ONU ao Plataforma: “Força internacional em Cabo Delgado não é solução para o conflito”

por Fernanda Mira
Arsénio Reis

A violência em Cabo Delgado não se resolve com o envio de uma força internacional para o terreno. A posição é assumida pelo enviado do secretário-geral das Nações Unidas para Moçambique, em entrevista ao PLATAFORMA.

Mirko Manzoni considera essencial reforçar o Estado moçambicano e para isso pede “um apoio honesto da comunidade internacional”, sublinhando que o mais importante é criar laços de confiança. A “confiança deve ser construída entre a população e o estado e não entre a população e uma força internacional”.

Na defesa da sua posição, o diplomata suíço diz que “a segurança de Moçambique tem de ser sustentada, de longo prazo”, ou os problemas nunca serão resolvidos. Mirko Manzoni pergunta o que acontecerá se daqui a algum tempo ocorrer um problema deste tipo noutra região como Tete, ou Ressano Garcia. A solução, diz, não poderá passar “por enviar nova força da comunidade internacional para Tete”, antes por criar condições para que as autoridades moçambicanas possam resolver os seus problemas, com as “forças do país”.

Na opinião deste embaixador – com mais de 20 anos de experiência nos campos diplomático e humanitário – a origem do conflito em Cabo Delgado não é religiosa e que isso é apenas uma forma de manipular a informação sobre o que está a acontecer.

Nesta entrevista ao PLATAFORMA, Mirko Manzoni lembra que Cabo Delgado é uma zona que faz fronteira com a Tanzânia, onde a presença das autoridades de Moçambique é débil e por isso cresceram grupos criminosos, que se dedicam a “tráficos ilícitos”. Isso permite-lhes distribuir dinheiro por algumas franjas da população, gente que foi praticamente abandonada pelo estado, ganhando assim algumas cumplicidades no terreno.

E se o problema não é religioso também não tem a ver com a descoberta de reservas de gás – com importância mundial – naquela região. O representante de António Guterres acha que ele se prende muito mais com o as tentativas que esses grupos criminosos estão a fazer para protegerem os seus próprios negócios.

A descoberta do gás levou ao regresso do Estado e isso levou ao conflito que se vive.

Os grupos criminosos que levam a cabo os atos de violência, que já provocaram centenas de vítimas mortais e milhares de refugiados (várias fontes falam em cerca de 250 mil), no norte de Moçambique, não estão interessados em dialogar porque julgam dominar aquele território.

Mirko Manzoni considera ser necessário reequilibrar a relação de forças que existe no terreno para abrir o caminho ao diálogo. Assumindo não ser adepto da violência, assume que é indispensável “um reforço da segurança antes de dialogar”.

Esta é uma situação que preocupa – e muito – o homem que indicou Mirko Manzoni para acompanhar a situação em Moçambique. António Guterres, até por ser português, está preocupado com a situação que se vive naquele país.

O diplomata suíço garante que o compromisso do secretário-geral das Nações Unidas com Moçambique é muito grande e que ele está empenhado em ajudar a resolver a situação que se vive naquele país.

Isso significa ajudar a resolver os problemas em Cabo Delgado, mas também a situação de instabilidade que se vive no centro de Moçambique, onde a autoproclamada junta militar da Renamo, liderada pelo General Mariano Nhongo, tem levado a cabo ataques que já provocaram mais de 40 vítimas, mortais entre elas uma criança de 6 anos.

O processo de paz, que assenta na desmilitarização, desarmamento e reintegração de mais de cinco mil combatentes da Renamo, tem vindo a ser adiado por esta situação de instabilidade.

Mariano Nhongo, o general dissidente da Renamo, segundo Mirko Manzoni, não questiona a importância deste processo de paz, mas não o aceita por contestar a liderança de Ossufo Momade, o atual presidente da Renamo.

O enviado especial de António Guterres para Moçambique diz que este é um problema político da Renamo, que aquele partido deve resolver internamente para que não prejudique o processo de regresso à vida civil dos 5000 combatentes que ainda não foram completamente desmobilizados na região centro do país.

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