Desenvolvimento urbano em Macau pouco claro

por Guilherme Rego
Johnson Chao

Aberta a consulta pública sobre o Segundo Plano Quinquenal (2021-2025), um dos objetivos do Governo de Macau é apostar no desenvolvimento urbano, estabelecido no tópico da “promoção aprofundada na construção de uma cidade com condições ideais de vida”. Ao PLATAFORMA, Ron Lam, deputado da Assembleia Legislativa, e Lui Chak Keong, arquiteto e membro do Conselho do Planeamento Urbanístico, explicam que o documento não apresenta objetivos claros e criticam a determinação do Governo em certas áreas ligadas ao desenvolvimento urbano. Nos próximos cinco anos, pedem um desenvolvimento mais célere e bem planeado, até para coordenar melhor a zona de cooperação, em Hengqin.  

Sobre o desenvolvimento urbano, o documento de consulta menciona que o “Plano Director da Região Administrativa Especial de Macau (2020-2040)” será publicado nos próximos cinco anos, com a inclusão de um planeamento detalhado de, pelo menos, cinco unidades operativas de planeamento e gestão (UOPG) entre as 18 existentes. Ao PLATAFORMA, Ron Lam assevera que o objetivo será cumprido, mas deve ser acelerado, sem comprometer a sua organização. “Ao longo dos próximos cinco anos serão planeadas cinco áreas. Por essa lógica, serão precisos 18 anos para terminar todas? O ritmo de implementação tem de ser melhorado”, sublinha.  

Ron Lam, deputado da Assembleia Legislativa.

Lui Chak Keong aponta para o facto de o período de consulta do Plano Diretor já ter sugerido esta planificação das UOPG e que a prioridade deve passar pelo centro histórico de Macau, “começando pelo ponto de vista da proteção, seguindo depois para o Cotai”. O planeamento destas áreas “é urgente”, pois “desenvolvem a um ritmo acelerado”, explica. O arquiteto enfatiza que não pode haver mais adiamentos, dado que nos próximos cinco anos, a cidade enfrenta um desenvolvimento pós-pandémico, aliado à construção da Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin. Caso o Plano Diretor seja reagendado, Lui Chak acredita que muitos dos projetos lá inseridos não vão acompanhar a evolução de Macau, dando um exemplo: “A planificação da área industrial de Macau poderá ser fora da cidade, no distrito de Shenhe, em Hengqin, para que o espaço de Macau seja utilizado para outros fins”.  

Leia mais sobre o assunto em: “Hengqin é a plataforma para a diversificação económica”

Quanto à renovação urbana, o documento propõe que, após o período de consulta, seja promovido o “Regime Jurídico da Renovação Urbana”. Ron Lam critica o facto deste regime continuar em fase de “promoção”, sem qualquer data definida para a sua implementação legislativa. 

Aproveitamento racional dos terrenos 

O documento de consulta refere que, ao abrigo do Plano Diretor da RAEM e das disposições da “Lei de terras”, serão selecionados “terrenos adequados para a abertura do concurso público, destinados à construção das frações de edifícios privados”. Para o aproveitamento de “terrenos ainda não aproveitados” o Governo propõe a criação de “espaços multifuncionais para a realização de atividades recreativas”.  

Lui Chak Keong: “O desenvolvimento urbano não pode só consistir em urbanização. Os espaços verdes também são essenciais para a qualidade de vida dos nossos residentes. “

O deputado explica que tem de se ir ao detalhe, pois sem esse tipo de planificação, “não é possível assumir uma direção oficial para o uso destes terrenos”. Acrescenta ainda que este problema “deve ser resolvido o quanto antes, caso contrário será impossível tirar partido das áreas por aproveitar”.  

Sobre o concurso público dos terrenos, Ron Lam concorda com a necessidade de haver um sistema de gestão de reserva destes recursos. “As listas de terrenos reservados, o calendário dos respetivos leilões e a porção de terreno dedicado à habitação pública e privada devem ser informações de conhecimento público. Porém, os objetivos específicos do Plano Quinquenal ainda não são claros”, alerta. Lui Chak Keong sugere que, primeiramente, sejam utilizados um ou dois terrenos para concurso público e, no fim, seja analisado o resultado. Quanto à forma correta de utilização destas áreas, acredita que devem ser tidos em consideração os terrenos na zona antiga da cidade, pois “precisam de ser renovados”. Para o arquiteto, esse é o “uso correto dos terrenos”, sob pena de contínuo envelhecimento e, posteriormente, “difícil a renovação”.  

