O impacto económico depois da tragédia

por Arsenio Reis

As primeiras previsões do Governo moçambicano apontam para uma grande queda da taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano, com um teto de 2,8 por cento. Mas nem todas as perspetivas são tão pessimistas.

As opiniões dividem-se sobre o impacto do ciclone Idai na economia de Moçambique. Do lado mais pessimista está o Governo moçambicano: antes previa que o Produto Interno Bruto (PIB) podia crescer 3,8 por cento, mas agora admite que a subida fique entre 1,1 e 2,8 por cento. O pessimismo não é generalizado e até há quem defenda que o impacto será ligeiro, desde que as exportações dos setores extrativos não sejam afetadas. O Fundo Monetário Internacional (FMI) ainda está a rever a projeção de crescimento feita em outubro – de quatro por cento para 2019 – e aprovou um empréstimo de emergência de 118,2 milhões de dólares norte-americanos. Espera-se que sirva de catalisador para mais apoios.
O balanço humanitário coloca o ciclone entre as piores catástrofes meteorológicas do hemisfério sul. Fez mais de mil mortos nos três países atingidos – Moçambique, Zimbábue e Maláui – e milhões de pessoas afetadas – ou porque perderam casas e familiares ou porque se viram arredados dos meios de produção. O balanço ao nível das contas nacionais está por fazer, mas o ministro moçambicano da Economia e Finanças foi o primeiro a traçar uma antevisão. “Estimamos uma perda de dois pontos percentuais em função do que tínhamos projetado para 2019”, declarou Adriano Maleiane, em Washington, na sede do Banco Mundial, após uma mesa redonda em meados de abril sobre o ciclone. A reunião juntou representantes de 30 países. Tendo em conta que as previsões anteriores apontavam para um crescimento de 3,8 por cento, o governante afirmou: “Com este ciclone, pensamos que o PIB [Produto Interno Bruto] em Moçambique pode baixar para um intervalo de 1,1 a 2,8 por cento, portanto [o impacto do Idai] é muito forte”. O responsável destacou os prejuízos em infraestruturas e na atividade agrícola, responsável por boa parte do PIB.
A consultora EXX Africa alinha na perspetiva de Maleiane e refere que “a capacidade de Moçambique recuperar rapidamente depois da tempestade e garantir a resiliência a eventos futuros deste género está em dúvida”. Robert Besseling, diretora da firma, destaca que a agricultura representa mais de 20 por cento do PIB e emprega quase 80 por cento da força de trabalho, pelo que “o Idai vai ter um impacto imediato na vida da maioria dos moçambicanos”. “Além dos custos de reconstrução, as importações de vários alimentos, particularmente do milho, devem duplicar durante este ano devido à descida da produção interna”.
John Ashbourne, analista que segue Moçambique na consultora Capital Economics aponta para outro cenário: apesar de ter sido devastador do ponto de vista humano, o ciclone deverá ter um impacto “surpreendentemente limitado” do ponto de vista económico.

Orçamento retificativo?

“A economia moçambicana é baseada apenas nalguns setores”, pelo que, “se continuarem a funcionar” os estragos nos dados económicos oficiais podem ser reduzidos. Os setores chave são a exportação de minérios e eletricidade. “Desde que o comboio para Nacala funcione”, exportando carvão, “a disrupção pode não ser assim tão grande”, conclui o economista.
O Standard Bank também reviu em baixa a previsão de crescimento de Moçambique, mas não de forma tão pessimista como o Governo. O organismo antecipa uma subida do PIB de 3,5 por cento em vez dos 3,7 iniciais, aumentando a estimativa de inflação de cinco por cento para 6,2 por cento. Há “pressões temporárias na liquidez em moeda externa e no câmbio”, além de eventuais pressões fiscais devido às eleições gerais, referiu o economista-chefe, Fáusio Mussá. Tudo junto faz com que “o Governo esteja a equacionar um orçamento retificativo para acomodar os impactos do ciclone”.
O Banco Mundial calcula que sejam necessários dois mil milhões de dólares para recuperar infraestruturas e meios de sustento nos países afetados pela passagem do ciclone Idai, em março. Em comunicado, o Banco Mundial refere que mobilizou “recursos substanciais”, que não quantificou, para “reparar estradas e canalizações de abastecimento de água e esgotos, higiene, controlo e prevenção de doenças, agricultura e segurança alimentar”.
O FMI deu o pontapé de saída e o conselho executivo aprovou a concessão de um empréstimo de emergência no valor de 118,2 milhões de dólares destinado a apoiar Moçambique. A verba enquadra-se num mecanismo específico: o FMI empresta, em situações de emergência, entre 60 a 120 milhões de dólares, no âmbito do Instrumento de Crédito Rápido (RCF, na sigla inglesa). “O desembolso [desta verba] ao abrigo do RCF vai ajudar nas necessidades imediatas de financiamento do país e desempenhar um papel catalisador para captar fundos de doadores e da comunidade internacional”, destaca o diretor adjunto do FMI, Tao Zhang, em comunicado.

Ajudar é preciso

A Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) apelou em abril à recolha de 323 milhões de dólares para alcançar cinco objetivos estratégicos: salvar vidas, proteger a dignidade humana, proporcionar acesso a serviços de saúde e nutricionais adequados, promover ações de recuperação rápida e criação de meios de subsistência, e reforçar a capacidade de coordenação aos níveis nacional e regional. Ao mesmo tempo, a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) anunciou que o fundo de emergência da organização para apoiar a população de Moçambique conta já com 1,5 milhões de euros e continua aberto a contribuições. “[A] perspetiva é de não pensarmos apenas numa ajuda imediata, mas de uma forma estruturada e sustentada um apoio da CPLP a Moçambique”, referiu secretário-executivo, Francisco Ribeiro Telles.

Luís Fonseca 26.04.2019
Exclusivo Lusa/Plataforma Macau

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