“Mais de mil” deslocados de Cabo Delgado rejeitados por Tanzânia

por Guilherme Rego

A Tanzânia repeliu “mais de mil” deslocados moçambicanos, sobreviventes do ataque de insurgentes contra Palma, no norte de Moçambique, denunciou terça-feira o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).

O ACNUR tinha estimado na segunda-feira em 600 o número de pessoas que fugiam de Moçambique e tentavam entrar na Tanzânia em busca de asilo mas não foram autorizadas a cruzar a fronteira.

Hoje a agência das Nações Unidas informa que as suas equipas em Pemba, capital provincial, “receberam relatórios preocupantes de populações deslocadas de que mais de 1.000 pessoas que fugiam de Moçambique e tentavam entrar na Tanzânia em busca de asilo” foram rejeitadas.

O ACNUR adianta que está a acompanhar a situação na Tanzânia e “apela aos vizinhos de Moçambique para fornecerem acesso ao território e procedimentos de asilo para aqueles que escapam da violência e procuram proteção”.

A 24 de março, grupos armados atacaram Palma, cidade portuária com 75.000 habitantes, matando dezenas de civis, polícias e militares.

O ataque, a apenas alguns quilómetros do mega-projeto de gás do grupo francês Total, na península de Afungi, foi reivindicado pelo grupo Estado Islâmico (EI).

O exército moçambicano anunciou entretanto ter retomado o controlo – pelo menos parcial – da cidade.

Cerca de 10.000 pessoas foram deslocadas pelo ataque, e perto de 23.000 pessoas encontram-se atualmente na zona de Afungi, sob proteção militar, de acordo com a Organização Internacional das Migrações (OIM).

As autoridades acreditam, no entanto, na presença de rebeldes infiltrados entre os deslocados.

Muitos habitantes encontraram refúgio no mato, sem acesso a comida ou água, fugindo para distritos mais a sul, agora sob controlo do exército, ou mais a norte, junto à fronteira tanzaniana.

No comunicado hoje divulgado, o ACNUR afirma que os civis têm chegado “a Pemba, Nangade, Mueda e Montepuez a pé, de estrada e de barco, na sequência do ataque”.

“Os voos humanitários que ajudaram a evacuar centenas de pessoas foram suspensos”, aguardando-se a reautorização por parte das autoridades.

Três anos de turbulência no norte do país deslocaram quase 700.000 pessoas dentro de Moçambique – a maioria durante o ano passado, mas o ACNUR estima que este número “pode ultrapassar a marca de um milhão até junho deste ano, se a violência contínua não parar”.

“O ACNUR está implementando medidas para receber mais deslocados internos nos próximos dias”, chegando a áreas fora de Pemba para ajudar os recém-deslocados, refere o comunicado.

“A maior parte dos recém-chegados são mulheres e crianças com poucos pertences, em sua maioria mostrando sinais de traumas graves após as atrocidades que testemunharam e preocupados com os parentes que ficaram para trás. A natureza repentina e mortal dos ataques deixou famílias dilaceradas, muitas ainda incapazes de sair da região. Entre os grupos vulneráveis que chegaram a Pemba estavam crianças desacompanhadas, famílias separadas e idosos”, adianta.

O ACNUR e os seus parceiros têm distribuído itens de alívio imediato, e algumas pessoas estão a ser acomodadas num centro de trânsito em Pemba, criado pelo governo, enquanto a maioria dos deslocados vive com parentes e amigos com escassos recursos.

A agência afirma ter “extrema” necessidade de recursos, com a resposta humanitária a ser dificultada pelo facto de ter recebido apenas 40% dos 19,2 milhões de dólares a que apelou para atender à emergência em Cabo Delgado.

“Estamos identificando os casos mais vulneráveis que precisam de assistência urgente e encaminhando-os aos serviços existentes, além de localizar e reunir familiares perdidos. Quase 80 por cento dos indivíduos separados são mulheres e crianças”, refere a agência da ONU para os refugiados.

O aumento da violência em Cabo Delgado teve um impacto severo nas instalações de saúde, água e abrigo e no acesso a alimentos na região. Essa angustiante crise humanitária é agravada por uma situação já frágil de subdesenvolvimento crónico, desastres climáticos consecutivos e surtos recorrentes de doenças, incluindo mais recentemente a pandemia de covid-19.

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