Dependência do plástico preocupa especialistas brasileiros

por Filipa Rodrigues

A Comissão do Meio Ambiente brasileira realizou uma audiência pública virtual no início desta semana sobre a poluição por plásticos descartáveis. Representantes de organizações não-governamentais e da indústria do setor concordaram com a dimensão do problema, que afeta a natureza e a economia, e declararam esperar medidas de incluam políticas públicas setoriais, incentivo à reciclagem e aprimoramento no planeamento de produtos

O professor André Barreto, coordenador do Programa de Monitoramento de Praias (PMP) da Petrobras em Santa Catarina, sublinhou a preocupação crescente da comunidade científica com a acumulação de lixo marinho, especialmente de plástico. Segundo Barreto, a pesquisa é importante porque através do conhecimento do impacto sobre os animais é possível pensar em atividades de mitigação.

“O plástico tem uma grande permanência no ambiente e a respetiva produção em massa a partir da década de 1940 fez com que houvesse cada vez mais quantidade no ambiente, porque também não se degrada. Isso facilita a acumulação desse material”, referiu.

Como exemplo do trabalho dos PMPs, Barreto mencionou que, de 265 tartarugas examinadas, 70% tinham resíduos de origem humana e, desses resíduos, 89% eram plástico.

Outro dos intervenientes, Marcelo Montenegro, coordenador do Programa de Justiça Socio Ambiental da Fundação Heinrich Böll no Brasil, disse haver muito plástico no planeta: em 60 anos de fabrico foram produzidos mais de 10 mil milhões de toneladas e a produção aumenta a cada ano.

“Se fossem colocados em balanças todos os seres humanos e animais juntos, pesariam cerca de 4 mil milhões de toneladas. Ou seja, todo o plástico produzido pesa duas vezes e meia mais do que todos os animais e humanos juntos”, denunciou.

Montenegro também observou que, em toda a cadeia produtiva, o plástico produz e emite gases com efeito estufa e apontou o consumo involuntário de microplásticos como ameaça à saúde humana nos aspetos físico, químico e biológico. O baixo índice de reciclagem de plástico também foi apontado — cerca de 1,28%, segundo levantamento do Banco Mundial — e, no caso brasileiro, de 155 praias analisadas no Atlas do Plástico, a maioria foi encontrada suja ou extremamente suja, sendo que 70% a 85% do lixo encontrado é plástico.

“O aumento da concentração de lixos em praias pode levar a uma perda anual entre US$ 880 mil a US$ 8,5 milhões para o município. Isso sem contar com o impacto também económico, social e ambiental das comunidades tradicionais que usufruem da praia para sobreviver”, explicou, lembrando que enfrentar o “tsunami de plástico” depende de políticas públicas, consciencialização e transparência.

Impacto negativo provocado pela pandemia

Vitor Pinheiro, coordenador da campanha Mares Limpos no Brasil, comentou o efeito negativo da poluição plástica sobre os destinos turísticos, especialmente os que mais atraem estrangeiros e criticou a falta de prioridade de agentes públicos e privados no combate ao problema. Pinheiro, que representa o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), também associou a crise da covid-19 ao agravamento da situação da presença de plásticos nos oceanos. “As máscaras cirúrgicas lançadas na natureza podem levar 450 anos para se degradarem, o aumento de uso de material descartável aumentou em 12% na cidade de São Paulo e só uma única aplicação de entrega de refeições (com embalagens em plástico) triplicou as entregas desde o ano passado”, denunciou.

De acordo com os dados apresentados por Pinheiro, em todo o mundo os plásticos matam cerca de 100 mil animais por ano, causando US$ 13 mil milhões em danos e, só no Brasil, cada pessoa consome 1.280 embalagens anualmente.

Representando a Associação Brasileira da Indústria de Plástico (Abiplast), Paulo Henrique Rangel Teixeira pediu um “olhar sistémico” sobre as questões de sustentabilidade quando se oferecem propostas de substituição de plásticos por outros produtos, alertando que não se trata de uma decisão única e simples.

Para Rangel, qualquer política de substituição deve ser alicerçada em cálculos de custo-benefício para o meio ambiente e os programas para banir de plásticos de uso único (especialmente as embalagens de consumo) acabam por sinalizar “insegurança jurídica” para as empresas que já investiram no cumprimento da logística reversa determinada pela Política Nacional de Resíduos Sólidos.

Vitor Pinheiro assinalou ainda para as novas legislações nacionais relacionadas com a utilização do plástico, as quais vão estar em destaque na Assembleia de Meio Ambiente da Organização das Nações Unidas.

“Sem a participação do setor privado e também do Estado, como regulador, que dê uma linha de trabalho, não se consegue fazer passar a mensagem sobre esta questão”, concluiu.

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