A segunda maior indústria da cidade de Macau

por Mei Mei Wong
Tony Lai

A pandemia da Covid-19 tornou a indústria financeira no segundo maior setor de Macau, depois do segmento do jogo. Mas membros da indústria dizem que ainda há um longo caminho até que se possa tornar um pilar económico em circunstâncias normais. No que diz respeito ao foco do desenvolvimento do mercado obrigacionista local, que ainda se encontra na fase inicial, o futuro reside no reforço dos interesses e da participação do investimento internacional

Afim de acelerar a diversificação económica de Macau, o Governo de Macau propôs nos últimos anos o desenvolvimento de quatro grandes indústrias não ligadas ao jogo – as indústrias emergentes de big health, ou saúde abrangente; finanças modernas; novas e altas tecnologias; como exposições e convenções; e desporto e cultura.

Durante a apresentação das Linhas de Acção Governativa (LAG) para o ano financeiro de 2023, as autoridades de Macau apontaram como objetivo aumentar a percentagem dessas quatro novas indústrias no produto interno bruto (PIB) da cidade para 15 por cento no futuro, com 40 por cento a ser representado pelo jogo.

Entre estas quatro grandes indústrias, o setor financeiro, liderado maioritariamente pelos bancos locais, já tem algum peso no PIB desde a década de 1980. De acordo com os últimos dados da Autoridade Monetária de Macau (AMCM), o valor acrescentado do setor financeiro representou 15,4 por cento do PIB de Macau em 2021, contra apenas 6,9 por cento em 2019, permitindo que o segmento se tornasse na segunda maior indústria da cidade, a seguir ao setor do jogo. Entretanto, o valor acrescentado da indústria financeira totalizou 2.7 biliões de patacas até ao final do terceiro trimestre de 2022, representando um aumento de 19 vezes quando comparado com duas décadas atrás, acrescentou a AMCM.

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O deputado Ip Sio Kai, que é também o presidente da Associação de Bancos de Macau, respondendo a questões do PLATAFORMA à margem de um evento, disse que o setor financeiro foi capaz de representar mais de 15 por cento do PIB de Macau em 2021 devido às consequências económicas da Covid-19, responsabilizando a queda registada nas receitas do jogo pelo crescimento da parcela do PIB ocupada pelo setor. Contudo, sublinha que o setor financeiro demonstrou resiliência apesar do impacto da pandemia.

Falando à margem de um fórum financeiro em Macau durante o último fim de semana, Ip salientou que “ainda há um longo caminho” a percorrer para os quatro novos setores representem 15 por cento do PIB cada um, assumindo que o PIB da cidade volta ao nível pré-pandémico. Mas está otimista quanto ao desenvolvimento das finanças modernas em Macau, afirmando: “Dado o apoio político do Governo de Macau e da Zona de Cooperação Aprofundada em Hengqin, o ambiente operacional e o clima empresarial das finanças modernas só pode ser cada vez melhor”.

MELHOR HARDWARE E SOFTWARE

Com base no modelo tradicional dos bancos e seguradoras, a indústria financeira moderna que o Governo de Macau defende também se concentra no desenvolvimento do mercado obrigacionista, na gestão de fortunas, na locação financeira, nas transações em RMB, nos fundos de capital privado e nas finanças verdes.

A Transacção de Bens Financeiros de Chongwa (Macau), S.A. (MOX) — a primeira instituição da cidade a prestar serviços de registo, custódia, cotação, negociação e liquidação de obrigações — foi fundada no final de 2018, marcando o início do mercado local de obrigações. De acordo com as últimas informações da MOX, um total de 177 obrigações avaliadas em 390 mil milhões de patacas foram cotadas ou emitidas nos últimos quatro anos.Os diferentes tipos de obrigações incluem títulos do Governo, títulos corporativos e títulos verdes.

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“O software e o hardware da indústria financeira de Macau têm sido otimizados, enriquecendo as ofertas de financiamento moderno na cidade”, disse a MOX num comunicado.

“O mercado obrigacionista de Macau voltou a captar a atenção dos investidores e outros, na sequência do sucesso das emissões de obrigações do Governo Gentral e do Governo de Guangdong [em 2022]. Tal pode ajudar a consolidar a posição do mercado obrigacionista de Macau à escala global”.

Após a emissão inaugural em 2019, o Ministério das Finanças chinês voltou a emitir 3 mil milhões de renminbis (RMB) em Macau em setembro de 2022; o Governo de Guangdong emitiu obrigações do Estado denominadas de RMB offshore na cidade em 2021 e 2022, respectivamente, com o valor do último lote a totalizar 2 mil milhões RMB.

CRESCENTE VARIEDADE DE PRODUTOS

Além disso, o Banco de Desenvolvimento da China tem cotado com sucesso as suas obrigações na MOX durante três anos consecutivos, enquanto alguns emitentes de alta qualidade da China continental também optaram pela emissão ou cotação das suas obrigações em Macau.

