Tudo é temporário

por Filipa Rodrigues
Scott ChiangScott Chiang

Li Bai, um dos poetas mais celebrados da época dourada da China, tem uma pequena obra que escreveu para uma festa. Nela salienta que o mundo é apenas uma estalagem para todas as criaturas que por lá passam. Termina com a conclusão de que, tendo em conta o quão curtas as nossas vidas são em comparação com a eternidade do universo, devemos aproveitá-las o melhor possível durante a nossa busca pela felicidade. “A vida é curta, bebamos!”, exclamou. 

1.300 anos depois é mais ou menos consensual que nada dura para sempre. Mesmo algo como o amor e o casamento, irrazoavelmente ligados à ideia de permanência, acabam por chegar ao fim se tiverem tempo para tal. Mas algo, por não ser perpétuo, não significa que deve ser tomado como “apenas temporário”. 

O Governo adotou o hábito de usar este adjetivo em quase todas as situações possíveis. Propostas, edifícios, planos, entre outros. Para Li Bai, o facto de o nosso tempo na Terra ser temporário dava-lhe um maior incentivo para “colher os botões de rosa enquanto pode”. Para os responsáveis locais, algo temporário parece ser apenas uma desculpa para algo com pouco esforço, para ignorar o contexto geral, para se afastarem do grande plano, para tomar atalhos ou apenas como uma forma de dizer “eu avisei” caso tudo acabe por falhar. 

Na cultura oriental, não se mede a história de um edifício pela idade das pedras ou vigas de madeira visíveis. O sentido de continuidade é o mais importante. Quando se diz que um templo existe há 800 anos, o que se está na verdade a dizer é que durante esse espaço de tempo uma série de construções em várias formas e para vários usos existiram para esse templo. Ou seja, cada um desses edifícios apenas viveu durante um curto espaço de tempo, mas juntos contribuíram para a longa historia da instituição em questão. Com este novo conhecimento, o temporário já não é razão válida para a falta de esforço, sinceridade e respeito para o assunto em questão. Em contrapartida, vários projetos da Região Administrativa Especial de Macau, sejam estes um cais ou um parque temático, partilham a mesma importância e peso na contribuição para o bem da comunidade. Por outro lado, embora cada uma das decisões dos responsáveis não dure para sempre, os sucessos e fracassos fazem parte de uma grande comunhão, a forma como se irá lembrar o regime atual. 

Agora enfrenta-se mais incerteza a longo prazo e recursos públicos ainda mais limitados. As despesas do estado devem ser feitas com a consciência de que os bons tempos já lá vão, e de que no futuro não se terá sempre o mesmo luxo da tentativa e erro. Se vale a pena fazer algo (ou se infelizmente tem de ser feito), então deve ser bem feito – e logo à primeira.

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