Julho da Mulher Africana

por Fernanda Mira
Joacine Katar MoreiraJoacine Katar Moreira

Celebramos hoje, a 31 de julho, o Dia da Mulher Africana, consagrado pela Conferência das Mulheres Africanas em Dar Es Salaam em 1962, ainda antes da libertação das colónias africanas sob domínio português, mas já no fervilhar das suas reivindicações pela autodeterminação dos povos, constituição dos partidos independentistas PAIGC, MPLA e FRELIMO e um ano depois da eclosão da Luta Armada de Libertação Nacional de Angola em 1961.

O papel das mulheres africanas e o seu contributo para as Lutas de Libertação Nacional continuam escassamente estudados, assim como também a sua pujança na construção das sociedades independentes antes e depois da abertura democrática. E começo por falar das Lutas de Libertação porque o seu espírito precisa de ser recuperado para fazermos face aos desafios do século XXI: avanço progressivo de forças fascistas de ideologia colonial, que são também forças misóginas, sexistas e que atacam as conquistas pela igualdade de género; ataque à laicização do Estado, que afeta a própria democracia, refém de visões religiosas que muitas das vezes afastam os cidadãos da política e relativizam importantes conquistas sociais; alterações climáticas e pandemias que afetam sobretudo mulheres e a sua força produtiva no continente africano e não só, sendo as mulheres a camada populacional mais vulnerável a doenças – se pensarmos na pandemia SARS-CoV-2, que pode originar a COVID-19, vemos que tendem a ser as mulheres as mais infetadas e exatamente porque são as mais afetadas pelas desigualdades estruturais das nossas sociedades.

As mulheres africanas emigrantes e os seus descendentes são confrontados quotidianamente com o racismo estrutural e histórico das sociedades brancas em que se encontram, a maioria erigida sobre a empresa colonial e as suas hierarquias e supremacias instituídas que permanecem no imaginário europeu como certas. Continuam a ser base da pirâmide das sociedades de acolhimento, confrontadas com empregos de muita precariedade, baixos salários e dificuldades em conciliar a vida familiar com a laboral. As difíceis condições socioeconómicas das mulheres africanas emigrantes têm funcionado como cortina para a sua invisibilização e também silenciamento ao longo do tempo.

Contudo, vivemos ao mesmo tempo uma época de grande esperança, com o aumento da presença de mulheres em cargos de visibilidade pública e reconhecimento político e social no continente africano, criando referências para a nova geração de meninas e jovens; tem sido reforçado o ativismo juvenil, o ativismo anti-racista da juventude negra nos países de emigração dos seus pais, lutando por si e pelo alargamento e reconhecimento dos direitos destes; o incremento da participação de mulheres negras na política partidária, muitas eleitas tem tido como reflexo uma maior conscientização sobre a importância da participação política dos africanos e dos afrodescendentes nos países em que se encontram.

Tenho afirmado muitas vezes que as condições e circunstâncias das mulheres negras são a medida da saúde democrática das suas sociedades porque as sociedades precisam e dependem da participação política e institucional das mulheres negras para um reposicionamento dos valores democráticos da igualdade, da liberdade e da solidariedade. E precisamos, todas e todos, de resgatar o espírito de justiça que norteou as Lutas de Libertação e uniu diferentes culturas em busca da Liberdade.

*Deputada à Assembleia da República Portuguesa

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