“Tem havido emitentes mais recorrentes no mercado de Macau [nos últimos quatro anos], que também tem visto uma gama mais diversificada de produtos obrigacionistas”, lê-se.

Por exemplo, a dimensão acumulada das obrigações verdes emitidas e cotadas no MOX ultrapassou 77.3 mil milhões de patacas no final de 2022.

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“A MOX utiliza ativamente as vantagens geográficas e o papel de plataforma da cidade para facilitar o desenvolvimento de um mercado financeiro verde e sustentável, e para ajudar a atrair projetos financeiros e obrigações verdes e sustentáveis.

“Continuará a potenciar e enriquecer o desenvolvimento das finanças modernas em Macau com o desenvolvimento do mercado obrigacionista como ponto de partida […] e estudará as possibilidades de mais produtos e serviços que correspondam ao futuro projeto de Macau”, refere o comunicado.

REFORÇAR A PARTICIPAÇÃO DE ENTIDADES GLOBAIS

A Central de Depósito e Liquidação de Valores Mobiliários de Macau Sociedade Unipessoal Limitada (MCSD), uma empresa detida a 100 por cento pela AMCM e que foi fundada em dezembro de 2021, é outro grande impulsionador do mercado obrigacionista de Macau para além da MOX. A empresa estatal opera a Central de Depósito de Títulos (CSD), a infraestrutura financeira chave de um mercado de obrigações vencidas para a ligação de investidores e emitentes estrangeiros.

Os últimos números da MCSD mostram que, no final de 2022, um total de 18 obrigações foram registadas e geridas pelo CSD, numa dimensão equivalente a quase 70 mil milhões MOP. Um total de 80 instituições, incluindo 23 instituições locais e 57 instituições não locais, também criaram contas MCSD, incluindo autoridades monetárias locais, bancos comerciais, empresas de valores mobiliários e entidades fiduciárias.

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Em relação ao desenvolvimento do mercado obrigacionista e da indústria financeira de Macau como um todo, o MCSD afirmou que também desempenharia um papel ativo no sentido de atrair mais instituições do Continente para emitir obrigações em Macau regularmente e fornecer propostas de financiamento offshore para mais emitentes.

“Atualmente, o MCSD está em comunicação com instituições centrais de registo e depósito de renome internacional, bancos com serviços de custódia e associações profissionais, de modo a aumentar o interesse de entidades globais no mercado de Macau e criar uma plataforma de serviços financeiros que seja conveniente para emissores e investidores internacionais,” a empresa indica.

PREENCHER A LACUNA

No último discurso político de 2022 também foi referido que Macau continuará a melhorar as regras e leis relevantes para a indústria financeira, como a elaboração da Lei de Valores Mobiliários, que abrange as regras relevantes do mercado obrigacionista, bem como trabalhar na revisão das “Directivas relativas à emissão de obrigações e à gestão dos serviços relativos à sua alineação e à negociação” e das “Directivas relativas à colocação de obrigações com tomada firme e custódia de obrigações”.

As autoridades estudarão também a viabilidade da introdução de incentivos e subsídios para a emissão de obrigações em Macau, de modo a aumentar a atratividade do mercado obrigacionista. Além disso, as autoridades irão também elaborar a Lei de Valores Mobiliários para definir melhor o quadro regulamentar dos fundos locais de participações privadas para o desenvolvimento a longo prazo do setor.

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Macau irá também cooperar com a zona de cooperação aprofundada em Hengqin para estabelecer um mecanismo que proporcione conveniência para a participação de gestores de fundos de participação privada de qualidade de Hengqin no mercado de Macau.

Apesar de uma melhor infraestrutura legal, a indústria financeira local verá também o início da segunda troca de ativos financeiros da cidade este ano, para além da MOX – Transacção de Bens Financeiros de Micro Connect (Macau), S.A., foi concedida uma licença para o fazer pelo Governo de Macau em dezembro passado, e espera-se que a mesma funcione em Macau até ao final do primeiro ou segundo trimestre de 2023.

Um dos fundadores da Micro Connect é Charles Li, que foi o antigo diretor executivo da Hong Kong Exchange and Clearing Limited entre 2010 e 2021. Numa entrevista ao jornal local Macao Daily News, Li disse que a nova bolsa Micro Connect terá como alvo instituições internacionais e investidores profissionais, que fornecerão financiamento a pequenas e microempresas na China continental.

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A plataforma irá mostrar ao mercado internacional de capitais o crescimento robusto e o rendimento do investimento de projetos na China continental, acrescentou.

Considerando o modelo de desenvolvimento passado da indústria financeira de Macau, Li salientou que o setor tem as suas próprias vantagens uma vez que está aberto a novas tecnologias e novos modos de desenvolvimento.

“Macau pode tornar-se um novo mercado internacional de capitais que apoia a prosperidade comum da China continental, e pode preencher a lacuna que os mercados financeiros tradicionais não podem saciar”, cita o Macao Daily News.

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