Um festival à altura de Macau

por Arsenio Reis

Arranca já no próximo dia 8 a segunda edição do Festival Internacional de Cinema de Macau. No cartaz, há mais de 40 grandes produções internacionais para serem vistas a 50 patacas cada. O novo diretor artístico do certame, o britânico Mike Goodridge, aposta numa seleção de produções artísticas, mas que também pretende agradar ao grande público.

A segunda edição do Festival Internacional de Cinema de Macau decorre entre 8 e 14 de dezembro e traz à cidade grandes produções internacionais. O diretor artístico do certame, Mike Goodridge, identificou uma indústria em crescendo no território, que vê como “porta de entrada” para a China, e quer colocar o certame no mapa dos festivais. “Quero descobrir mais sobre a indústria e a audiência chinesa, que é imensa”, realçou durante a apresentação do evento.

Destacando o seu “real conhecimento” do mundo do cinema, ao qual está ligado há mais de 27 anos, Mike Goodridge espera contribuir para colocar Macau no mapa, notando que a pequena região chinesa, com pouco mais de 30 quilómetros quadrados e cerca de 650 mil habitantes, é um lugar que considera “excitante”, e tem vindo a aparecer cada vez mais no grande ecrã. “A questão está em criar um festival com significado no calendário dos festivais. Há tantos festivais no mundo que o que queremos fazer é algo à medida de Macau, que tenha valor, para que as pessoas venham”, sublinhou o diretor, para quem “parte disso passa por criar uma audiência que queira ver os filmes” que vão ser exibidos.

A equipa liderada por Mike Goodridge, que inclui Huang Jianxin, realizador e produtor chinês, Michael J. Werner, produtor americano, Oh Jung-Wan, produtora da Coreia do Sul, Nansun Shi, de Hong Kong e Luís Urbano, produtor português, concebeu um programa que conta com mais de 40 produções internacionais, pautando-se pelo melhor que tem sido feito em termos artísticos. “Queremos casa cheia e as pessoas entusiasmadas em torno do cinema”, afirmou Mike Goodridge, que criou um cartaz com filmes “artísticos, mas acessíveis”.

Maria Helena de Senna Fernandes, diretora dos Serviços de Turismo de Macau, entidade coorganizadora do evento, destaca a vertente de “filmes para toda a família” desta segunda edição. “Queremos criar uma nova atração, não só para as pessoas de Macau, mas também estudantes e residentes das regiões vizinhas. Sabemos que em Shenzhen e Cantão há academias com cursos de cinema e há a possibilidade de atraí-las.”

Prova disso é a exibição de “As Aventuras de Paddington 2”, que marca a abertura do festival, no Centro Cultural de Macau, no dia 8, e que narra novas histórias do urso britânico, que ficou eternizado nos livros infantis de Michael Bond. “Têm de ver este filme, é encantador. Queríamos um filme que agradasse a toda a gente, que toda a gente apreciasse, toda a família. Estes filmes [Paddington 1 e 2] são uma perfeição e o segundo ainda é melhor que o primeiro. Apesar de não ser um tipo de filme de festival, é um filme extremamente bonito, é o filme de família perfeito. É uma ótima maneira de começar esta celebração de filmes”, disse Goodridge, acrescentando que este é um festival para todas as idades.

Na categoria de “Competição”, que conta com dez realizações, foram incluídos “Custody” (França) e “Foxtrot” (Israel/Alemanha/França/Suíça), “grandes vencedores no Festival de Veneza”, salientou o diretor artístico. O júri é presidido pelo realizador francês Laurent Cantet e é composto pela atriz sino-americana Joan Chen, a realizadora austríaca Jessica Hausner, o escritor britânico Lawrence Osborne e o realizador de Singapura Royston Tan. O vencedor será premiado com 60 mil dólares norte-americanos.

“Queremos que a audiência de Macau não fique desencorajada por estes filmes, não pense que são demasiado artísticos, ou estrangeiros, ou seja o que for, mas que os abrace. Escolhemos filmes que contam grandes histórias e têm temas universais (…) Selecionámos deliberadamente filmes que promovam a reflexão e sejam muito acessíveis em termos de narrativa. Se eu pudesse ver um filme filipino de sete horas, fá-lo-ia, mas não quero infligir isso a toda a gente porque sei que não é ao gosto de todos”, indicou Goodridge.

Representante português

O filme português “A Fábrica de Nada”, do realizador Pedro Pinho, é um dos mais de 40 que vão estar em exibição durante a semana do Festival. O anúncio foi feito pelo diretor artístico do certame, que classificou a obra como “o melhor filme português do ano”. Apesar de ter três horas de duração, “é soberbo”, diz Mike Goodridge. “Não deixem que isso vos desencoraje [a vir assisti-lo].”

A produção portuguesa não vai estar na competição, estando inserida na secção “Panorama”, que inclui uma seleção de filmes premiados noutros festivais ao longo deste ano. Dez produções fazem parte da secção “Panorama”, do Continente, Estados Unidos, França, Japão, Malásia, entre outros países e territórios.

