Recuperação rápida

por Filipa Rodrigues
Marta Moreira

Alexandre Schwartsman, ex-diretor de assuntos internacionais do Banco Central do Brasil, considerou que a economia do país, fortemente afetada pela pandemia de covid-19, tem conseguido uma recuperação rápida, apesar de ser desigual. Todavia, para o antigo quadro do BCB a retoma foi incompleta porque não foram recuperadas as perdas acumuladas no primeiro e segundo trimestres do ano. 

“Obviamente que o principal facto económico do 2020 foi a pandemia da covid-19, que teve um efeito muito forte, particularmente na primeira metade do ano, numa queda expressiva dos empregos, mas temos vivido uma recuperação até considerada rápida, muito por força da reação de política económica”, avaliou o economista.

Contudo, adiantou, “é preciso ressaltar dois pontos importantes: primeiro, a recuperação é incompleta. Até agora, o que a economia subiu, não compensou a queda na primeira metade do ano. Ainda que tenhamos tido um crescimento de 7,7 por cento (pc) no último trimestre, face aos três meses anteriores, não foram recuperadas as perdas acumuladas no 1.º e 2.º trimestres do ano. Ainda estamos 4pc abaixo de onde estávamos, no final de 2019”, indicou Schwartsman.

O segundo ponto apontado pelo especialista é a desigualdade na velocidade de recuperação.

“Vimos uma recuperação forte no lado do consumo de bens, mas a parte de serviços ficou muito para trás, uns 8pc abaixo de onde estava imediatamente antes da pandemia. Essa é uma questão importante, porque o setor de serviços representa mais de 60pc do produto interno bruto (PIB), é a maior fatia da produção da economia brasileira, e é também o maior responsável por emprego. Mais da metade do emprego no país está ligada a esse setor”, apontou.  

Na visão de Alexandre Schwartsman, que já foi também economista-chefe dos bancos ABN Amro e Santander, essa recuperação mais fraca do setor de serviços “implica também um mercado de trabalho muito frouxo”, com cerca de 10 milhões de postos de trabalho a menos em relação aos valores de fevereiro. “Não é uma coisa trivial. Tínhamos 94 milhões de postos de trabalho e hoje temos 84 milhões. É uma perda ainda muito considerável”, assinalou.

Alexandre Schwartsman, que dirige a consultora Schwartsman&Associados, comentou ainda outros “fracassos económicos” do Governo de Bolsonaro, como a questão das privatizações, uma das maiores promessas do ministro da Economia, Paulo Guedes. “Em relação às privatizações, nada aconteceu. O Governo é muito bom a falar e muito mau para entregar”, disse.

Paulo Guedes, um economista liberal, atribuiu os atrasos nas privatizações à falta de acordos políticos no Congresso, a quem cabe dar o aval para a venda dos ativos após uma decisão do Supremo Tribunal Federal, de 2019. No início do ano, o Executivo manifestou a intenção de acelerar a agenda de privatizações em 2020 com a venda de 300 ativos no valor de 36 mil milhões de dólares para reduzir ao mínimo o tamanho do Estado.

Negacionismo de Bolsonaro marcou 2020

O negacionismo do Presidente face à pandemia de covid-19, juntamente com a crise ambiental, motivada pelos recordes nos incêndios e na desflorestação da Amazónia e Pantanal, marcaram o ano. Registada oficialmente no Brasil no final de fevereiro, a pandemia de covid-19 teve no país sul-americano um dos principais focos mundiais, ao totalizar mais de 6,8 milhões de infetados e superando as 180 mil vidas perdidas.

Contudo, segundo especialistas, a evolução da pandemia no Brasil não pode ser desassociada dos posicionamentos públicos de Jair Bolsonaro, que, entre não usar máscara em público, promover aglomerações, protestar contra o isolamento social ou afirmar que não se irá vacinar, foi considerado um dos chefes de Estado mais céticos em todo o mundo em relação à gravidade da doença.

Alexandre Schwartsman classificou como “desastrosa” a gestão da situação. “Do ponto de vista de resposta sanitária, foi a pior possível. Tudo isso foi deixado a cargo dos executivos estaduais e municipais. Cada estado atuou de maneira independente, sem muita coordenação”, atirou.

“Tivemos ainda uma politização em torno da hidroxicloroquina e agora da vacina. Descobrimos que o Governo do Brasil não está preparado com uma estratégia de vacinação e, além disso, está a sabotar os esforços de governadores que tentam preparar-se, como é o caso de São Paulo”, lembrou. 

Visão semelhante tem o diplomata do Ministério das Relações Exteriores brasileiro Paulo Roberto de Almeida, que viu na gestão de Bolsonaro “um reflexo de outras atitudes e posturas do Governo, que explicam o relativo fracasso” na pandemia.  

“A atitude do executivo em relação à pandemia é semelhante à atitude face ao Ambiente e às Relações Internacionais. Bolsonaro é um genocida. Desde o início da pandemia que participou e incentivou manifestações, em que compareceu sem máscara, gerando aglomerações. Bolsonaro acaba por ser mais negacionista do que o próprio Donald Trump (Presidente cessante dos EUA), porque nunca se arrependeu, e agora mostra-se um negacionista vacinal, por razões de baixa política”, disse.

“O Brasil já deveria estar a preparar-se há muito tempo para a vacinação. O país foi um fracasso completo este ano, em relação à pandemia, do começo ao fim, em todas as etapas, e promete ser igual em 2021, na fase de vacinação”, previu Paulo Roberto de Almeida.

Pode também interessar

Contate-nos

Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

Plataforma Studio

Newsletter

Subscreva a Newsletter Plataforma para se manter a par de tudo!