Não é por esconder os números que as vítimas vão desaparecer

por Guilherme Rego
Ricardo Oliveira Duarte

Abel Augusto Teixeira (1955 – 2020)

Não gostava que se preocupassem com ele. Sempre dizia que estava tudo bem. Pai de quatro filhos, era de uma simplicidade encantadora. Amigo, admirado por todos por seu caráter e bondade.
Um ser humano fora da curva, excepcional.Abel nasceu no Rio de Janeiro (RJ) e faleceu no Rio de Janeiro(RJ), aos 65 anos, vítima do novo coronavírus.

História revisada por Alessandra Capella Dias, a partir do testemunho enviado por filha Patricia Mattos Teixeira, em 20 de maio de 2020.

A história de Abel é a primeira do Inumeráveis (https://inumeraveis.com.br/). A primeira de muitos milhares, uma lista que não pára de crescer. O site, criado no dia 30 de Abril por um grupo de artistas e jornalistas, todos voluntários e a trabalharem de forma colaborativa, é um “memorial dedicado à história de cada uma das vítimas do coronavírus no Brasil”.

O projeto foi a base para a histórica primeira página do jornal o Globo no dia 10 de Maio, um dia a seguir ao número de vítimas no Brasil ter ultrapassado os 10 mil, uma capa cheia de nomes de vítimas e um resumo da sua história, e todos os domingos, no Fantástico, o jornal das 20h da Globo, em blocos de cinco, várias das histórias que estão no site têm sido contadas por atores da Globo. Edson Pavoni, o artista paulista que idealizou e começou o Inumeráveis, disse ao Diário do Nordeste que “está sendo muito importante perceber que as histórias penetram no coração, num lugar onde os números não conseguem alcançar e isso tem sido muito potente.”

A tal capa do O Globo é do fim de semana do tão falado churrasco que Jair Bolsonaro anunciou, mas que depois classificou de “fake”, e do passeio de jet ski em que o Presidente, falando com apoiantes que estavam numa lancha, referiu que a pandemia “é uma neurose”.

Nesse 09 de Maio o Brasil tinha batido mais um recorde de mortes num só dia e ultrapassado a barreira das 10 mil vítimas. Quando o número ultrapassou as cinco mil mortes Bolsonaro reagiu com o “E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre”. No dia 20 de Abril, ao ser suplantada a marca de 2.500 vítimas, o Presidente afirmou: “Não sou coveiro, tá?” Convém não esquecer que durante a pandemia dois ministros da Saúde abandonaram a pasta e há 24 dias (ao dia 08 de Junho) que Eduardo Pazuello, um militar que nomeou outros 18 militares para o ministério, está interino no cargo.  

Morreram, no Brasil, mais de 35 mil pessoas por causa do novo coronavírus. É difícil arriscar um número ao certo, sobretudo depois da última sexta-feria (05 de Junho) quando o ministério da Saúde decidiu alterar a forma de divulgar os números da pandemia. O novo método passa por enumerar apenas os novos casos e mortes nas últimas 24 horas, retirando da página oficial a contabilização dos números totais. Para além disso os dados passaram, a partir desse dia 05 de Junho, a serem revelados mais tarde, às 22h, quando antes eram divulgados por volta das 19h. “Acabou matéria no Jornal Nacional”, comentou o Presidente nessa mesma sexta-feira. O Jornal Nacional da Globo começa às 20:30, terminou nesse dia antes de os números serem revelados e quando o ministério da Saúde o fez no ar estava a novela Fina Estampa. Com o mesmo pivô do Jornal Nacional, William Bonner, a Globo abriu um especial (Plantão) “última hora” e divulgou os números do dia, somando-os ao total do dia anterior. Números do Ibope, que mede as audiências televisivas, revelam que o Jornal Nacional teve 27 pontos de audiência e a novela Fina Estampa 31.

Parece muito claro que a luz brilhante cheia de Humanidade que é o Inumeráveis iluminará sempre, e para sempre, a escuridão que decorre da nebulosidade que o Presidente do Brasil e os seus subalternos pretendem implementar.

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