Pedro Pinho assina a sua primeira longa-metragem, mas o filme de ficção foi construído em conjunto com Luísa Homem, Leonor Noivo, Tiago Hespanha, a partir de uma ideia de Jorge Silva Melo e da peça de teatro “A fábrica de nada”, de Judith Herzberg. 

A película, que conta com interpretações de atores e não atores, segue a vida de um grupo de operários que tentam segurar os postos de trabalho, através de uma solução de autogestão coletiva, e evitar, assim, o encerramento de uma fábrica.

“Parte de algo que aconteceu muito em Portugal que é o fim de um ciclo de atividade industrial e o encerramento de muitas fábricas que levam ao desemprego e ao desespero dos operários que nelas trabalharam”, explica Pedro Pinho sobre a temática do seu primeiro filme.

O realizador português fez a estreia mundial do filme em maio passado em Cannes, tendo recebido o prémio da federação dos críticos de cinema. “Mesmo antes de o filme ter acabado, ouve gente que começou a levantar-se e a aplaudir. Foi assim uma coisa curiosa”, relata Pedro Pinho. “A coisa durou sete minutos. Acho que todos nós [equipa do filme] tínhamos vontade de nos enfiarmos num buraco qualquer debaixo da cadeira”, brinca.

De acordo com a produtora Terratreme, “A Fábrica de Nada” já teve estreia comercial em França, Espanha, Reino Unido, Sérvia, Croácia, Bósnia, Kosovo, Suíça, Brasil, Argentina e no Continente. Tem ainda confirmada exibição em mais de 50 festivais até ao final do ano, nomeadamente de Londres, Rio de Janeiro, Busan, Viena, Sevilha, Argentina, México, Chile e República Checa.

Novas secções

O programa inclui outras secções como “Gala”, em que vão ser exibidos três dos mais importantes filmes do ano; “Flying Daggers”, com seis dos filmes mais inovadores e representativos do atual cinema asiático; “Crossfire”, composta por seis filmes recomendados por realizadores de peso, e “Panorama”, com oito películas premiadas nos principais festivais de cinema em 2017.

Uma das novidades no programa prende-se com a introdução de uma categoria “Para Toda a Família” e com um programa de formação em produção cinematográfica, a ser ministrado por profissionais do Instituto de Cinema Britânico, destinado a jovens de Macau interessados em enveredar pela sétima arte.

À semelhança da edição inaugural, realizar-se-ão fóruns de cinema e uma feira de investimento destinados a profissionais da indústria cinematográfica, além de ‘masterclasses’ com profissionais internacionais de renome.

A entrada para cada filme custa 50 patacas e os bilhetes já estão à venda tanto nos locais de exibição como online, em macauticket.com. Na compra de bilhetes para mais de três filmes, há um desconto de 20 por cento. Os filmes serão exibidos no Centro Cultural de Macau, Torre de Macau e Cinemateca Paixão (consulte o programa nas páginas seguintes).  

O júri

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O júri do festival deste ano é composto por cinco figuras de destaque, todos eles reconhecidos internacionalmente. 

Laurent Cantet (França)

Nascido em Melle (França), inicia a carreira de cineasta como diretor de fotografia em “L’étendu” (1987). Licenciado pelo Instituto de Estudos Cinematográficos Avançados de França, estreou-se como diretor e roteirista em “Tous à la manif” (1994). Acumula prémios em diversos festivais mundiais. Os seus trabalhos mais conhecidos são “Recursos Humanos” (1999) e “Entre les Murs” (“A Turma”), de 2008, este último indicado ao Óscar e vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes.

Jessica Hausner (Áustria)

Realizadora e argumentista, nasce em Viena, em 1972. Enveredou pelo cinema quando foi estudar para a Filmakademie de Viena. Em 1999, com os realizadores Antonin Svoboda e Barbara Albert, e o diretor de fotografia Martin Gschlacht, cria a produtora Coop99, responsável pela produção de vários filmes dos fundadores e de outros cineastas austríacos emergentes. Realiza “Flora” em 1995 e “Inter-view” em 1999, mas é “Lovely Rita” (2001) que lhe abre as portas ao reconhecimento internacional, ao ser exibido na secção Un Certain Regard do Festival de Cannes desse ano. “Lourdes” (2009) é selecionado para a competição do Festival de Veneza e arrecada o Prémio FIPRESCI. Segue-se um interregno de cinco anos, findo o qual surge “Amor Louco” (2014), selecionado também para a secção Un Certain Regard em Cannes. Foi ainda filme de abertura da Viennale e o vencedor do prémio Melhor Filme do Lisbon & Estoril Film Festival 2014.

