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Governo abre guerra contra a má nutrição das crianças e quer ganhar

O combate das autoridades guineenses contra a má nutrição que afeta milhares de crianças no país já tinha começado, mas a guerra foi declarada oficialmente a 18 de novembro com o lançamento do Dia Nacional da Nutrição.

“Esta luta não é só de um ator, muito menos só do Governo, mas de todos nós”, disse o ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares, Soares Sambu, sublinhando que a participação de todos os guineenses é fundamental para se acabar com a falta de qualidade alimentar no país.

Em causa estão números pouco animadores sobre a realidade e que revelam uma situação de nutrição muito preocupante.

Segundo os Indicadores Múltiplos da ONU referentes a 2014, quase 28% das crianças guineenses sofrem de má nutrição crónica e 6% de má nutrição aguda.

A nível regional, Oio, Bafatá e Gabu são as três regiões da Guiné-Bissau mais afetadas com um terço das crianças a sofrerem de desnutrição crónica ou nanismo.

“Ou seja, entre 30 e 35% das crianças naquelas regiões estão no nível sério de desnutrição segundo os critérios da Organização Mundial de Saúde (OMS)”, sublinhou a representante do Programa Alimentar Mundial (PAM) na Guiné-Bissau, Kiyomi Kawaguchi.

Um prato cheio de arroz representa a felicidade indisputável

O problema do combate à má nutrição na Guiné-Bissau não passa tanto pela falta de alimentos, mas por uma mudança de mentalidade e por disponibilizar informação sobre os alimentos fundamentais para uma alimentação saudável.

“A maioria da população, infelizmente, ainda não está ciente das causas dos seus problemas de saúde que, na maioria dos casos, tem a ver com a diversidade e a qualidade dos alimentos. Uma boa alimentação não depende da quantidade dos alimentos consumidos, mas sim da sua qualidade”, lamentou Kiyomi Kawaguchi.

No país, ainda não existe o conceito de nutrição e a população precisa de ser sensibilizada tanto para a nutrição, como para a alimentação.

“Tanto para homens, como para as mulheres, um prato cheio de arroz representa a felicidade indisputável”, explicou a representante do PAM.

E um prato cheio de arroz também tem consequências para a saúde.

Por outro lado, ainda existem mulheres com pouco poder quer dentro do seio familiar, como na comunidade, e que não conseguem garantir uma distribuição justa e adequada dos alimentos.

“Essas mulheres também têm menor oportunidade de frequentar centros de saúde quando os seus bebés e crianças ficam doentes”, acrescentou a representante do PAM.

O ministro da Saúde da Guiné-Bissau, Carlitos Barai, é mais pragmático e perentório. Para combater os problemas de má nutrição no país é preciso conhecer as tradições culturais e os grupos étnicos.

As regiões mais afetadas pela má nutrição são onde dominam os grupos étnicos dos fulas, mandigas e biafadas.

Segundo o ministro, aquelas etnias cultivam e criam animais, mas enviam tudo para vender em Bissau e guardam o dinheiro, que não gastam em alimentação ou medicamentos para as famílias.

Já as etnias que se encontram mais a litoral, incluindo nos Bijagós, aproveitam os recursos do mar para se alimentarem e têm uma melhor alimentação.

“Temos as nossas tradições que às vezes complicam as coisas. Uma criança com má nutrição tem um problema de maldição que alguém lhe fez. Os régulos têm de ajudar as pessoas a resolver os problemas de má nutrição e explicar que o único problema é má alimentação”, disse o ministro da Saúde.

As tradições culturais impedem também muitas meninas de ir à escola onde podiam comer um prato de comida por dia e o aleitamento materno.

Meninas que não faltam à escola recebem cinco quilogramas de arroz 

por mês

O PAM através do programa Cantina Escolar garante não só que as crianças das famílias mais vulneráveis vão à escola, como que estas tenham educação, saúde e nutrição.

O programa abrange 173.000 alunos de 750 estabelecimentos escolares da Guiné-Bissau e cerca de 60% das crianças matriculadas nas escolas primárias de oito das nove regiões do país, excetuando Bissau. 

Para que as meninas estejam presentes e não faltem às aulas, a organização, no âmbito do programa, dá às famílias cinco quilogramas de arroz por mês.

Uma forma de garantir a educação das meninas, até porque, segundo o PAM, quanto mais educadas são as mulheres, melhor o nível de nutrição das famílias.

“Por exemplo, o aleitamento materno, um dos melhores alimentos que as crianças podem receber, não é aproveitado, porque nem todos os homens, avós, e a próprias mães de família conhecem todas as vantagens do aleitamento materno”, disse Kiyomi Kawaguchi.

Mas, salientou, a “boa notícia”, é que os indicadores melhoram com o “aumento do nível de educação das mães ou cuidadores das crianças”.

Isso “sugere uma clara relação entre boa nutrição e boa educação, além de uma correlação definitiva entre o nível de educação do chefe de família e a segurança alimentar das famílias”, acrescentou.

Por isso a importância de promover a igualdade do género, desafio que Kiyomi Kawaguchi considerou como “requisito crucial” para combater a desnutrição.

As doenças do mundo moderno

Mas, se por um lado, se trava uma guerra contra a falta de alimentos, por outro, é preciso iniciar outra contra o excesso de peso e a obesidade, que provocam doenças cardiovasculares, diabetes e alguns tipos de cancro.

Segundo o chefe dos serviços de cuidados intensivos do Hospital Nacional Simão Mendes, em Bissau, o país tem vindo a registar um “aumento preocupante” de casos de crianças com diabetes.

A preocupação do médico aumenta, porque as crianças diagnosticadas com diabetes são quase todas da variante 1 da doença, ou seja, as que só podem ser tratadas com insulina, que não existe no país.

Parece paradoxal, mas para a representante do PAM na Guiné-Bissau, tanto um problema, como o outro, surgem da mesma questão: a falta de informação e de conhecimento para a utilização de alimentos que estão disponíveis no país. 

Isabel Marisa Serafim-Exclusivo Lusa/Plataforma Macau

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