Na área da saúde, os problemas já se fizeram sentir há uns meses quando se verificaram dezenas de casos de sarampo na região norte do país, devido à falta de vacinas dos refugiados, que colocou em causa a imunidade de grupo da população.
O impacto da doença entre os refugiados poderá ter reflexo noutras franjas da população brasileira, como as tribos indígenas. A falta de proteção sanitária e a grande mobilidade das populações preocupam os analistas em saúde pública. Em Boa Vista, capital do estado brasileiro de Roraima e principal porta de entrada de refugiados no Brasil, venezuelanos e brasileiros trabalham hoje na construção de um hospital temporário para o acompanhamento e tratamento da Covid-19.
A unidade hospitalar, denominada “Área de Proteção e Cuidados” (APC), terá 1.200 camas e mais mil vagas para observação de casos suspeitos, estando a ser construída pela Operação Acolhida, uma resposta do Governo do Brasil ao fluxo de migrantes e refugiados venezuelanos, e que conta com o apoio do ACNUR e de outras agências das Nações Unidas.
“Além de prestar assessoria técnica na fase de construção do hospital, o ACNUR doou 250 unidades residenciais (as mesmas já usadas nos abrigos de Boa Vista e Manaus) para acomodar pacientes, além de 2.500 camas, colchões, alimentos e materiais de limpeza e higiene pessoal. Um novo abrigo temporário foi criado em Boa Vista para acomodar casos suspeitos da Covid-19 até que a APC esteja a funcionar”, disse o porta-voz do ACNUR no Brasil, Luiz Fernando Godinho.
Outra das principais preocupações do ACNUR tem sido levar informações de prevenção a populações em situação de rua ou instaladas em abrigos espontâneos, assim como distribuir kits de higiene e limpeza para enfrentar a pandemia, ajuda essa que, segundo o porta-voz, já chegou a 15 mil refugiados.
“Em todo o país, o ACNUR e os parceiros têm distribuído informação confiável e acessível sobre hábitos e práticas de saúde que evitam a disseminação da Covid-19. Esta informação precisa de ser customizada, dadas as necessidades específicas da população refugiada, inclusive em questões idiomáticas”, indicou Godinho.
Ao contrário de outros países que se têm negado a apoiar mais refugiados durante a pandemia, a agência da ONU garante que o executivo brasileiro, liderado pelo Presidente da República, Jair Bolsonaro, tem inserido a população refugiada na resposta nacional à Covid-19, tanto nas questões de saúde, como nas medidas de compensação económica.
“O Governo brasileiro tem respondido à pandemia, e a população refugiada no Brasil está incluída nesta resposta”, frisou o ACNUR.
O Brasil tinha, até domingo, 1.223 óbitos e 22.169 infetados pelo novo coronavírus, segundo dados do Ministério da Saúde do país.
Contaminação dos índios é um dos riscos
A região Norte, que concentra a maioria dos refugiados venezuelanos no Brasil, e que nas últimas semanas vinha sendo a área menos afetada, viu os números de infetados dispararem, com o estado do Amazonas a estar no centro das preocupações da tutela da Saúde.
Apesar de o ACNUR não ter confirmado a existência de casos entre refugiados, frisou estar a trabalhar com as autoridades locais do Amazonas e do Pará para reforçar os abrigos nesses estados, especialmente para as etnias indígenas venezuelanas Warao e Eñepa.
Uma das preocupações das autoridades é a vulnerabilidade das populações indígenas face a doenças respiratórias, o que aumenta o risco de agravamento em caso de contágio pelo novo coronavírus, e que já causou algumas mortes nessas comunidades.
Mas nem só a saúde requer a atenção da agência da ONU para os refugiados, com a parte económica encabeçar as prioridades do órgão. “Também estamos atentos à repercussão económica da pandemia sobre a autossuficiência destas pessoas, pois muitas delas tiveram as fontes de rendimento comprometidas com as restrições que vêm sendo adotadas pelas autoridades sanitárias”, afirmou o porta-voz do ACNUR.
“Uma ação importante tomada pelo ACNUR e entidades parceiras é a promoção dos empreendimentos de refugiados durante o período da quarentena, pois elas precisam de manter os negócios para assegurar rendimentos pessoais e familiares. Todas essas medidas beneficiam não apenas a população refugiada, mas também as comunidades que acolhem estas pessoas”, defendeu Godinho.
E concluiu: “Entendemos que as populações refugiadas no Brasil e no Mundo possuem necessidades adicionais associadas à situação de deslocamento forçado. É preciso redobrar as ações para assegurar que essas pessoas estejam incluídas nas respostas nacionais à Covid-19, e por isso trabalhamos para fortalecê-las sempre que necessário”.