Joan Chen (EUA)

De muitos papéis na China natal a outros tantos na indústria norte-americana, a atriz ganha visibilidade em finais da década 80, com “O Último Imperador”, rampa de lançamento para um currículo eclético que inclui colaborações com David Lynch (na série e no filme “Twin Peaks”), Ang Lee (“Sedução, Conspiração”) ou Jia Zhang-ke (“24 City”), e ainda em títulos menos reputados como “Em Terra Selvagem”, de Steven Seagal, ou “Judge Dredd”, ao lado de Sylvester Stallone. Nasce em Xangai em 1961, vai para os EUA com 20 anos para estudar cinema na Universidade do Estado da Califórnia de Northridge. Em 1999, naturaliza-se norte-americana.

Lawrence Osborne (Reino Unido)

Nasce no Reino Unido, tem formação em Cambridge e Harvard. França, Itália, Marrocos, EUA, México, Turquia e Tailândia são alguns dos países no seu currículo. Colaborador regular em grandes publicações – entre elas o “New York Times”, o “The New Yorker”, o “New York Times Book Review”, a “Forbes” e a “Harper’s”. Lançou 6 livros de não-ficção. Autor dos sucessos de venda “The Forgiven”, “The Ballad of a Small Player” (já adaptados para o cinema) e “Hunter in the Dark”. Uma das suas obras mais famosas é “O Connaisseur Acidental” (2009), uma crítica aos “entendidos” de vinho. 

Royston Tan (Singapura)

Nasce em 1976. Diretor da primeira antologia de filmes no dialeto de Singapura. Cinco produções de jovens realizadores singapurianos, intitulado “667”, que usam exclusivamente dialetos como cantonês, hakka, hainanense, teochew e hokkien. Realiza sobretudo curtas-metragens, centradas em temas sociais da cidade-estado.  “Sons” (2000) arrebata uma série de distinções internacionais, entre elas a medalha de prata no Festival de Cinema de Tóquio. Conta agora com mais de 80 prémios e distinções. 

Jovens cineastas produzem duas curtas

O Instituto de Cinema Britânico (BFI na sigla inglesa) regressou a Macau em novembro último para trabalhar com 12 jovens realizadores, no âmbito do BFI International Film Academy. No ano passado, um grupo de residentes locais produziu a curta-metragem “Reunion” e este ano o desafio é maior: Em nove dias (entre 1 e 9), os candidatos tiveram de produzir uma curta de ficção científica e outra de ação. Os guiões, escritos em Londres, têm Macau como tema. As duas produções serão exibidas no encerramento do Festival Internacional de Cinema de Macau e vão concorrer a outros festivais.

Michelle Yeoh é a musa deste ano

A atriz malaia, de 55 anos, foi escolhida como a grande homenageada na edição deste ano do Festival. Conhecida pelas suas participações em filmes chineses de artes marciais e como bond girl no filme “007 O Amanhã Nunca Morre”, Michelle Yeoh participa numa conversa pública dia 14 de dezembro. Durante o festival, o filme “Reign of Assassins” (2010), protagonizado por Michelle e dirigido Su Chao-pin, será exibido no âmbito da homenagem. De acordo com Mike Goodridge, diretor artístico do Festival, a escolha por Michelle Yeoh decorre de atriz ser “verdadeiramente uma estrela global”. 

“O Poder da Imagem” integrado no Festival

Com a ideia de traçar uma “Nova Plataforma, Novas Perspetivas”, a edição deste ano do festival de cinema também apoia a mais recente edição de “Macau – O Poder da Imagem”, proporcionando um espaço para exibição dos trabalhos criativos que se destacaram. O projeto, organizado pelo Centro Cultural de Macau, já apoiou a produção de 90 vídeos locais, nos últimos 10 anos. O projeto integra este ano, pela primeira vez, o Festival para encorajar novos realizadores e para promover mais e melhor a produção cinematográfica ‘made in Macau’.

Esperados mais de 400 profissionais 

O Intercâmbio para a Indústria Cinematográfica realiza-se no Centro Cultural de Macau, permitindo aos operadores a troca de ideias, contactos e a criação de oportunidades de negócios. A organização convidou mais de 250 profissionais de cinema oriundos de 20 países e regiões, e 165 representantes de média de 36 países e regiões.

Donnie Yen e D.O. entre os embaixadores-estrelas

Donnie Yen, D.O., Jeremy Renner e Miriam Yeung são os embaixadores da edição deste ano do Festival. Jeremy Renner, D.O. e Miriam Yeung vão estar na cerimónia de abertura, enquanto Donnie Yen estará presente na entrega de prémios, dia 14 de dezembro.

‘Master classes’ com realizadores asiáticos

No ano passado, um dos pontos altos do programa foi a realização de ‘master classes’ dedicadas aos aficionados da indústria cinematográfica. A iniciativa prosseguiu este ano com os John Woo e Pang Ho Cheung a partilharam, no mês passado, as respetivas experiências com grupos de residentes locais, oferecendo uma compreensão abrangente sobre a indústria cinematográfica. 

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