Macau não é um “deserto” de biodiversidade

por Filipa Rodrigues
Meimei Wong

“Macau é como uma ilha, alguns insetos não conseguem daqui fugir, acabando por evoluir e tornar-se espécies endémicas da região. Estes animais têm ao longo do tempo vindo a adaptar-se ao clima e ecossistema locais, e caso se tornem extintos, outras espécies desaparecerão com eles”. Danny Leong foi o primeiro entomologista a descobrir e a dar nomes as espécies endémicas em Macau como Leptanilla macauensis, Meristolohmannia macaoensis e Dimiodiogalumna ilhaverdeensis.

De acordo com dados da Direção dos Serviços de Proteção Ambiental, em 2020 foram encontradas em Macau nove espécies de anfíbios e 712 espécies de insetos. Danny Leong explica que o ecossistema da cidade está extremamente fragmentado, não existem canais ecológicos de ligação mútua entre as montanhas ou parques da ilha da Taipa com a península, e grandes animais não conseguem habitar em Macau. Num relatório publicado em 2017, Danny Leong, juntamente com Benoit Guénard, descobriram que existem pelo menos 113 espécies de formigas em Macau. Para Leong, a espécie mais característica da cidade é a Leptanilla macauensis. “A descoberta de novas espécies nesta cidade que é considerada um deserto de biodiversidade vai contra a crença de muitos de que não existem animais endémicos em Macau”, diz.

Apesar do número reduzido de Leptanilla macauensis, a descoberta despertou um interesse pela biodiversidade de Macau entre os habitantes locais. Danny Leong deseja por isso que o Governo defina o local onde a Leptanilla macauensis foi descoberta na Ilha Verde como área de conservação ecológica, apresentando a ecologia natural e cultural da região ao público. Esta espécie, nativa a Macau, está a ser destruída pela poluição e desenvolvimento urbano. “Estas formigas Leptanilla macauensis vivem num ambiente mais fresco no subsolo, todavia, com o efeito de estufa e calor gerado por equipamentos de ar condicionado da região, a longo prazo receio que as condições de subsistência para estas formigas sejam afetadas”, assinala.

Para prevenir, Danny Leong propõe que sejam plantadas mais árvores no respetivo habitat e que se incentive os edifícios da região a criarem “telhados verdes”. O Governo deve ainda liderar esta transformação ao definir uma certa proporção de telhados e paredes com plantas em novas construções e edifícios governamentais. O investigador queixa-se de que grande parte da população da cidade não conheça a importância de espaços verdes em edifícios. “Muitos acreditam que eles são supérfluos, como uma planta num vaso, sem saberem o impacto que têm no desenvolvimento sustentável da cidade”, atira.

Além da transformação sustentável da cidade, Danny Leong lamenta que Macau não tenha conseguido usar as espécies nativas para desenvolver uma indústria amiga do ambiente. Por exemplo em Singapura, na China continental e até em Hengqin, são usadas moscas soldado-negro para tratar de resíduos de cozinha.

“As moscas soldado-negro consomem quatro vezes o respetivo peso em resíduos todos os dias. Porque não aproveitamos estes animais no ecossistema alimentar e tratamento de resíduos, e continuamos a incinerar e poluir o ar”, pergunta.

Tendo estudado entomologia em Hong Kong depois de terminar os estudos em Taiwan, Danny Leong afirma que Macau é o local com menos referências de estudo desta área. Universidades de Taiwan, Hong Kong, Singapura e até Shenzhen estão a estudar a biodiversidade local e a utilizar esse conhecimento para desenvolver o ecoturismo e o uso de plantas e animais medicinais em tratamentos inovadores de medicina tradicional chinesa.

Danny Leong

“As autoridades devem estar conscientes dos recursos biológicos disponíveis na região. Macau possui mais de 50 espécies de insetos que podem ser utilizados para fins de medicina tradicional chinesa. Com acesso a estes recursos biológicos naturais, os departamentos de conservação ecológica e proteção ambiental devem organizar estudos à respetiva biologia, formar peritos científicos locais e desenvolver a própria indústria farmacêutica”, defende.

Acrescenta ainda que além das moscas soldado-negro, os pirilampos podem ainda ser usados para projetos de turismo ecológico. Todavia, diz, antes de desenvolver quaisquer planos relacionados, deve ser estudada a capacidade, benefícios económicos e viabilidade dos mesmos para a cidade, tal como executar uma série de medidas de recuperação artificial destes animais. “Quando o ecossistema é benéfico para a economia da região, a população irá protegê-lo de forma consciente e espontânea”, assegura.

Por fim, Danny Leong acredita que o segredo para proteger o ecossistema de Macau está na regulação governamental.

“Nenhuma montanha de prata ou ouro se compara a montanhas e rios de natureza, porém este desenvolvimento sustentável é ignorado pelo público. O Governo deve por isso definir regulamentações claras na criação de medidas de proteção ambiental”, conclui.

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