Pandemia a quanto obrigas

por Guilherme Rego
Guilherme Rego e Filipa Caeiros Rodrigues

O ano letivo 2020-2021 terminou. Para muitos, a vida em Macau continuará a ser o seu quotidiano. No entanto, para alguns alunos da Escola Portuguesa de Macau, especificamente para os que terminaram o 12º ano escolar, a realidade será outra. Em conversa com o PLATAFORMA, estudantes explicam os receios, medos, dúvidas e dificuldades que a pandemia de Covid-19 trouxe no planeamento da próxima etapa das suas vidas – o ingresso no ensino superior.  

Todos os anos o mesmo fenómeno se observa. A grande maioria dos alunos que terminam o seu percurso na Escola Portuguesa de Macau opta por explorar novos horizontes, tendo como destino predileto Portugal. No entanto, a pandemia de Covid-19, que teve o seu início em 2019, em Wuhan, veio confrontar os estudantes e pais com uma nova realidade.  

Até agora, Macau registou apenas 56 casos e nenhuma morte associada à Covid-19. Ainda não foi identificado qualquer surto comunitário e nenhum dos profissionais de saúde foi infetado. A nível mundial é considerado um caso de sucesso, mas ao sair do território, a situação sanitária é radicalmente diferente.  

Dos seis estudantes contactados pelo PLATAFORMA, apenas um alterou o seu plano original face ao desenvolvimento da pandemia de Covid-19. “Durante anos planeei regressar a Portugal para ingressar no ensino superior. O desenvolvimento da pandemia fora da RAEM mudou completamente a minha trajetória de vida”, desabafa Ariana Goitia, de 18 anos, que irá prosseguir os estudos na faculdade de Direito, da Universidade de Macau.  

“Atualmente, planear e marcar viagens é bastante diferente do que estávamos habituados” 

Relativamente aos outros estudantes, apesar do percurso manter-se o mesmo, as dúvidas foram permanentes. “Até me inscrevi nas universidades locais, caso o desenvolvimento da pandemia de Covid-19 me impedisse de viajar para o meu destino”, disse Madalena Lopes, de 17 anos, que irá estudar no Institute of the Arts Barcelona (IAB), em Espanha. Luísa Vilão fez o mesmo. Caso o plano original falhasse – curso de gestão, na Universidade Nova de Lisboa (Carcavelos) – frequentaria o primeiro ano de licenciatura na Universidade de Macau.  

Porém, nem todos sentiram a mesma insegurança. Sara Oliveira e Henrique Silva, ambos de 18 anos, garantiram ao PLATAFORMA que a pandemia não influenciou as suas escolhas. A decisão já estava tomada antes sequer do novo coronavírus ser uma realidade e, “de uma maneira ou de outra”, o destino estava traçado. Sara frequentará o curso de tradução na Universidade Nova de Lisboa e Henrique a faculdade de arquitetura da Universidade de Lisboa. 

Planeamento das viagens 
Para os que saem agora do território, é ainda necessário o planeamento das viagens que, como Madalena salienta, torna-se complicado quando o assunto se refere a “deslocações internacionais nesta época de pandemia”. “Atualmente, planear e marcar viagens é bastante diferente do que estávamos habituados. Devido à redução do número de voos, já não é fácil tratar de tudo online. Agora é necessário recorrermos a uma agência de viagens para nos ajudar. Além disso, a incerteza de que o voo irá mesmo realizar-se acaba por ser grande. Contudo, pelo que sei, existem voos disponíveis de Macau para Portugal todas as quartas-feiras e sábados, não considerando que tenha sido difícil planear a viagem”, explica Luísa. “Felizmente, já sabia há algum tempo onde irei morar. Nada se alterou nessa matéria, mas a viagem para Portugal ainda me traz alguma ansiedade, pois a verdade é que, apesar de planear seguir para Lisboa no mês de agosto, ainda não tenho passagem marcada. Também não ajuda o facto de as rotas serem diferentes das habituais e muitos dos voos serem cancelados”, acrescenta Sara.  

