“Portugal tem um problema de corrupção grave”

por Gonçalo Lopes

Tomou posse no dia anterior à abertura do novo ano judicial. O caderno de encargos é pesado. Já lhe chamaram a bastonária comunista ou a advogada sindicalista. Defende os direitos sociais e laborais dos advogados e, na política, considera que muito pior do que a existência de alguns processos em que os advogados são arguidos, é a sucessão dos casos e casinhos no governo. A nova bastonária dos advogados aconselha os candidatos a governantes a consultarem um advogado.

Já lhe chamaram “bastonária comunista” ou “advogada sindicalista” ou que “quer transformar os advogados, profissionais liberais, em trabalhadores”. Disse que uma das suas principais prioridades seria reforçar os direitos dos advogados. Que direitos são esses que faltam ou que estão ameaçados?

Muito obrigado por me terem convidado e permitido que desmistificasse essas palavras. A minha primeira questão sobre esse rol é que normalmente não me identificam com o Partido Comunista, é mais com o Bloco de Esquerda, não sei porquê. Tenho o maior dos respeitos por ambos os partidos, entendo que são os dois essenciais à boa prática democrática e que têm sempre o seu lugar na Assembleia da República de acordo com a vontade do eleitorado. Mas não é o caso, não sou filiada em nenhum partido político, aliás, volto a repetir que o meu único extremismo é o humanismo e as questões da humanidade.

É evidente que temos várias realidades dentro da advocacia, temos trabalhadores que entendo serem dependentes, isto é, os advogados que prestam serviços, alegadamente, às sociedades. Aí sim, no meu entender, temos uma relação subordinada, é o que entendo tecnicamente, basta ler o artigo 12.º do Código do Trabalho para perceber que ela existe. E naturalmente que essas pessoas têm de ter os seus direitos laborais devidamente garantidos, porque são trabalhadores, mas essas pessoas são uma minoria na advocacia. Estamos a falar nas pessoas que trabalham para as grandes sociedades e de pessoas que trabalhem subordinadamente para outros colegas que não sejam sociedades, mas em prática individual. Essa situação tem de ser regulada e os direitos que estas pessoas têm estão plasmados no Código do Trabalho, sobre isso não tenho dúvidas. Em tudo o resto, não estamos a falar de uma relação subordinada, estamos a falar de trabalhadores independentes, os seus próprios patrões, se assim quiserem dizer. Aí não há direitos laborais, não estamos a falar destes direitos, mas sim de direitos constitucionais e que são inerentes a qualquer ser humano. Portanto, se ficar doente tenho o direito ao apoio da minha providência, é meu direito constitucional poder tratar a minha doença, não faz qualquer sentido obrigar um profissional liberal, acometido por uma doença oncológica, a ter de marcar os seus tratamentos de radioterapia ou quimioterapia entre diligências de tribunal. E isto acontece, porque os profissionais alocados à advocacia, mas não só à advocacia, agentes de execução e solicitadores têm exatamente o mesmo problema: não têm subsídios de baixa médica. Têm, desde há uns dois anos, um seguro que chamamos baixa médica, mas que no fundo é uma espécie de remuneração por ficar sem retribuição por incapacidade temporária que lhe seja passada por um médico, mas é um seguro. O que é que isto quer dizer? Se por acaso estiver detetada em mim uma doença oncológica antes de ter aderido ao seguro, estou excluída dessa realidade e tenho de continuar a trabalhar sem rede. Não posso dar-me ao luxo de deixar de trabalhar, caso contrário não consigo fazer face às minhas obrigações, quer de foro pessoal, quer de foro profissional. Inclusivamente, até as obrigações que tenho para com a caixa de providência, porque mesmo tendo uma declaração médica que diga que não devo trabalhar, a verdade é que tenho de continuar a trabalhar e pagar cotizações à minha Ordem e contribuições de segurança social à Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores. Portanto, isto a mim parece-me óbvio.

Há ainda os problemas da parentalidade?

Além disto, temos também os problemas da parentalidade. Temos de chamar a atenção para a esta realidade que é muito dos advogados, o não terem a possibilidade de poderem exercer os seus direitos de parentalidade, nem os seus filhos poderem ter os seus pais presentes porque temos exatamente a mesma realidade. O único pagamento que recebem os advogados e solicitadores é o subsídio de nascimento, entregue pela altura do nascimento dos filhos, mas que é muito exíguo. Isto significa que as advogadas, solicitadores e agentes de execução são obrigadas a trabalhar, mesmo depois de terem nascido os seus filhos. Outro problema que temos é que não são adiados prazos. Isto é, temos uma lei que diz que temos 70 dias para adiar diligências, mas ninguém adia prazos. Se estiver com a minha criança em casa, mesmo que tenha tido uma cesariana no dia anterior, se o meu prazo acabar no dia seguinte, tenho de o cumprir, porque caso contrário o cidadão perde direito.

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