Sem covid-19 mas com crise económica

por Filipa Rodrigues
António Sampaio

A resposta rápida das autoridades, com o fecho de fronteiras e a quarentena obrigatória a quem chegava, a resposta pronta da população timorense – dezenas de milhares de pessoas saíram de Díli – e alguma sorte permitiram a Timor-Leste, pelo menos para já, estar livre de casos da covid-19.

O país registou o primeiro caso de covid-19 em 21 de março – um cidadão estrangeiro que tinha viajado do exterior –, iniciando uma semana depois o primeiro de três períodos de 30 dias de estado de emergência. O segundo caso surgiu em 10 de abril, um timorense que entrou pela fronteira terrestre com a Indonésia, seguido de mais dois casos dias depois, e a 26 de abril já havia 18 casos.

O número máximo de pacientes infetados, 24, ocorreu a 24 de abril, tendo todos os pacientes recuperado e o país ficado sem casos ativos a 15 de maio, quando já decorria o segundo mês de estado de emergência. Sem casos ativos, o Governo optou por alargar o estado de emergência por mais 30 dias, período que terminou na semana passada. 

Contudo, o país vai manter várias medidas que estavam em vigor, com destaque para o controlo fronteiriço. A situação é facilitada pelas restrições que continuam em vigor nos países vizinhos e para onde há ligações aéreas: Austrália, Indonésia e Singapura.

Se no campo da saúde as coisas têm corrido bem – apesar de as autoridades admitirem que perante um surto grande, o sistema de saúde continua sem condições – o mesmo não acontece na economia.

Depois de meses com muitos negócios fechados, praticamente sem investimento público e falta de liquidez nas empresas, a economia está a sofrer desse impacto. Avaliar com exatidão a situação económica, onde predomina o setor informal e escasseiam dados atualizados, tanto a nível micro como macroeconómico, não é fácil.

Ainda assim os dados do Ministério das Finanças mostram que, mesmo antes da pandemia, a economia já estava a ressentir-se das incertezas políticas de 2017 e 2018, com um recuo significativo no Produto Interno Bruto (PIB) e reduções, por exemplo, a nível de investimento privado, um indicador de confiança na economia.

Depois de um primeiro período em que registou uma redução drástica na mobilidade, com lojas fechadas, empresas paradas e cidadãos em casa ou de regresso aos municípios de origem, a normalidade de movimentos tem vindo a ser retomada.

Díli vê o regresso do trânsito e a reabertura da quase totalidade das empresas.

Pedro Martins, economista do Banco Mundial, referiu que a economia timorense vai demorar a recuperar após a covid-19, com incertezas sobre o comportamento do setor privado, mas a situação cria oportunidades para reverter tendências de desaceleração dos últimos anos.

Aproveitar essa oportunidade, sustentou, implica investir mais no setor produtivo: agricultura, manufatura e turismo e em capital humano, ajudando a “converter a despesa pública num movimento mais endógeno do setor privado para sustentar o crescimento”.

Para o economista, importa trabalhar para “reverter a tendência que se verifica há vários anos”, com uma desaceleração do crescimento económico acentuada desde 2008, agravada nos últimos anos pela incerteza política.

“Investir no tecido produtivo é crucial. Temos vindo a notar, por exemplo, que muitos dos empréstimos têm ido para indivíduos, mas pouco para os setores produtivos. As percentagens de crédito para a agricultura, manufatura e turismo são muito baixas”, apontou.

“Mesmo quando a razão de choque desaparece, alguns dos impactos persistem. As empresas fecharam ou despediram trabalhadores e depois a retoma da atividade e o recrutamento é lento”, assinalou Pedro Martins. 

Depois de uma crise, as empresas podem demorar a retomar relações de confiança com fornecedores e com a banca, sendo que o país é afetado, também, pelo impacto nas cadeias internacionais de fornecimento.

“Quando a pandemia se alastrou pelo mundo e as medidas foram tomadas, a economia timorense não estava nas melhores condições para responder, especialmente devido ao retorno da instabilidade política, à aplicação do regime duodecimal [do Orçamento de Estado] e à recuperação ainda débil de 2019”, sublinhou.

Outra questão a considerar no atual cenário tem a ver com as fragilidades da economia privada timorense, dependente em grande parte do setor informal e não produtivo e, no caso das empresas, nos setores de construção e de serviços.

Mesmo antes da pandemia muitas empresas viviam já com dificuldades de liquidez, com atrasos nos pagamentos do setor público, por exemplo, ou uma redução significativa de projetos, no setor da construção, especialmente.

Dada a natureza da economia nacional, com grande parte dos bens de consumo a serem importados, a fraqueza financeira das empresas – que têm que pagar os bens que consomem o revendem muitos antes de os rentabilizarem – condiciona o necessário fluxo de caixa.

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