À procura de novas receitas de jogo na RAEM

por Mei Mei Wong
Nelson Moura

Modelo de negócio antigo não tem lugar nas novas concessões de jogo. É unânime entre analistas que a abertura das fronteiras vai permitir o regresso das receitas, mas não é consensual o nível de recuperação para 2023. A corrida por mercados estrangeiros vai ter de esperar pela materialização dos investimento não jogo e um académico aponta para o mercado de massas premium como “foco estratégico”

Desde 8 de janeiro que os visitantes de Macau provenientes do Continente, Hong Kong ou Taiwan estão isentos de apresentar um resultado negativo à Covid-19. Quem chega à cidade já não precisa de declarar o seu estado de saúde ou cumprir quarentenas, com as fronteiras a operar normalmente pela primeira vez em três anos.

Todos estes fatores apontam para que este seja o primeiro Ano Novo Chinês com um registo de entradas “normal” desde 2020. No entanto, é ainda impossível prever o “quão bom” será para os casinos locais este Ano do Coelho. Macau registou receitas brutas de jogo de 42.2 mil milhões de patacas (5,3 mil milhões de dólares americanos) em 2022, uma queda de 51.4 por cento face a 2021 e o valor mais baixo num único ano desde 2004.

A recente abertura da cidade levou o banco de investimento JP Morgan a rever as suas estimativas, apontando para uma recuperação total dos resultados brutos do jogo em 2019 para a segunda metade de 2023 – muito antes das previsões anteriores que indicavam esse retorno apenas em meados de 2024.

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Ryan Ho Hong Wai, um professor do Centro de Estudos de Jogo e Turismo da Universidade Politécnica de Macau, diz ao PLATAFORMA que a indústria de jogo local deve recuperar graças à forte procura acumulada por ofertas de lazer e turismo no país.

No entanto, nota que as novas alterações regulamentares e as condições socioeconómicas pós-pandemia podem trazer a Macau uma uma nova geração de turistas, cujos hábitos de consumo diferem dos seus homólogos pré-Covid. “Na minha opinião, o setor ‘massas premium’ será o foco estratégico para a maioria dos casinos de Macau e, potencialmente, um importante gerador de receita para a indústria de jogo local. Ao contrário dos jogadores VIP angariados por promotores de jogo, o segmento ‘premium mass’ consiste predominantemente em jogadores sem contracto com junkets, mas que se envolvem em jogos de apostas elevadas”, analisa.

E esta diferença no modelo de negócio pode inclusive “ser uma boa notícia para as operadoras, já que não terão as suas margens de lucro reduzidas por comissões a promotores de jogo”, observa.

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Em declarações ao PLATAFORMA, o professor da Faculdade de Gestão de Empresas da UM, Ricardo Siu, prevê que o volume total do jogo em 2023 se situe entre 120 e 150 mil milhões de patacas, ainda distante da meta de 180 mil milhões definida pelas autoridades da RAEM.

Em causa estão “limites” à indústria, nomeadamente a redução considerável do setor VIP na cidade e as restrições que Pequim continua a impor aos jogadores chineses com múltiplas visitas a Macau para apostar valores consideráveis. Siu acredita que tal implica um futuro onde “o segmento tradicional VIP pode não ter muito espaço”.

E explica a sua revisão em baixa dos valores previstos para 2023: “Suponhamos que o setor VIP de 2023 atinge cerca de 20 por cento do de 2019, ou seja, 27 mil milhões de patacas, e que o setor de massas […] chega a 60 ou 80 por cento dos valores de 2019; isto significa resultados gerais entre 94 mil milhões e 125 mil milhões de patacas”.

NOVO FOCO

É preciso lembrar também que as operadoras de jogo em Macau comprometeram-se a investir um total de 180 mil milhões de patacas no desenvolvimento de elementos não relacionados com o jogo. Embora as novas concessionárias comecem a aumentar o seu foco em atividades de entretenimento e novas experiências turísticas, espera-se que o jogo seja a aposta mais segura a curto prazo. Num relatório recente, a consultora Morgan Stanley aponta que as concessionárias só devem iniciar os seus investimentos extra-jogo em 2024, uma vez que 2023 ainda será um ano de recuperação para o setor do jogo e turismo.

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A consultora acredita, no entanto, que a meta de 180 mil milhões de patacas está ao alcance, considerando a receita de jogo proveniente do mercado de massas.

“Suspeito que, devido às preocupações com o número relativamente alto de infeções no Continente, Hong Kong e Macau em janeiro e fevereiro, o aumento no número de visitantes estrangeiros pode ser lento no início, recuperando apenas a partir do segundo trimestre”, Ricardo Siu, professor da Faculdade de Gestão de Empresas da Universidade de Macau

“Se as receitas anuais dos casinos atingirem 180 mil milhões até 2027, as seis operadoras terão de aumentar o seu investimento não relacionado com o jogo até 20 por cento. Estes 180 mil milhões poderão potencialmente ser uma meta de curto a médio prazo para as operadoras atingirem”, aponta Ryan Ho.

MERCADOS POR EXPLORAR

Na atribuição das seis novas concessões de jogo, muito se falou também na introdução de novos benefícios fiscais para as operadoras que conseguirem atrair mais apostadores estrangeiros. Segundo a nova lei do jogo, poderá ser oferecida por razões de interesse público uma redução ou isenção às concessionárias de jogo no pagamento das contribuições de cinco por cento das receitas brutas do jogo – incluindo três por cento para o desenvolvimento urbanístico, a promoção turística e a segurança social -, nomeadamente pela expansão dos mercados dos clientes de países estrangeiros.

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As concessionárias de jogo vão também poder criar a partir do início deste ano zonas específicas para apostadores estrangeiros. Aumentar o número de visitantes estrangeiros não seria em teoria algo difícil, considerando que apenas três milhões dos 39.4 milhões de visitantes registados em 2019 vieram de fora da Grande China.

No entanto, persistem as dúvidas na aplicação prática dessa nova medida de incentivo.

As operadoras de jogo estão a apostar a longo prazo na classe média em expansão na China e em toda a Ásia. Essa classe emergente está ansiosa por gastar em lazer e entretenimento. Além disso, os benefícios fiscais incentivam-nas a ir além da China e explorar os mercados regionais, abrindo caminho para uma nova era na indústria de jogo da cidade“, Ryan Ho Hong Wai, professor do Centro de Estudos de Jogo e Turismo da Universidade Politécnica de Macau

“Suspeito que, devido às preocupações com o número relativamente alto de infeções no Continente, Hong Kong e Macau em janeiro e fevereiro, o aumento no número de visitantes estrangeiros deve ser lento no início, recuperando apenas a partir do segundo trimestre”, diz Siu ao PLATAFORMA.

Para Ryan Ho, o desenvolvimento dos mercados estrangeiros em muito depende do sucesso das operadoras em criar ofertas não jogo competitivas e a sua capacidade em identificar mercados-alvo.

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“As operadoras de jogo estão a apostar a longo prazo na classe média em expansão na China e em toda a Ásia. Essa classe emergente está ansiosa por gastar em lazer e entretenimento. Além disso, os benefícios fiscais incentivam-nas a ir além da China e explorar os mercados regionais, abrindo caminho para uma nova era na indústria de jogo da cidade”, aponta Ho.

“Como a maioria dos casinos locais continua a migrar de grandes apostadores para jogadores casuais, as operadoras precisam de se adaptar ao ‘novo normal’”.

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