Crise económica vai criar “profundas mudanças” na relação Europa-África

por Mei Mei Wong
Gonçalo LopesGonçalo Lopes

A relação Europa-África ainda tem muitos ressentimentos devido a aspetos da Guerra Fria, afirma José Maria Neves, Presidente de Cabo Verde. Já Marcelo Rebelo de Sousa, seu homólogo de Portugal, diz que “os africanos têm de ver compromissos firmes com a Europa”

O Presidente de Cabo Verde, José Maria Neves, disse na passada sexta-feira que a crise económica vai criar “profundas mudanças” na relação entre os continentes europeu e africano, admitindo que há ainda “ressentimento” e resquícios da Guerra Fria.

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A Europa vai relacionar-se com África tendo em conta a complexidade existente no continente africano, há ainda muito ressentimento e há persistência de aspetos da Guerra Fria, é preciso considerar esses elementos no debate das relações entre África e Europa”, disse José Maria Neves, no diálogo presidencial com o homólogo português, Marcelo Rebelo de Sousa, encerrando o Fórum Eurafrica, que decorreu na quinta e na sexta-feira em Carcavelos, arredores de Lisboa.

“A questão não é só o envelope financeiro, a União Europeia pode meter 150 mil milhões de euros para o Global Gateway, a China pode colocar 3 mil milhões, a Rússia outros tantos, mas agora há uma questão que um dos presidentes destacou, quando disse que o seu país não votou a resolução da ONU de condenação, mas ele estava lá, em Bruxelas”, na reunião que em junho juntou vários chefes de Estado africanos numa cimeira com a União Europeia.

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Relatando a experiência da participação nessa reunião, José Maria Neves disse que a presença desse chefe de Estado, que votou contra a condenação da ONU à invasão da Ucrânia pela Rússia, tinha significado, e acrescentou que “as respostas da União Europeia têm de ter em conta essa complexidade existente no continente africano“, concluindo que “a cimeira de Bruxelas e as visitas de alguns chefes de Estado e de Governo a África demonstram já algum interesse em introduzir mudanças estratégias importantes no relacionamento“.

José Maria Neves, Presidente de Cabo Verde

José Maria Neves, destacando depois a importância dos mares no futuro económico.

“Todas as áreas são importantes. Agora estamos a falar muito do mar no quadro da década dos oceanos, de podermos garantir o aceleramento do ritmo de crescimento e desenvolvimento de Cabo Verde, explorando de forma sustentável todos os recursos marinhos, toda a biodiversidade, toda a problemática da economia azul. Estamos a falar das energias renováveis, da transição digital, áreas novas em que Cabo Verde tem potencial. E podemos pôr tudo isto ao serviço do desenvolvimento”, acrescentou o líder cabo-verdiano, referindo depois também a importância da CPLP e da língua portuguesa no crescimento dos países africanos.

“A participação de cada um dos nossos países nas diferentes organizações regionais – com as nossas independências, o português passa a ser língua da União Africana -, é cada vez mais língua da CPLP e então esse pilar também se está a consolidar, a consolidar-se e afirmar-se a nível internacional. E queremos todos fazer um esforço. Temos um grande futuro à nossa frente. O futuro depende de nós e do nosso trabalho ”, concluiu.

POTENCIAR ÁFRICA E DEIXAR “CHINA QUIETINHA”

Por seu turno, o Presidente da República português, Marcelo Rebelo de Sousa, defendeu que “os africanos têm de ver do lado europeu compromissos firmes“, seja em termos estratégicos, militares, económicos, financeiros ou alimentares.

O líder máximo português defende mesmo que o futuro de África está diretamente relacionado com a Europa e não qualquer outro continente.

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“Portugal, com sucessivos governos e em circunstâncias diversas tem sido firme nessa aposta com África. Aliás, também a União Europeia em momentos determinados foi firme nesse alinhamento com África. Neste momento, infelizmente, tem desculpas porque está assoberbada de problemas”, afirmou.

José Maria Neves e Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República de Portugal

Para o chefe de Estado português, “é preciso dar maior firmeza aos compromissos assumidos pela Europa, pelos países europeus, em relação a África” porque “a Europa tem de sobretudo ser consequente e continuar a ver que em África há uma imensidade de soluções e potencialidades”, salientou Marcelo, criticando depois quem não vê tudo isto no continente africano“.

“A Europa não pode ter países importantes que ou ignoram ainda a África ou, então, prometem estar presentes, aparecem uma vez e depois pedem a Portugal para ficar a substituir. Nós não nos importamos porque é a nossa vocação, mas conviria que eles também ficassem”, afirmou Marcelo Rebelo de Sousa.

Questionado sobre “como tratar a China no quadro que existe atualmente”, sobretudo devido às ligações deste país ao continente africano, a quem muitos países de terceiro mundo recorrem economicamente, Marcelo disse que “talvez seja melhor deixar a China quietinha para já”.

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“Saber que existe, saber o que representa em termos de penetração económica, mas talvez não somar problemas. O desafio para as democracias já é muito grande, talvez não somar os problemas todos ao mesmo tempo”, avisou o presidente português.

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