Sem normas para espaços ecológicos  

O Plano Quinquenal aponta também para a melhoria de, pelo menos, dez espaços verdes, com a renovação anual mínima de instalações de entretenimento e lazer de dois espaços verdes. Lui Chak Keong salienta a importância da implementação de espaços verdes em Macau num período pós-pandemia. “O desenvolvimento urbano não pode só consistir em urbanização. Os espaços verdes também são essenciais para a qualidade de vida dos nossos residentes. Claro que é impossível criar um parque enorme no meio do centro histórico de Macau, mas deve-se pensar em formas de renovar ligeiramente alguns espaços e interligá-los”.  

Lui Chak Keong, arquiteto e membro do Conselho do Planeamento Urbanístico.

No que diz respeito à área marítima, o arquiteto acredita que a indústria turística deve tirar partido deste recurso, deixando de recorrer à reclamação de terras. “Recentemente, ouvi dizer que existem sugestões para reclamar terras na costa sul de Coloane. É assim tão necessário? Coloane é uma zona onde ainda se vê grande parte do mar, a preservação da natureza e área costeira devem ser prioridades”, remata.  

Ron Lam: “Muitas regiões, incluindo Hong Kong, (…) têm calendários claros sobre a redução dos veículos a combustível fóssil. No entanto, Macau apenas define este objetivo simples. “

A chave está na definição de objetivos, indica Ron Lam. “Estas normas devem ser estabelecidas durante o Plano Diretor e implementadas posteriormente em cada distrito, de acordo com as suas características demográficas. No entanto, a planificação atual não tem base científica”, lamenta o deputado.  

Controlo de transportes 

No documento de consulta inclui-se uma proposta de controlo anual sobre o crescimento do número de veículos – não superior a 3 por cento -, a construção de um ambiente pedonal conveniente e sem barreiras, assim como a instalação de elevadores e escadas rolantes para colmatar o problema topográfico da cidade. “O foco principal não deve ser a limitação do crescimento de veículos”, explica Ron Lam, enfatizando que a reforma do sistema de transportes necessita de clarificação: “Macau vai ser uma cidade centrada nos pedestres? No metro? Nos autocarros? O Plano Quinquenal só apresenta pequenos ajustes”. O deputado propõe ainda uma auditoria para analisar a performance do metro ligeiro, a fim de se entenderem os custos associados e qual a melhor solução para o futuro.  

Proteção do ambiente natural e ecológico 

O Plano Quinquenal menciona que, nos próximos cinco anos, serão abatidos “todos os veículos pesados de passageiros de Macau com Norma Euro 4”. E no terraço das habitações públicas a serem construídas, será disposto “um sistema fotovoltaico ou um espaço de arborização não inferior a 30% da área descoberta”. Ron Lam questiona a determinação do Governo em proteger o ambiente: “Porque é que estes sistemas fotovoltaicos só se aplicam a habitações públicas? Porque não em todos os edifícios?”. Relativamente à abolição de veículos Norma Euro 4, acredita que o abate tem mesmo de ser feito nos próximos cinco anos. “Muitas regiões, incluindo Hong Kong, já baniram a importação de veículos Norma Euro 5 e têm calendários claros sobre a redução dos veículos a combustível fóssil. No entanto, Macau apenas define este objetivo simples”, critica.  

No que toca à redução das emissões de carbono, Ron Lam deixa um alerta: “No final de contas, ninguém se importa realmente. O Governo tem uma equipa dedicada a esse objetivo, liderada pela Direcção dos Serviços Meteorológicos e Geofísicos; no entanto, é claro que os seus recursos e localização não são os ideais para assumir esta responsabilidade”. O deputado acrescenta que a coordenação dos trabalhos de redução das emissões de carbono “devia ser responsabilidade da Direcção dos Serviços de Proteção Ambiental, para que fosse definido um objetivo claro”.   

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