A corrida selvagem das multinacionais ao novo “ouro” africano: o óleo de palma

por Rute Coelho

O continente africano tornou-se um novo e valioso cenário para as multinacionais que desenvolvem grandes monoculturas, muitas vezes sem respeitar a biodiversidade ou os direitos humanos

Sabonetes aromáticos de sândalo e jasmim. Pão fatiado, biscoitos, macarrão chinês pré-cozido ou manteiga de cacau. Batom e perfumes. Até, paradoxalmente, o biodiesel que promete reverter as mudanças climáticas. O artigo do jornal El País lembra que o nosso dia a dia está repleto de produtos com alto teor de óleo de palma, o mais consumido no mundo, à frente do girassol ou da colza, segundo a European Palm Oil Alliance.

Versátil e barato, duas das principais razões do seu sucesso, este óleo é cor de laranja e provém da palma Elaeis guineensis, nativa da África Ocidental e exportada por europeus para a América Latina e Sudeste Asiático durante o século XIX. Embora 80% da produção atual venha da Indonésia e Malásia, nos últimos anos África tornou-se o novo alvo das multinacionais no cinturão tropical do continente formado pela Tanzânia, República Democrática do Congo, Angola , República do Congo, Camarões, Nigéria, Gana, Costa do Marfim, Libéria, Serra Leoa e Guiné, refere o El País.

Consumido pelos países africanos desde tempos imemoriais, o óleo de palma faz parte da dieta e da cultura de muitos povos nativos e foram estes que viram as suas colheitas arruinadas nos últimos tempos pela expansão ilimitada dos gigantes ocidentais. Tudo sem esquecer a pegada de carbono do desmatamento causado pela produção massiva e intensiva do novo “ouro laranja”.

“O impacto do grupo que diriges nas nossas vidas é imenso”, escreveu o agricultor e ativista Emmanuel Elong em 2013 numa carta enviada a Vincent Bolloré, CEO da multinacional francesa Bolloré, acionista da belga Socfin. A presença desta empresa nos Camarões resultou num arrendamento em 2016 de até 78.400 hectares de dendezeiros, entre outros, na zona de Mbonjo, localidade onde vivia Elong, tornando-se assim o epicentro da produção de óleo de palma. “Nunca tivemos contacto com representantes da Socfin, então entramos em contacto consigo para que nos ajude a resolver isto”, continuou a carta, recolhida pela plataforma de notícias ambientalistas e conservacionistas Mongabay.

Emmanuel representa os mais afetados pela expansão do óleo de palma em África: os pequenos agricultores cujas famílias passam fome nos terrenos tropicais ou os empregados que trabalham nas plantações em condições desumanas.

Segundo o artigo do El País, a presença das grandes multinacionais e o seu controlo sobre a terra não só separa os pequenos agricultores da corrida do cultivo (e, portanto, deixando-os sem fonte de renda), mas também condena aqueles que fazem parte dessa expansão: da ausência das condições de trabalho aos maus tratos, falta de acesso a água potável ou casas degradadas a caírem aos bocados.

“Na Costa do Marfim ou nos Camarões, sede de multinacionais como Socfin Group ou Socapalm, os trabalhadores dificilmente têm contratos ou garantias sociais”, afirmou ao jornal espanhol Ange-David Baïmey, especialista em sociologia ambiental da ONG GRAIN, dos Camarões. “Além disso, as mulheres que vivem ao redor das plantações estão sujeitas a inúmeros abusos e o acesso à água potável é praticamente inexistente por essas comunidades”.

A Socfin, que adquiriu a empresa Socapalm em 2000, respondeu a várias acusações dos media através de um comunicado de imprensa no qual afirma “promover uma agricultura tropical responsável”.

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