“Não sei quando poderei voltar” 
Teresa Castelo, de 18 anos, com destino marcado para aterrar em Lisboa, afirma que sair de Macau “é uma tristeza”, sobretudo porque não sabe quando poderá regressar, nem quando vai voltar a ver a sua mãe. A Região Administrativa Especial de Macau impõe uma das quarentenas mais longas do mundo, obrigatória no regresso. Embora Henrique acredite que esta medida seja um dos principais fatores para Macau ter-se tornado “um lugar seguro”, mediante o contexto pandémico fora da cidade, a verdade é que o isolamento de cerca de 21 dias causa entraves a muitos estudantes que planeavam passar as férias no território. “É algo que espero não ter de passar”, reflete Sara. “Não sei quando poderei voltar ou quando é que a minha mãe poderá ir ter comigo. No entanto, não ponho de lado a opção de fazer quarentena, pese o facto de ser muito complicado durante o período de aulas”, conclui Teresa. 

“Não me quero pôr em risco” 
A cinco de maio, as autoridades de saúde lamentavam a baixa taxa de vacinação, quando pouco menos de 72 mil pessoas (cerca de 10% da população local) tinham recebido apenas uma dose das duas vacinas disponíveis no território – Sinopharm e BioNtech -, apesar “de se ter investido muito trabalho em publicidade e promoção” junto dos quase 700 mil residentes. Passados quase dois, no fim de junho, o universo de vacinados passou para cerca de um terço da população, segundo dados oficiais, mas a oferta continua muito maior do que a procura.  

Os estudantes entrevistados pelo PLATAFORMA que planeiam estudar no exterior já foram vacinados com as duas doses. “Ao ir estudar para outro país, onde a pandemia não está controlada, não me quero pôr em risco. Nem a mim nem a mais ninguém”, reflete Sara Oliveira. “É sempre importante a proteção. Acredito que só a vacinação generalizada pode trazer alguma normalidade ao dia a dia das pessoas”, acrescenta Madalena. Apenas Ariana, que permanecerá em Macau, não se vacinou. “Ainda não senti a necessidade de me vacinar. Não tenho essa urgência, mas está para breve”.  

“Aproveitar ao máximo” 
O peso que a pandemia de Covid-19 trouxe às decisões dos estudantes, quanto ao seu futuro sentiu-se. Notam-se mais dificuldades no planeamento e na tomada de decisões. Mas, no fim, todos aguardam ansiosamente e com positividade esta nova etapa. Apesar das incertezas, existe um sentimento comum: “aproveitar ao máximo”. “Gostava de ter aulas presenciais e de experienciar todas as atividades universitárias, como as praxes, por exemplo”, refere Sara. “Quero integrar-me bem, conseguir ultrapassar as dificuldades iniciais e ter sucesso nos estudos”, diz Henrique. “Vai ser um ano de descobertas, especialmente porque vou para uma cidade nova”, explica Luísa. Madalena espera ter “uma adaptação plena” e a Teresa espera que os anos de faculdade “sejam tão bons quanto todos dizem que serão”. Ariana compara esta nova fase a “uma página branca de um livro”. “Tenho a oportunidade de escrever um novo capítulo na minha vida”, conclui. 

Escola Portuguesa de Macau

O jornal contactou a EPM perguntando quais as medidas excepcionais tomadas e qual o acompanhamento dado aos alunos do 12.º ano neste atípico ano de pandemia. Às questões colocadas, a direção da escola confirmou que a EPM acompanhou a alteração do calendário de exames nacionais decidido pelo Ministério da Educação português, com a primeira fase dos exames a realizar-se em julho e a segunda fase em setembro. A primeira fase decorreu dentro da normalidade e com o consequente termo das aulas umas semanas mais tarde do que inicialmente previsto. A EPM confirmou, também, que foi dado o habitual acompanhamento aos alunos que agora ingressam no ensino superior, no âmbito os exames, das provas específicas e dos concursos para o ingresso no ensino superior, não tendo havido quaisquer aconselhamentos especiais relativamente à pandemia.
Questionada, ainda, sobre possíveis alterações por parte dos estudantes na escolha das universidades e países a ingressar, nos dois últimos anos devido à Covid-19, a escola esclareceu que a maioria prosseguirá os estudos em Portugal.

À recente saída de oito docentes, a EPM garante já ter procedido à substituição dos mesmos e espera que o próximo ano letivo se inicie com regularidade.

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