“O maior desafio é a falta de vagas escolares”

por Arsenio Reis

A falta de vagas para o número de alunos que há em Macau é o problema que mais preocupa o novo diretor dos Serviços de Educação e Juventude. Em entrevista ao PLATAFORMA, Lou Pak Sang diz que, em 2021/2022, serão precisas cerca de 11 mil vagas para dar resposta à procura. 

Assumiu as rédeas de um dos principais, e mais difíceis, setores há um mês. Lou Pak Sang, novo diretor dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ), aponta como prioridade aquela que diz ser a sua principal preocupação: a falta de vagas no ensino. Daqui a quatro anos, estima serem necessárias mais 11 mil. A solução passa por aumentar o número de alunos por sala, recuando com a política de turmas pequenas que vinha a ser implementada nos últimos anos.

– Quais são os principais desafios do cargo que agora ocupa?

Lou Pak Sang – Estou na DSEJ há 31 anos. Tenho enfrentado muitos problemas, enquanto subdiretor e chefe de departamento, além de outros cargos. O maior desafio que enfrento é a falta de vagas escolares. A taxa de natalidade vai aumentar, por isso o número de alunos também vai aumentar. Como introduzimos a medida de turmas reduzidas, nos próximos anos haverá falta de vagas escolares. Há muitas questões educativas, mas esta questão das vagas é o maior problema da DSEJ.

– Tem ideia de quantas vagas serão precisas?

L.P.S. – Por enquanto, ainda não tenho números concretos. Agora, cada turma tem uma média de 28 alunos. No ano letivo de 2021/2022, teremos necessidade de cerca de 11 mil vagas. Temos estado a implementar a medida de turmas reduzidas, com salas entre 25 a 35 alunos. Mas vamos ter de aumentar o número de alunos por turma.

– Quantos alunos aumentarão por turma? Tem outras soluções em vista? 

L.P.S. – Além de exigir às escolas que aumentem o número de alunos admitidos, vamos implementar mais medidas. Se as escolas tiverem salas vazias, podem receber mais alunos e organizarem mais turmas. Todas as escolas têm salas especiais (como laboratórios e outros espaços). O que podemos fazer é recomendar às escolas que usem algumas dessas salas especiais para aulas para termos mais salas disponíveis. Também pedimos às escolas que têm condições para construírem mais pisos e realizarem obras de remodelação de forma a aumentar o número de salas. A longo prazo, precisamos de fazer obras de reconstrução e pedimos ao Governo para reservar terrenos para fins educativos, tais como os terrenos do Canídromo e a zona A dos novos aterros. A população continua a crescer e por isso precisamos de ter muitas vagas no futuro. Todas as crianças precisam de estudar.

– Aumentando o número de alunos, qual será a média por turma?

L.P.S. – Há dois tipos de escolas em Macau: as que estão integradas na escolaridade gratuita e as que não estão integradas. Para as escolas integradas na escolaridade gratuita, fizemos uma análise geral e nem todas as escolas têm espaço suficiente para receber mais alunos. Há salas mais pequenas que só recebem 25 alunos, mas há salas que podem receber mais do que 35. Por isso, pensamos aumentar para 33 alunos por turma, em média.

– A falta de professores também tem sido outro problema. Quantos professores tem o sistema de ensino neste momento, e de quantos precisaria para funcionar na perfeição?

L.P.S. – No ano de 2017/2018, o ensino não superior tinha 6.962 professores. Após a promulgação do Quadro Geral do Pessoal Docente das Escolas Particulares do Ensino Não Superior, as condições e as regalias para os professores foram melhoradas. A componente letiva semanal é muito elevada, mas agora já é menor, ronda os 16 a 18 tempos letivos semanais para o ensino secundário e 18 a 20 tempos lectivos semanais no ensino primário. Antes da implementação do quadro, os professores recebiam anualmente 200 e tal mil patacas. Agora, recebem em média 420 mil patacas. O salário é muito atrativo. Antigamente, era muito difícil atrair pessoas para a carreira. Agora há mais professores porque os salários e regalias começam a ser melhores. Há falta de professores no ensino infantil, tendo em conta que a taxa de natalidade aumentou. Os professores do ensino especial são suficientes neste momento. Mas, no futuro, precisaremos de mais. 

– Pode adiantar números?

