Causas e contradições

por Guilherme Rego
Paulo Rego*
Paulo Rego

Ser conservador não indica sector político. É estado de espírito; luta da alma tradicional contra o demónio futuro. Daí a expressão “geração rasca”, dita “sem valores”. A revolta global contra a morte de George Floyd, afro-americano asfixiado pela brutalidade de um polícia branco, faz a prova do contrário: os valores, por vezes, são do futuro: porque são fortes, na teoria; frágeis, na prática. Donald Trump resiste a tudo: crise económica, Covid-19, interesse privado, estupidez natural… mas treme na rua, nos Média e nas redes sociais. Gerações unidas exigem o direito à vida – e à igualdade. O passado criou; o presente não cumpre; o futuro reage.

A política, como a economia, tendo os méritos que têm, usam, abusam, e manipulam narrativas; fazem o que dá jeito; dizem supostos valores. A China impõe a lei e a ordem contra o caos em Hong Kong – com razão. Mas, de facto, não quer a Região Autónoma livre do poder central; nem a população focada no dogma da liberdade. Os Estados Unidos ditam a guerra comercial, usam Hong Kong para tirar face a Pequim – é óbvio. Mas, em rigor, os direitos humanos e a cruzada democrática escondem o pânico perante o desafio oriental à hegemonia messiânica anglo-saxónica. E quando a revolta bate à porta, já a estátua da liberdade grita o músculo policial e empunha a legalidade. É o descrédito – o povo não é cego.

A política, como a economia, tendo os méritos que têm, usam, abusam, e manipulam narrativas; fazem o que dá jeito; dizem supostos valores

Disse-o Guilherme Rego, aqui no Plataforma: quando a reação à injustiça é a violência, faz parte do problema. Tem razão – e menos 30 anos de convicções que eu. Esta geração não é “rasca”. Acusada de não ler, de ser desligada… tem informação, foco global, causas… e a fome de intervenção que a tecnologia alimenta. Contudo, arrasta o peso da velha contradição: violência gera violência; perde-se valor – e legitimidade.

Sou heraclitiano: “A guerra é o pai de todas as coisas” – no sentido retórico, pelo debate. No contexto atual prefiro a mente de Gandhi. O futuro grita por paz; falta ao presente diplomacia e capacidade negocial. Se o passado entender esses valores – talvez queira migrar connosco.

*Diretor-geral do Plataforma

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