O Capitalismo que não houve e o Anticapitalista que não há

por Pedro Tadeu
João Cotrim de Figueiredo

Em tempos recentes, vários países ocidentais têm assistido à mutação do cenário político tradicional. Movimentos nos extremos do espetro, tanto à esquerda como à direita, ganham aderentes e influência. Ansiedade económica, desigualdade de oportunidades, deficientes serviços públicos e episódios de corrupção resultaram na perda de confiança no status quo. E a incapacidade de vários governos durante a última década de lidarem com estes assuntos de forma satisfatória levou a que a culpa seja atribuída ao mercado e ao comércio livre. Apesar das suas diferenças, os extremos à esquerda e à direita acabam por ter um inimigo em comum: o Liberalismo.

Esses extremistas acreditam que o problema das sociedades ocidentais radica na liberdade – nomeadamente na liberdade económica. Aos olhos deles, os liberais são apoiantes acéfalos das economias ‘selvagens’, nas quais as elites prosperam à custa dos mais pobres.

Na sequência da crise económica em 2008, vários governos, autoproclamados defensores da economia de mercado, aplicaram medidas de austeridade – nomeadamente cortes na despesa e aumentos de impostos – enquanto injetavam dinheiro público em bancos privados ou se viam envolvidos em casos de corrupção. Ao mesmo tempo, eram incapazes de diminuir as desigualdades existentes na sociedade. Isto contribuiu para a ideia de que o ‘capitalismo’ favorece as elites e esquece os mais desfavorecidos, que pretende acabar com o estado social e construir uma economia apenas para os mais ricos.

Aquilo a que muitos chamam o ‘livre mercado capitalista’ é, na verdade, um modelo de capitalismo de compadrio – algo que nenhum liberal defende.

Esta argumentação não faz qualquer sentido, mas tornou-se comum nas críticas ao sistema capitalista e da economia de mercado. Contudo, para entender os motivos pelos quais isto não faz sentido, é primeiro deixar bem claro que há uma enorme diferença entre o capitalismo de mercado livre e o capitalismo de compadrio. Sobretudo, é necessário entender a diferença entre um mercado livre e as sociedades ditas ‘capitalistas’ que temos observado em anos recentes.

‘Compadrio’ é um conceito que não é, infelizmente, estranho a quem esteja familiarizado com a cultura política portuguesa. Como o nome sugere, num sistema de capitalismo de compadrio, existe um conluio sistémico entre a classe política e a classe empresarial ou outras forças sociais e económicas. Isto traduz-se muitas vezes em trocas de favores, impunidade das transgressões, ‘amizades’ com grandes interesses, e favorecimentos em círculo fechado. Traduz-se, também, numa sociedade onde os conhecimentos pessoais têm mais valor do que o mérito de cada um.

Este tipo de sociedade é o oposto daquele que o Liberalismo defende e que o mercado livre produz. Num mercado livre – ou seja, numa sociedade onde as pessoas podem empreender, trabalhar e colaborar em conjunto sem excessiva intervenção do Estado seja pela via fiscal, seja pela via da regulamentação de preços ou dos mercados – a possibilidade de influência política é automaticamente reduzida. A existência de um setor privado independente é a maior garantia contra a impunidade das elites empresariais ou políticas.

Adicionalmente, é essencial sublinhar que na base de uma sociedade liberal e de qualquer mercado livre e justo está a igualdade de oportunidades, um desafio que poucas sociedades se podem gabar de ter vencido. Para os liberais, qualquer modelo que gere uma classe desfavorecida a depender do Estado e outra com recursos suficientes para não depender, não é um modelo aceitável. Isto não é igualdade, nem é justiça – e não existe liberdade na injustiça.

Por isso, aquilo a que muitos chamam o ‘livre mercado capitalista’ é, na verdade, um modelo de capitalismo de compadrio – algo que nenhum liberal defende. Os liberais defendem uma sociedade onde os cidadãos sejam independentes, tenham liberdade de escolha, poder de ter as suas iniciativas, e onde exista uma justiça que funcione de forma transparente, acabando com a impunidade dos poderosos.

A verdade é que a maior parte das pessoas que criticam o Liberalismo dão sucessivos tiros ao lado. Uns porque temem as ideias liberais e lhes dá jeito deturpá-las; outros porque são ignorantes quanto ao que os liberais defendem. Para estes, e para os leitores que tenham genuíno interesse em saber mais, aqui fica o essencial.

O Liberalismo defende uma sociedade de pessoas livres e independentes, responsáveis pelo uso que dão à sua liberdade, seja ela individual, económica, política ou social. Pessoas livres para trabalhar, produzir e criar, e com liberdade para gozar os frutos desse trabalho. Pessoas livres para aceder aos serviços públicos que escolherem, seja a escola dos seus filhos ou o prestador de serviços de saúde.

Em Portugal, um país com uma longa tradição de compadrio e onde o Estado acumula facilmente poder, as ideias liberais vão contra os interesses do sistema. Um sistema que quer manter a sociedade estagnada, o compadrio intocado e o poder longe das pessoas. Se neste cenário ainda há quem queira aumentar a dimensão e o poder do Estado, então há, de facto, quem queira continuar a oprimir as pessoas. Não são é os liberais.

  • Presidente e deputado da Iniciativa Liberal

Pode também interessar

Contate-nos

Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

Plataforma Studio

Newsletter

Subscreva a Newsletter Plataforma para se manter a par de tudo!