L.P.S. – Neste ano letivo, temos 767 alunos no ensino especial e 1.349 alunos no ensino integrado. No ano letivo 2006/2007, só havia 400 e tal alunos no ensino especial. Durante estes 11 anos, houve um aumento significativo. Se é por causa do estilo de vida, da poluição ou outros fatores, isso não sabemos. Mas agora há mais pais que reconhecem o ensino especial e levam os filhos ao nosso Centro de Apoio Psico-pedagógico e Ensino Especial para serem avaliados e confirmarem se realmente necessitam de apoio. Também o IAS, SSM e DSEJ constituíram o Centro de Avaliação Conjunta Pediátrica para estas crianças, dos 0 aos 6 anos. Verificámos que o número tem aumentado, constantemente. E no futuro poderá haver mais crianças com necessidades educativas especiais. Precisamos de mais professores nesta área, e de mais professores com formação. No ensino especial também há alunos do ensino integrado. São alunos das turmas regulares que podem estudar com os restantes alunos. Limitamo-nos a dar mais apoio. Nestes casos, também têm professores normais, mas que receberam formação. Segundo os dados, no ano letivo 2017/2018, cerca de dois mil e cinquenta professores fizeram o Curso de Ensino Inclusivo, que é de 36 horas. Queremos abrir mais salas e turmas para alunos do ensino integrado, e vamos formar mais professores nesta área.

– Mas, portanto, ainda não tem noção das necessidades ao nível de professores?

L.P.S. – Não vamos deixar nenhum aluno de fora. Iremos ter mais professores. É muito difícil adiantar números. Por exemplo, na área do ensino especial, há várias terapias – da fala, fisioterapia, etc. Por exemplo, na área da terapia da fala, dos 0 aos 3 anos e mais velhos, há falta de terapeutas para estes alunos. No ensino primário, também há carência. O Instituto Politécnico de Macau tem um curso de formação nesta área, mas, anualmente só forma cerca de 20 de estudantes, e não chega. Mesmo aqui na DSEJ há falta de terapeutas. As crianças recebem um ciclo de terapia e precisam de esperar muito tempo para receber outro. Também contratamos terapeutas de Hong Kong para ajudarem as nossas crianças. Mas também há falta de terapeutas em Hong Kong. Por isso, no futuro, queremos contratar terapeutas em Taiwan e Singapura. Também temos dado bolsas de estudo para os alunos frequentarem cursos de terapia no estrangeiro, mas mesmo assim há falta. Por enquanto, temos duas soluções: dar formação aos professores e aos encarregados de educação. Os professores não são terapeutas, mas com esta formação podem ajudar as crianças. Os pais também devem receber formação. Assim, podem aprender como ensinar a criança e, por exemplo, treinar os filhos em casa depois da terapia. Os pais também precisam de colaborar connosco. 

– Que importância tem para si e quais são as perspetivas para o ensino bilingue, com enfoque no português?

L.P.S. – Macau tem como objetivo ser Um Centro, Uma Plataforma, portanto tem um papel muito importante entre os países lusófonos e a China. O português também é uma língua oficial. Nas escolas oficiais, os alunos têm oportunidade de receber educação em português. Se for da secção chinesa, precisam de aprender português. Se forem da secção portuguesa, precisam de aprender chinês. Nas escolas em que não é obrigatório o ensino do português, nós incentivamos. Também investimos nos recursos destinados aos docentes para terem cursos de português. No ano de 2012/2013, havia 20 unidades escolares com cursos de português. Cerca de 1200 alunos aprendiam português. Nos anos de 2017/2018, nas escolas particulares havia 4.162 alunos nos cursos de português e actividades extracurriculares. Não posso dizer que é um número elevado mas, no espaço de cinco a seis anos, é um aumento significativo. Além disso, no verão também oferecemos a oportunidade de irem para Portugal aprender português. O fundo de desenvolvimento educativo dá bolsas de estudo para aprender português no ensino superior. No ano passado, criámos turmas bilingues em duas escolas oficiais. No 1.º ano do ensino primário e 1.º ano do ensino secundário geral da Escola Oficial Zheng Guanying e 1.º ano do ensino primário da Escola Primária Luso-Chinesa da Flora. O “Programa de ensino bilingue chinês-português”, será estendido, progressivamente, ao 3.º ano do ensino secundário geral, nos anos lectivos subsequentes. Também tentamos ensinar a cultura. Por exemplo, ensinamos algumas tradições, como a Festa de São Martinho. Esperamos concluir a revisão de todo o material didático de língua portuguesa para o ensino primário em 2017/2018, ano escolar. A partir de 2018, estudaremos a revisão do material didático de língua portuguesa no ensino secundário.

