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Primeiras deputadas trans no Congresso entre a euforia e o medo

Eléonore Hughes

A eleição das primeiras deputadas trans para o Congresso é um evento inédito no Brasil, que ocorre no meio de forte crescimento do bolsonarismo conservador, insensível às causas da comunidade LGBTQ

Erika Hilton (PSOL-SP) e Duda Salabert (PDT-MG), integrarão, a partir de janeiro, a Câmara Federal,  renovada nas eleições de domingo.

“Já dá pra dizer: TRAVESTI PRETA ELEITA!”, escreveu no Twitter Hilton, de 29 anos, agora representante do estado de São Paulo.

Também nas redes sociais, Salabert, 41 anos, comemorou ser a deputada federal mais votada da história de Minas Gerais. 

“Mesmo com ataques de setores da esquerda, ataques dos ciristas e das ameaças de morte da extrema-direita, ganhamos a eleição!”, exclamou.

Ambas chegam à Câmara dos Deputados em um momento de fortalecimento do bolsonarismo. O Partido Liberal (PL) do presidente terá a maior bancada, com 99 dos 513 assentos, 23 a mais do que atualmente. 

Além disso, Bolsonaro obteve no primeiro turno, no domingo, 43,20% dos votos – melhor do que o esperado nas pesquisas -, o que o deixa com a possibilidade de ser reeleito no segundo turno, em 30 de outubro.

“Muito feliz, apesar do cenário geral no Brasil ainda ser de apreensão e de muita luta para derrotar Bolsonaro e eleger Lula”, declarou Hilton à AFP.

Vereadora da cidade de São Paulo desde 2020, Hilton leva sua luta para a Câmara dos Deputados, em Brasília, onde sua agenda será “lutar para erradicar a fome e a miséria no nosso país, e garantir direitos para a comunidade LGBTQIA+”.

Pelo menos 9,3% da população brasileira se identifica como pertencente a essa comunidade, segundo levantamento do instituto Datafolha, publicado em setembro. Na eleição de domingo, 18 políticos LGBTQIA+ foram eleitos.

Ameaças de morte

Na Câmara, Hilton e Salabert enfrentarão resistência.

“O bolsonarismo mostrou uma força muito grande (governos, deputados)… O bolsonarismo, que representa os ultraconservadores, eles são frontalmente contrários aos direitos das pessoas LGBTQIA, estimulam essa violência que essas pessoas trans têm vivido fora e dentro da política”, disse à AFP Lígia Fabris, professora e coordenadora do programa de diversidade da Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV). 

“É preocupante em relação à integridade física, psicológica, e à vulnerabilidade dessas pessoas”, afirmou, se referindo às representantes recém-eleitas.

O medo não é infundado. O Brasil foi o país mais perigoso do mundo para pessoas trans em 2021, de acordo com o Trans Murders Monitoring Project, que registrou 92 mortes no ano passado. 

Salabert, por exemplo, foi votar no domingo em Belo Horizonte usando colete à prova de balas por recomendação da polícia.

“(Recebi) Cinco ameaças de morte nos últimos 30 dias. Ontem chegou mais uma… Foram e-mails, carta e até um site feito exclusivamente para descrever formas que querem me matar”, denunciou.

Keila Simpson, presidente da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), alerta que muitos apoiadores de Bolsonaro são “pessoas que não conseguem conviver com a diversidade”. 

A Antra, no entanto, registrou um aumento de 44% dos candidatos transexuais em 2022, em comparação com 2018.

“Polo progressista”

Além das duas deputadas federais, Linda Brasil (PSOL) tornou-se a primeira deputada estadual trans em Sergipe, Dani Balbi (PCdoB) foi eleita para a Assembleia do Rio de Janeiro, e Carolina Iara (PSOL), para a de São Paulo. 

O Brasil fez progressos em termos de inclusão de pessoas trans, disse Fabris, observando a decisão do Supremo Tribunal de 2018 sobre a mudança de gênero em documentos civis. No entanto, destacou a pesquisadora, há mais candidatos LGBTQ e ao mesmo tempo um fortalecimento do bolsonarismo hostil. 

Hilton tentará formar um “novo polo progressista, com novas pautas, ideias e propostas”.

“Teremos trabalho, mas, hoje, já estamos em melhores condições do que ontem”, celebrou. 

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