O racismo ignorado na América Latina levanta a voz

por Rute Coelho
Rute Coelho

Episódios recentes no Brasil e na Colômbia refletem uma brutalidade policial “normalizada” contra os negros, reflete o artigo do El País

Um jovem negro de 21 anos, Ánderson Arboleda, morreu no dia 21 de maio na região de Cauca, Colômbia, dias depois de receber um forte golpe na cabeça por parte da polícia, que o tinha detido pelo motivo simples de não estar a cumprir a quarentena imposta por causa da Covid-19. Rapidamente, o caso tornou-se viral nas redes sociais com o slogan “Justiça para Ánderson Arboleda. Porque é que na Colômbia não a vês?”

O slogan fazia referência ao contraste entre a ausência de reação nas ruas colombianas a este caso de brutalidade policial e a grande reação em cadeia que aconteceu nos Estados Unidos após a morte do negro George Floyd, vitima de abuso policial.

“Não é que de repente tenham começado a matar negros. Aqui na América Latina passa-se o mesmo que nos Estados Unidos mas a diferença é que nem sequer podemos relacionar estes casos com racismo”, comentou, em declarações ao El País, Sher Herrera, uma estudante de Comunicação Social de 27 anos que está a terminar o mestrado em estudos afrocolombianos.

A maior onda de protestos contra o racismo em décadas nos EUA está a abrir o debate sobre o tema e a brutalidade policial não só na Colômbia mas por toda a América Latina, onde 133 milhões de pessoas se identificam como afrodescendentes.

Manifestantes carregam placas com foto de George Floyd em protesto em Hollywood, na Califórnia – Agustin Paullier – 7.jun.2020/AFP

Numa região onde a maioria da população se define como “mestiça”, a situação é mais complexa já que a discriminação não é só pela cor da pele mas também pela origem étnica ou classe social, aponta Olivia Gall, do Centro de Investigações Interdisciplinares em Ciências e Humanidades da Universidade Nacional Autónoma do México.

“Na América Latina não temos só a discriminação contra os afrodescendentes mas também contra os povos indígenas ou em relação aos mestiços. É uma construção mais complexa e náo só de dois povos como nos Estados Unidos”, observa Olivia Gall.

https://www.plataformamedia.com/2020/06/homicida-de-george-floyd-com-fianca-de-um-milhao-de-dolares/

No Brasil, a população branca está a despertar com a onda de protestos nos EUA. Até agora, os brancos brasileiros tinha fechado os olhos à brutalidade policial e estavam habituados a “normalizar”a morte de jovens, quase sempre negros, em operações policiais nas favelas (6200 mortos em 2019) ou a falta de representação dos negros em cargos relevantes no país. No domingo passado, um grupo de ativistas manifestou-se no Rio de Janeiro contra a violência policial e recordou João Pedro Pinto, um adolescente negro de 14 anos que morreu vítima de uma bala perdida da polícia quando se encontrava em sua casa numa favela.

“A luta do movimento negro no Brasil vem de há séculos. Se não nos tivéssemos organizado não teríamos sobrevivido nesse país que, desde a escravatura, levou a cabo um projeto sistemático para eliminar a população negra”, afirma Mónica Oliveira, 32 anos, dirigente da Rede de Mulheres Negras de Pernambuco.

Os negros e mestiços são 54% da população brasileira mas representam 75% das vítimas de assassinato e 64% dos desempregados. O artigo do El País sublinha ainda que a a ascensão à Presidência do Brasil de um político da extrema-direita, como Bolsonaro, veio marginalizar ainda mais a população negra.

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