– Prevê a abertura de mais turmas e escolas bilingues ou trilingues, ou seja, que incluam o ensino do inglês?

L.P.S. – Vamos ver. Estas duas escolas são um plano piloto. Vamos fazer a avaliação e a divulgação. Se outras escolas não conhecem, não vão aderir porque não é obrigatório. Fizemos a reforma curricular, fizemos um plano piloto. Em Macau, poucas pessoas sabem destes sistemas. Ainda por cima são três línguas, quatro idiomas – inglês, português, mandarim e cantonense.

– Muitas escolas já lecionam em mandarim. Porque foi tomada essa opção em detrimento do cantonês? Não teme que a língua local corra risco de desaparecer nestas gerações mais novas já que aprendem em mandarim?

L.P.S. – Segundo as exigências académicas básicas, os alunos têm de saber duas línguas, incluindo mandarim e cantonense. Portanto, têm de aprender mandarim. Algumas escolas internacionais, com sistema internacional, a língua chinesa veicular é o mandarim. Mas as crianças não perdem o cantonense. Têm contacto diariamente porque é a língua materna, já é muito familiar, portanto se na escola podem praticar mandarim, podem dominar ainda mais uma língua. Acho que não é um problema ou uma preocupação. 

– Alguns professores e funcionários queixaram-se de sofrer represálias quando têm posições políticas assumidas e as mostram publicamente. Confirma? Considera que as escolas e o sistema de ensino em Macau abrem espaço e fomentam o espírito crítico?

L.P.S. – É a primeira vez que estou a ouvir isso. Recebemos muitas queixas de professores, mas nunca recebemos queixas sobre esse tema, sobre represálias no trabalho na sequência de posições políticas que possam ter assumido. Nunca ouvi casos destes. Relativamente ao espírito crítico e liberdade de expressão no ensino, damos muita importância a estes aspetos. Damos muita importância ao espírito autónomo dos alunos. Nunca ouvi histórias de professores que tenham sido despedidos por causa da sua posição política.

– A presença de cada vez mais trabalhadores estrangeiros em Macau poderá levar a que cada vez mais crianças, filhas dessas pessoas, possam vir a viver em Macau. Não é altura de a DSEJ e o Governo reconsiderarem o plano de apoio e incluírem as crianças não residentes para que possam estudar em Macau?

L.P.S. – A primeira questão é que precisam de satisfazer uma condição: se podem permanecer em Macau. A educação é igual e é justa. Quanto às regalias, vão ter essas regalias (caso preencham esse requisito). Portanto, não há diferença entre as crianças de Macau e estrangeiras.

– Os alunos são sujeitos a entrevistas e testes desde muito cedo para serem aceites nas escolas. Que tipos de testes fazem? Não acha que é uma prova dispensável, tendo em conta a idade?

L.P.S. – Antigamente, tínhamos um grande problema. Tínhamos de enfrentar filas intermináveis para ter um boletim de inscrição. Agora isso já não é necessário e os pais podem escolher seis escolas para fazerem entrevistas, que são articuladas para que os pais e crianças possam comparecer a todas. Nas creches, os educadores ensinam matemática e um pouco de chinês. Se a criança não frequentar a creche, não sabe fazer nada, nem aprende nada. Mas nem todas as crianças podem frequentar as creches. Por isso, a DSEJ pede às escolas do ensino infantil que não exijam como critério a frequência de uma creche. As entrevistas podem ser atividades lúdicas. Não são testes de matemática, fazer cálculos ou escrever. Não é este tipo de entrevistas que queremos. Damos jogos e vemos como é a reação da criança para avaliar se a escola tem condições para a receber ou não. Observamos como é que a criança brinca. As perguntas que fazemos aos pais e às crianças devem ser simples e não é com base em conhecimentos. Há três ou quatro anos, os pais queixavam-se muito. Agora há poucas queixas e acho que o nosso sistema de entrevista foi melhorado. 

Catarina Brites Soares  09.03.2018

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