros e comida

“Para este comportamento contribuíram o forte incremento da venda de automóveis e a recuperação do consumo de bens alimentares, que nos quatro trimestres anteriores tinha contraído em termos homólogos”, confirma a analista.

De facto, além da alimentação que parou a tendência recessiva de um ano, a despesa em bens duradouros disparou quase 11% no primeiro trimestre deste ano face a igual período de 2022, revela o INE.

Em todo o caso, tal não foi suficiente para evitar uma travagem significativa do consumo e da procura interna em geral. Logo, isso também se refletiu no crescimento global da economia no primeiro trimestre.

Em termos reais, a economia como um todo ainda cresceu 2,5%, uma das melhores marcas da Europa (segundo disse o Eurostat há 15 dias) e o dobro do ritmo da zona euro. Entretanto, soube-se que a Alemanha, a maior economia da moeda única, entrou em recessão.

Mas no caso de Portugal, os economistas estão confiantes de que as famílias podem conseguir ter algum alívio neste segundo trimestre (que começou em abril). A inflação está, de facto, a aliviar rapidamente; o desemprego, depois de ter subido muito (para 7% da população ativa em março), também deu ontem sinais de um ligeiro recuo em abril (ver textos ao lado).

Na nota do gabinete de estudos do BPI, a economista explica que “a economia avançou 2,5%, beneficiando também do maior contributo da procura externa e da estagnação do contributo da procura interna”.

A aceleração das exportações no primeiro trimestre acontece “em ambas as componentes de bens e serviços”, mas as importações “também aceleraram, avançando 1,3% em cadeia, com aceleração das importações de bens (explicado pelo aumento das vendas de automóveis) e com a queda das importações de serviços”.

As exportações totais de Portugal aumentaram quase 11% no primeiro trimestre, segundo o INE.

Turismo em alta, o resto nem tanto assim

Do lado das empresas, da oferta, parece que é o turismo e os serviços relacionados que estão a salvar a face do crescimento económico.

“O valor acrescentado bruto (VAB) a preços constantes aumentou 2,9% (3,8% no trimestre anterior)”, diz Teresa Gil Pinheiro.

Nos setores produtivos (empresas), “destacam-se as quebras na indústria e na construção”, mas para compensar há “a aceleração no comércio, na restauração e na hotelaria (em linha com o bom momento do turismo), cujo comportamento no primeiro trimestre explica mais de metade (52,5%) do crescimento do VAB”, explica a mesma analista num comentário ao destaque do INE.

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