Violência doméstica durante a pandemia

por Mei Mei Wong
Lúcia SioLúcia Sio*

A fim de travar a propagação da Covid-19 e reduzir o contacto humano, muitos países implementaram políticas de isolamento doméstico. No entanto, esta política também levou ao aumento do tempo de convivência entre as pessoas que vivem na mesma casa. Se uma delas for violenta, significa que a(s) outra(s) terá(terão) que ficar no mesmo espaço por muito tempo com alguém que pode, a dada altura, atacá-los fora de controlo.

Adicionalmente a recessão económica, o aumento do desemprego provocado pela pandemia e a insegurança no ambiente em geral levaram a um aumento dos casos de violência doméstica. De acordo com um relatório da ONU Mulheres, realizado em 2021 em 13 países, 1 em cada 4 mulheres inquiridas disse que os conflitos em casa se tornaram mais frequentes e que se sentiu mais insegura em casa.

De acordo com n.º 1 do art. 30º da Lei Básica de Macau, é inviolável a dignidade humana dos residentes. O nº 2 do art. 67º do Código Civil também prevê que todas as pessoas têm direito à protecção contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral.

Para promover o respeito pelos direitos fundamentais e de personalidade (e também outros fins), a Lei de Prevenção e Combate à Violência Doméstica foi posta em vigor em 2016, prevendo mecanismos de protecção tanto administrativos como judiciais.

Em termos administrativos, de acordo com o art. 16º da referida lei, o Instituto de Acção Social poderá proporcionar às vítimas de violência doméstica as seguintes medidas de protecção e assistência:

1) Acolhimento temporário em instalações de serviços sociais;

2) Assistência económica de urgência, nos termos da lei;

3) Acesso a apoio judiciário urgente;

4) Acesso gratuito aos cuidados de saúde prestados pelas instituições de saúde públicas, nos termos previstos no Decreto-Lei nº 24/86/M, de 15 de Março, com as devidas adaptações, para tratamento de lesões resultantes de violência doméstica;

5) Assistência no acesso ao ensino ou ao emprego;

6) Aconselhamento individual e familiar;

7) Prestação de serviços de informação e aconselhamento jurídicos;

8) Outras medidas de protecção e assistência necessárias à garantia da sua segurança e bem-estar.

Na perspectiva judicial, quem, no âmbito de uma relação familiar ou equiparada, infligir a outra pessoa maus tratos físicos, psíquicos ou sexuais é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos.

As relações equiparadas abrangem as relações existentes entre pessoas que vivam em situação análoga à dos cônjuges, entre ex-cônjuges, assim como as relações de tutela ou curatela e outras situações, como a de empregada doméstica que cuida de menor quando exista coabitação.

Além da condenação pela prática de crime de violência doméstica, também podem ser aplicadas ao agente penas acessórias, v.g., proibição de contactar, importunar ou seguir o ofendido (cfr. arts. 4.º, 18.º e 19.º da Lei de Prevenção e Combate à Violência Doméstica).

Para além da Lei de Prevenção e Combate à Violência Doméstica, o Título I do Livro II do próprio Código Penal prevê uma série de crimes, tais como o crime de ofensa simples à integridade física, o crime de ofensa grave à integridade física, o crime de maus tratos ou sobrecarga de menores e incapazes, o crime de ameaça, o crime de coacção, o crime de sequestro e o crime de abuso sexual de crianças, que protegem os bens jurídicos pessoais e, dependendo das circunstâncias específicas, podem também ser aplicáveis em casos de violência doméstica.

Por fim, se alguém for confrontado com uma situação de violência doméstica, existem vários canais de ajuda disponíveis na comunidade.

Pode procurar a assistência do Instituto de Acção Social (a linha de apoio à violência doméstica 24 horas do IAS é 28233030), de organizações privadas e de entidades policiais (a linha de emergência é 999).

Os trabalhadores de qualquer entidade pública ou privada têm o dever de guardar sigilo profissional em relação às informações sobre os casos de violência doméstica de que tenham conhecimento no exercício das suas funções ou da sua actividade, mesmo após o termo das mesmas, sem prejuízo do dever de comunicação e da obrigação de denúncia impostas por lei.

De qualquer forma, para evitar a perda total das provas, a vítima deve tirar fotografia(s) da(s) parte(s) do corpo ferida(s); e, em caso de deslocação ao hospital para tratamento por um psiquiatra, a vítima deve guardar o(s) recibo(s) e solicitar um relatório médico (cfr. arts. 6.º, 9.º da Lei de Prevenção e Combate à Violência Doméstica, art. 225.º do Código de Processo Penal e art. 336.º do Código Penal).

*Advogada estagiária da Lektou

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