Guerra comercial China/EUA abre espaço ao país

por Arsenio Reis

A guerra comercial entre os Estados Unidos e a China trouxe instabilidade e prejuízos às duas maiores potências económicas do mundo, mas há países, como o Brasil, que podem sair beneficiados com as novas relações da economia mundial, defendem analistas brasileiros.

Especialistas brasileiros consideram que o Brasil, se mantiver uma posição de neutralidade, poderá ser um dos beneficiados do conflito, consolidando uma expansão das exportações de produtos agrícolas dentro do cobiçado mercado chinês. Isto mesmo perante o risco de uma recessão global.

O coordenador de análise e pesquisa do Conselho Empresarial Brasil-China, Tulio Cariello, considera que a guerra comercial está a favorecer a entrada dos exportadores brasileiros no mercado chinês: “A China colocou algumas sobretaxas em produtos americanos do agronegócio, o que obviamente abriu um canal de oportunidades gigantesco porque o Brasil, os Estados Unidos e a União Europeia são os grandes exportadores. Este é um dos poucos setores em que o Brasil é um competidor feroz no mercado internacional”, afirma. 

Por isso, esta crise, acrescenta, acabou por abrir “espaço para o Brasil”. “Houve sobretaxa em produtos norte-americanos como a soja, carne suína e carne bovina, que dão ao país algumas vantagens”, explicou. Túlio Cariello ressalvou que estes benefícios são pontuais já que a guerra comercial trará prejuízos estruturais. 

“A partir do momento que você tem sobretaxas que começam a impedir a importação e a diminuir o fluxo de mercadorias”, isso irá “desacelerar a economia mundial de forma geral. A relação comercial dos Estados Unidos com a China é a mais importante do mundo e isto afeta a economia global”, frisou o coordenador de análise e pesquisa do Conselho Empresarial Brasil-China.

O vice-presidente do Brasil, Hamilton Mourão, faz uma avaliação semelhante. “O mundo acompanha com apreensão a escalada das barreiras tarifárias e o aumento do risco de recessão mundial. Sabemos que ganhos de curto-prazo para o Brasil, como o aumento da demanda por soja, podem ficar comprometidos pela redução global da atividade económica ou pelo desequilíbrio dos mercados no mais longo prazo”, afirmou o vice-presidente brasileiro num evento realizado na cidade de São Paulo no início do mês.

Já o presidente da Câmara de Comércio Brasil-China, Charles Tang, é mais otimista que Cariello ou Mourão. “O benefício para os países produtores de alimentos como o Brasil, Argentina e a Austrália já são visíveis e serão ainda maiores no longo prazo porque esta guerra comercial EUA-China, mesmo que haja um acordo agora, também é algo de longo prazo”, afirmou.

“Os Estados Unidos como primeira economia do mundo não quer tornar-se na segunda economia do mundo”, vinca. No entanto, as projeções do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional (FMI) indicam que Pequim irá liderar a economia mundial na próxima década. “Por isto, penso que esta guerra comercial foi provocada para impedir o avanço económico e tecnológico chinês.”

O presidente da Câmara de Comércio Brasil-China lembrou que o conflito comercial entre as duas nações não é uma novidade, embora se tenha intensificado no Governo do Presidente norte-americano, Donald Trump. Desde o ano passado, Trump adensou as críticas a Pequim e agravou as tarifas de importação de produtos chineses. Em resposta, Pequim retaliou com impostos aduaneiros aos produtos norte-americanos na China, o que transformou a disputa num “tipo de guerra comercial em que todos perdem”.

Primeiro o país, depois Bolsonaro 

Cariello defende que o Brasil deve aproveitar a oportunidade de expansão no mercado chinês porque está bem posicionado, mas frisou que é muito importante manter a neutralidade, sem declarar apoio à China ou aos Estados Unidos neste embate. “O Brasil não deve se posicionar na guerra comercial até porque já se tornou um conflito que passa pela área da tecnologia e da política”, argumentou.

Já Tang avaliou que mesmo que o Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, anuncie a intenção de estabelecer relações mais estreitas com os Estados Unidos dada a convergência ideológica com Donald Trump, o país sul-americano não deve esquecer-se de que os setores mais fortes da sua economia tem uma relação de complementariedade com a China e, por outro lado, de concorrência com os Estados Unidos.

“Quando a China comprar mais soja aos Estados Unidos, quer dizer que compra menos ao Brasil. Quando a China comprar mais soja do Brasil vai comprar menos dos Estados Unidos. Na safra passada, 90 por cento da soja produzida no Brasil foi exportada para a China e o país teve até que comprar soja norte-americana, usufruindo de tarifas vantajosas para abastecer o consumo interno”, lembrou Tang.

“Agora que Bolsonaro se tornou presidente precisa entender que não é a preferência pessoal que vai prevalecer, mas sim o interesse da nação brasileira (…) Entendo que a visita que fará à China [em outubro] é um sinal positivo. Acredito que a relação do Brasil com a China vai estreitar-se cada vez mais porque Bolsonaro reconheceu que a China é estratégica para o Brasil”, concluiu.

Trocas favoráveis

Em 2018, as trocas comerciais entre o Brasil e a China registaram um resultado favorável de 29 mil milhões de dólares norte-americanos ao país sul-americano, segundo dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) brasileiro. De janeiro a agosto deste ano, a China continuou a ser o primeiro destino dos produtos brasileiros com balança comercial, indicando crescimento das exportações ao mercado chinês de 27,9 por cento.

O Governo do Brasil apontou que há, neste ano, um saldo positivo da balança comercial com a China de 17,7 mil milhões de dólares. Já as trocas comerciais do país com os Estados Unidos terminaram 2018 com um défice de 271 milhões de dólares.

Nos oito primeiros meses de 2019, os números indicam que as exportações brasileiras aos Estados Unidos atingiram 19,7 mil milhões de dólares saltando 13,3 por cento. Porém, neste caso, a balança comercial também acumula défice para o Brasil de 351,5 milhões de dólares. 

Carolina de Ré 20.09.2019

Pode também interessar

Contate-nos

Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

Plataforma Studio

Newsletter

Subscreva a Newsletter Plataforma para se manter a par de tudo!