Vendas online, nova tendência e ilusão

por Filipa Rodrigues
Wendi Song

Não se pode negar que a indústria de vendas online – transmissão em direto para exposição e venda de produtos (live streaming e-commerce, na versão ingles) – é agora a maior tendência na China. 

Segundo dados fornecidos pelo Centro de Informações da Rede de Internet da China (CNNIC), em março de 2020 o número de utilizadores de lojas online no país ultrapassou os 710 milhões, representando 78,6 por cento do número total de utilizadores de internet. Entre estes, o número de participantes em emissões de vendas em direto atingiu os 256 milhões, representando 37,2 por cento dos utilizadores do comércio online. 

 Seguindo a tendência, cidades como Guangzhou, Hangzhou, Chengdu, Chongqing e Jinan começaram, lentamente, a tentar aproveitar esta nova oportunidade e tendência de comércio. Por exemplo, Qingdao, na província de Shandong, declara querer transformar-se numa das principais cidades do mercado de televendas online na China até 2022. Também a cidade de Guangzhou começou a promover o slogan “capital da China de televendas online”. 

Várias cidades têm ainda apresentado medidas políticas para acelerar a formação de talentos (vendedores/promotores) nesta indústria. O governo do concelho de Yunhang, em Hangzhou, onde está sediado o grupo Alibaba, emitiu já uma série de medidas a destacar que os líderes desta indústria podem ser reconhecidos como “talentos nacionais” e por isso usufruem de uma série de políticas preferenciais. 

Plataformas de emissões em direto desta região vão ser premiadas com 2 milhões de RMB caso as vendas ultrapassem um determinado valor. O concelho de Huadu, em Guangzhou, também se disponibilizou para oferecer aos apresentadores que se destaquem nesta indústria uma casa no valor de até 500 mil RMB. 

Estas medidas irão com certeza continuar a impulsionar a popularidade das vendas online. Porém, questiona-se a relação entre o crescente volume de vendas nestas emissões e o número real de produtos comercializados, sendo do conhecimento geral que existe manipulação de números de encomendas e visualizadores. 

Desde que esta indústria emergiu que as manipulações são comuns. Novas lojas alteram o número de vendas para conseguirem alguma exposição, para entrarem nas listas de ranking durante dias de grandes promoções, tentando assim que as respetivas emissões aparentem mais prestígio. Como resultado, os volumes de transações estão em constante crescimento, sendo por isso recorrente que, numa única sessão, afirmem que conseguiram mais do que 100 milhões de vendas. 

Zhao Yuanyuan, antigo presidente da plataforma de emissões do Taobao, já veio, publicamente, através das redes sociais, mencionar a ilusão criada pela indústria: “Se uma emissão não consegue atingir 100 milhões de vendas a loja tem vergonha de lançar um press realease sobre o tema, certo? (…) Assim, altera-se o valor de venda de carros, oferecem-se descontos de 50 por cento nos produtos, as páginas contabilizam os números de visualizadores, e todas as lojas gabam dos valores atingidos. Mas a verdade é que muitas destas emissões veem, posteriormente 50 por cento ou mais das encomendas canceladas ou devolvidas”.

Os números de cancelamentos e devoluções em vendas online sempre foram altos, sendo 30 por cento o número padrão na indústria. Por vezes devido a problemas de qualidade, outras devido a compras por impulso. Quando uma emissão acaba, o total de transações divulgado pela plataforma é muitas vezes muito diferente do número de vendas real. 

No início de junho, vários órgãos de comunicação do continente noticiaram que algumas empresas de comércio online tinham recebido “avisos” das autoridades tributárias devido por as receitas de vendas não corresponderem às vendas anunciadas pelas plataformas comerciais, existindo o risco de ter havido uma contagem de receitas inferior à realidade. O “aviso” exige também que estas empresas corrijam e verifiquem os respetivos números. 

Embora as autoridades tributárias do continente ainda não tenham tomado ações concretas devido à atual situação pandémica, a notícia já causou um extenso debate online. Segundo um relatório da “RAN Media”, media financeiro online, existem duas razões para as grandes diferenças de receitas publicadas pelos comerciantes e pelas plataformas comerciais. A primeira, porque os comerciantes apenas declararem as receitas faturadas, omitindo as informações acerca das receitas não faturadas. Outra razão é a “manipulação” dos números. 

“A curto prazo, a normalização do volume comercial irá reduzir a atividade comercial destas plataformas, podendo também levar a um crescimento nos preços dos produtos. No entanto, a longo prazo, a tributação representa a avaliação real destes valores, e um sinal de que a indústria está a adotar uma operação mais regular e normativa”, indica o documento. 

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