Cravinho assume “erro” na nomeação de ex-diretor e derrapa nas explicações

por Viviana Chan
Diário de Notícias

O ex-ministro da Defesa alegou que um email enviado ao seu gabinete a 20 de abril de 2020 com os custos reais da obra de requalificação do antigo Hospital Militar de Belém (mais 2,5 milhões que o previsto) só lhe chegou a 23 de junho, “por por exceder o tamanho limite das mensagens e ser recusado pelo servidor”. Mas não explicou porque estando os contratos publicados no portal público base.gov desde 23 de abril, continuou a afirmar que desconhecia os valores.

A nomeação do ex-diretor-geral de Recursos da Defesa Nacional, Alberto Coelho para presidente do Conselho de Administração da ETI – EMPORDEF – Tecnologias de Informação, S.A., uma empresa estatal das indústrias de Defesa, quando já tinha sido responsabilizado por várias “inconformidades legais” na contratação para as obras de reabilitação do antigo Hospital Militar de Belém (HMB), foi o principal foco das perguntas dos deputados da oposição ao ex-ministro da Defesa e atual titular dos Negócios Estrangeiros.

Ouvido nesta quarta-feira no parlamento, João Gomes Cravinho assumiu pela primeira vez o “erro” dessa decisão, mas as suas explicações suscitaram ainda dúvidas. “Se soubesse o que sei hoje, não teria feito essa nomeação”, assegurou. O ex-ministro reconheceu que sobrestimou o currículo do ex-diretor-geral, que é atualmente arguido numa investigação de corrupção que envolve também a empreitada do HMB.

“Eu sobrestimei os 19 anos de diretor-geral, sobrestimei aquilo que tinha sido todo o currículo do doutor Alberto Coelho, (…) e sobrestimei a outra parte que vem presente no relatório da auditoria da Inspeção-Geral da Defesa Nacional (IGDN)”, afirmou João Gomes Cravinho. “Não tinha elementos que permitissem pensar em má fé e, portanto, a nomeação para a ETI seguiu o seu percurso. Se foi um erro? Claro que foi um erro” acrescentou.

Quando decidiu essa nomeação a 29 de abril de 2021, contudo, além da auditoria da IGDN que apontava várias ilegalidades nos procedimentos de Alberto Coelho – pelas quais acabou por ser condenado a uma multa de 15 300 euros pelo Trinunal de Contas – já havia, há mais de um ano, um longo historial de alertas sobre a derrapagem nos custos da obra. Os primeiros avisos vieram logo do então secretário de Estado da Defesa, Jorge Seguro Sanches, que foi quem propôs a auditoria da IGDN. Mas apesar de o secretário de Estado ter no ministério o dossier do HMB e de ter sido ele a suspeitar primeiro do diretor-geral, Cravinho decidiu não o informar sobre a polémica nomeação de Coelho para a ETI.

Assinalando que falava com Seguro Sanches sobre “assuntos da sua competência” e outros que “não eram da sua competência (…) por acaso aconteceu não falarmos (da nomeação de Alberto Coelho)”. O deputado Jorge Paulo Oliveira, do PSD, questionou porque “escondeu essa nomeação” do então secretário de Estado e se teve receio que a desaprovasse. Cravinho retorquiu exclamando que era “quase cómico o esforço para encontrar uma divergência” entre si e Seguro Sanches, com quem “trabalhava sempre em estreita coordenação”.

O ex-ministro da Defesa confirmou ainda que combinou esta nomeação com o então presidente da IdD-Portugal Defence – a holding das indústrias de defesa onde estava integrada a empresa ETI – que é o atual secretário de Estado da Defesa, Marco Capitão Ferreira. “Tinha um diálogo regular com o presidente da IdD e surgiu essa questão”, disse. Capitão Ferreira também não viu impedimentos.

Outra situação em que Cravinho derrapou nos esclarecimentos foi sobre o momento em que soube da dos custos acima do estimado.

Primeiro, o ex-ministro da Defesa considerou que os valores constantes num email da Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional (DGRDN), a 27 de Março de 2020, que estimava logo mais cerca de 900 mil euros na obra devido a “obras suplementares” pedidas pelo Exército, eram “aceitáveis”.

Num segundo momento, porém, um novo email de 20 de abril subia para 2,5 milhões os custos adicionais aos previstos 750 mil euros. Mas Cravinho alegou que este documento só lhe chegou a 23 de junho, “por exceder o tamanho limite das mensagens e ser recusado pelo servidor”.

Não referiu, porém, as notícias que já tinham saído até essa data dando conta da derrapagem, designadamente no DN, nem sequer explicou porque estando todos os contratos – no valor total de 3,2 milhões de euros – publicados na plataforma pública base.gov desde 23 de abril de 2020, desconhecia estes valores.

Acresce que, em todas as audições parlamentares posteriores, Cravinho insistiu sempre em desvalorizar a derrapagem, demorou quase dois meses a enviar a auditoria da IGDN ao Tribunal de Contas e só após terem vindo a público suspeitas criminais, a enviou ao Ministério Público, seis meses depois.

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