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Os Bobos de Ouro – 1ª parte

João MeloJoão Melo*

Numa iniciativa que garanto prolongar-se por cem anos ou cem milhões de quilómetros, o que aparecer primeiro, inicio hoje a atribuição dos prémios “Bobos de Ouro” que pretendem premiar quem ou o que mais se destacou durante o ano. Eis as duas primeiras categorias.

Bobo de Ouro “Goethe” para “A palavra do ano”

Nada descreve melhor o carácter dos homens do que aquilo que eles acham ridículo – Johann Goethe

A palavra do ano é… fiambre. Talvez não conste das mais pesquisadas no Google mas sou eu que escolho, aguentem-se. Numa altura em que as preocupações se centram na sobrevivência, a saúde e a alimentação tornaram-se temas prementes do dia-a-dia. Nunca ao longo da minha existência tive a cabeça e o tempo tão ocupados de fúteis viagens por farmácias à procura de auto-testes, e prosaicas listas de supermercado. “Fiambre”, um produto que nem compro para mim, ganhou uma dimensão inusitada. Confirmo, ainda pensei na palavra “vácina” porém todas as publicações sérias a elegerão, será desnecessário eu espetar-vos mais uma dose, chega-me ouvir alguém dizer “vácina” e responder “vá você”. E porquê fiambre? Porque sim, gosto da palavra, é ridícula. Indagando a origem descobri a nuclear razão da hilaridade: vem do espanhol. Claro! A palavra procede de “friambre”, derivado de “frio”, e significa carne fria. Em espanhol também designa um corpo morto, o fiambre é aliás o nome de um prato de carnes frias tradicional da Guatemala que se come no dia de todos os mortos. Só nessa língua um presunto é um presumido, “follar” tem o mesmo significado de “desfolhar”, e uma grávida está embaraçada. Após tantos anos ainda me sinto embaraçosamente tolo ao dizer “dê-me 100 gramas de… fiambre”. Prefiro comprá-lo embalado a fazer figura de parvo. Será que fui hipnotizado e programado para me rir assim que soltem a senha “fiambre”? Estarei inconscientemente a gozar a vida zombando da morte? Cada um tem a sua pancada. Ao primo de um amigo com quem eu jogava Pictionary bastava que desenhassem três riscos para imediatamente gritar “caixa”! Uma vez perguntei-lhe o motivo, ele disse “não sei, digo sempre caixa”. Enfim, voltando à vaca fri… ao porco frio. Fiambre é uma palavra cuja comicidade se intensifica caso seja dita de forma bem articulada, desmancha incontinenti a seriedade de quem a profere. Compreendo que muitos não vislumbrem a piada, de facto ela perde-se quando corriqueiramente empregue por quem diz “chupa lá” (desculpa lá), ou “a xoas” (“as pessoas”) como o António Costa ou o Marcelo. E se lhe juntarmos o substantivo “sandes” até o Ramalho Eanes se transforma num garoto de sapatos de verniz, calções, fatinho à marujo e chupa na boca. “Chupa lá, Ramalho”… Não há volta a dar, “sandes de fiambre” apenas é ultrapassada em palermice por “sande de fiambre” ou “sandes de queijo e fiambre”. “Queijo” merecia igualmente uma distinção, fica para a próxima. Aqui tendes o que aprecio em fiambre, não o sabor e sim o seu potencial explosivo se mal manuseado (ou seja, bem dito), a capacidade quântica de existir simultaneamente em vários estados, servir de alimento para a vida ou simbolizar a morte. Num momento estamos a comer uma sandes de fiambre, no outro tombamos para o lado, mortos. Já dizia Thomas Paine que muitas vezes, o sublime e o ridículo encontram-se tão estreitamente relacionados que é difícil classificá-los separadamente. Um passo além do sublime e cai-se no ridículo; um passo além do ridículo e chega-se ao sublime.

Bobo de Ouro “Churchill” para “O sucesso desportivo do ano”

O sucesso é saltar alegremente de fracasso em fracasso sem perder o entusiasmo – Winston Churchill

Nada mais apropriado que a seguir à dissertação sobre o sublime e o ridículo atribuir o prémio “Churchill” a Jorge Jesus. JJ chegou ao Benfica em 2020 prometendo que a equipa iria jogar o triplo. A meio da época a equipa não jogava um terço, e uma vez obrigado a explicar a incongruência respondeu ao jeito de puxar pela memória “eu disse que íamos jogar o dobro, ‘né?” Com o desplante de um vendedor de carros em segunda mão baixou logo uma potência à fasquia, alegando que o covid é que o impediu de pôr o Benfica a jogar mais, não fora a pandemia “uma coisa que ninguém controla” e a promessa ter-se-ia cumprido: “ó amigo, se o motor não se tivesse desprendido do chassis tinha aí carro para uma vida; então eu é que controlo os parafusos dos apoios? P’amor d’Deus” Se o Benfica ganhar o campeonato repetirá “eu bem vos disse”, se não ganhar é-lhe indiferente, possui lata de sobra para arranjar uma desculpa exterior à sua responsabilidade, monta o stand em novo local e passa lá a vender chaços. Uma mãe pobre que anda de autocarro e cria sozinha sete filhos não se pode considerar uma mulher de sucesso, um tipo que na sua própria avaliação tem unhas para guiar um Ferrari e gere um plantel de milhões parece tê-lo, independentemente de os números atestarem ou não. Por acaso teve sucesso no Brasil todavia, tendo em conta as idiossincrasias do país, até isso confirma que a essência do sucesso reside na aparência. Entretanto, qual personagem marialva dos fados de outrora, não desmente um romance público com uma amante apesar de estar casado. Refiro-me obviamente ao Flamengo e ao Benfica. A amante (Flamengo) veio de propósito a Portugal para o pressionar a largar a mulher, perseguindo-o há mais de uma semana por todos os sítios onde ele vai, e nem sequer passou o natal junto da sua família, tal é o fascínio pelo homem. A esposa (Benfica) permite esta humilhação pública porque provavelmente deseja vê-lo pelas costas, e nenhuma das partes avança para o divórcio já que aquele que quebrar os laços matrimoniais terá de pagar a pensão de alimentos. Na boa tradição do marialva português, envaidecido pelo assédio, atrevido fora de casa não obstante manso e cobarde dentro dela, na única declaração pública referente ao caso JJ afirmou “isto não é o que eu quero ou o que o Flamengo quer. Tenho contrato até Maio, não tenho hipóteses de sair”. Por outras palavras: “amor, eu queria mas ela não deixa”.

Baseado nas premissas explanadas não encontro diferente figura no meio desportivo que incorpore melhor o sucesso; quer ganhe ou perca Jesus fica sempre por cima. A mulher em Portugal pô-lo na rua, a sua maior rival a quem ele jurou ser o primeiro amor albergou-o, pisgou-se de fininho para as Arábias, casou com uma brasileira, despachou-a a meio do conúbio para voltar a casar com a primeira mulher, preparando-se agora para cair nos braços da amante, a segunda ex-mulher, a brasileira, aos 67 anos de idade. Ah macho! Confusos? Esperem, o enredo da novela ainda vai a meio, o falatório na imprensa e memes nas redes sociais nunca abrandou, sem embargo mais do que receber um insignificante Bobo do Ano este personagem arrisca-se a ser imortalizado em letras de fados e sambas. Se isto não é ter sucesso…

*Músico e embaixador do PLATAFORMA

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Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

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