Fuga de eventos de Macau

por Mei Mei Wong
Viviana Chan

Representantes da indústria MICE mostram-se preocupados com a deslocalização de alguns dos grandes eventos que Macau acolheu durante anos. O desenvolvimento conjunto do setor em Hengqin é uma solução, mas ainda não convence estas empresas. O setor também tem vindo a perder diversidade, estando a sobreviver de um “ciclo interno”. Nada que se possa mudar até levantar as restrições fronteiriças, mas há medida que se prolongam os efeitos nocivos, os danos começam a ser irreversíveis

A indústria MICE em Macau esteve suspensa até ao início de setembro, devido ao surto epidémico de 18 de junho. Hoje, a indústria começa a acreditar na luz ao fundo do túnel, com a organização de eventos como a “Expo de Inovação Tecnológica Internacional BEYOND Expo”, o “Fórum Internacional sobre o Investimento e Construção de Infraestruturas” (IICF, na sigla inglesa), e a Expo Internacional de Turismo (Indústria) de Macau. Apesar do futuro promissor, regiões vizinhas continuam a crescer e a “roubar” negócio.

DESLOCALIZAÇÃO PERMANENTE

A G2E Asia, considerada a maior exposição de jogo e entretenimento do continente asiático, foi adiada múltiplas vezes por causa da pandemia. Três anos depois da última edição, realizada em Macau, decidiu arrancar em Singapura no mês de agosto.

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Outras feiras de renome, como a Jewellery & Gem ASIA Hong Kong e outros eventos da China continental também decidiram relocalizar em Singapura ao caminhar para o terceiro ano de restrições pandémicas.

Ao PLATAFORMA, o presidente da Associação de Convenções e Exposições de Macau, Irwin Poon Yiu Wing, alerta para a possibilidade de estas mudanças serem permanentes. “A indústria MICE nunca se tratou de uma competição entre empresas, mas sim entre cidades. A G2E Asia decidiu mudar-se para Singapura e, caso os clientes estejam satisfeitos, poderá não voltar [a Macau]”.

Fora Singapura, o líder associativo destaca a Tailândia como outro mercado que está a ganhar terreno. Como tal, sustenta que a política de prevenção epidémica de Macau pode trazer danos “irreparáveis” à indústria, com o seu impacto a ser sentido a “longo prazo”. Estas medidas de combate à Covid-19 são aceites entre os seus pares, mas apenas por “serem um fator fora do seu controlo”, comenta.

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Já o presidente da Associação dos Sectores de Convenções, Exposições e Turismo de Macau, Alan Ho, mostra-se relativamente otimista, acreditando que casos como a Jewellery & Gem ASIA Hong Kong e a G2E Asia são apenas temporários, pois “pretendem voltar à cidade” mal as restrições sejam levantadas. Na sua opinião, os pontos fortes de Macau continuam intactos e tal será um fator decisivo quando houver diminuição do controlo fronteiriço.

Segundo a Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC), Macau recebeu 449 eventos MICE em 2021. Uma descida significativa (70,8 por cento) quando se compara a 2019, quando se organizaram 1536 eventos a nível local. E até ao mês de junho de 2022, a cidade só recebeu 188 eventos (menos de metade do atingido em 2021).

Números que não preocupam Alan Ho, que vê a recuperação da indústria seguir uma direção positiva porque, por um lado, vários dos grandes eventos foram relançados, por outro, o regresso dos vistos eletrónicos e excursões provenientes da China continental entre finais de outubro e inícios de novembro devem incentivar mais expositores e visitantes a viajar para Macau.

DIVERSIDADE EXTINTA

Além de alguns projetos de longa data, existem também uma série de novos eventos que escolheram Macau como palco para 2022, como é o caso da Conferência Asiática de Visão Computacional Asian (ACCV, na sigla inglesa), realizada em abril.

Alan Ho diz que caso não haja imprevistos, o terceiro e quarto trimestre serão suficientes para atingir os níveis do ano passado. Enfatiza ainda que só se está a aceitar projetos adiados pela pandemia, admitindo que os expositores e os visitantes do mesmos foram os mais afetados.

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“São projetos que foram adiados, sendo ainda difícil atrair novos expositores e visitantes. Alguns expositores com reservas prévias serão reconsiderados devido aos atrasos da pandemia. Outros acabam por desistir, por isso, precisamos de procurar novos clientes. É um processo complexo”, explica.

Outro fator a ter em atenção é a dimensão destas empresas, que são normalmente PME (pequenas e médias empresas) muito suscetíveis a crises deste género.

Nesse sentido, Irwin Poon Yiu Wing menciona que licenças sem vencimento têm sido comuns e que, como resultado, perdeu-se muita da mão de obra. “Esta indústria depende maioritariamente de experiência, podendo demorar um ou dois anos a preparar novos funcionários”, avisa.

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Outra das preocupações do setor é a perda de diversidade entre expositores e visitantes profissionais dos eventos em Macau, já que sobrevivem de um “ciclo interno”.

De acordo com os dados da DSEC, dos 487 expositores que escolheram Macau no segundo trimestre deste ano, 447 são locais e 40 vieram de Hong Kong, ou seja, não houve qualquer expositor do Continente. Já visitantes profissionais de Macau foram apenas 42, com as restantes regiões reduzidas a “zero”.

O normal, como diz Alan Ho, é metade dos expositores serem do Interior e 10 por cento internacionais, incluindo Hong Kong e Taiwan. Por essa razão, acredita que o levantamento das restrições fronteiriças deve restaurar a diversidade das exposições e conferências em Macau.

Esta problemática começou em 2020, com o número de visitantes e participantes a ser afetado a vários níveis. Macau enfrenta uma série de problemas financeiros e o corte dos orçamentos de departamentos governamentais em 2023 significa uma dimensão reduzida para o setor dos MICE.

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Irwin Poon Yiu Wing não foge à questão e admite que reduzir a dimensão da indústria é inevitável, sendo que a sua grande preocupação não é a diversidade do mercado, mas sim que alguns dos projetos não identifiquem Macau como opção viável.

“É melhor ter alguma coisa do que parar completamente”, reitera.

HENGQIN AINDA EM “FASE DE DESENVOLVIMENTO

Comentando este modelo de desenvolvimento conjunto, Irwin Poon Yiu Wing refere que a indústria já começou a criar empresas na China continental, visto que “existem medidas de incentivo”. Mas esta cooperação ainda não traz frutos.

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“Atualmente parece-me que não existe grande atividade comercial em Hengqin, a população da região também é reduzida, o que faz com que a indústria esteja à espera das medidas detalhadas que serão anunciadas no próximo ano”.

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