A Fortaleza do Monte e os dois templos de Na Tcha

por Arsenio Reis

O dia 18 do quinto mês do calendário lunar é o aniversário do príncipe Na Tcha da mitologia chinesa. Em Macau existem dois templos dedicados a esta figura, um deles na Calçada das Verdades e o outro junto às Ruínas de São Paulo. Segundo reza a história, originalmente Macau apenas tinha o templo de Na Tcha da Calçada das Verdades. Contudo, mais tarde, devido a uma epidemia que assolava a zona das Ruínas de São Paulo, os residentes daquela área pediram ao templo de Na Tcha para que o espírito da divindade fosse transferido para a sua zona, de forma a afastar os males que os afetavam. Os residentes da Calçada das Verdades, porém, recusaram, pois a epidemia também afetava a sua zona. Sendo assim, os residentes da zona das Ruínas de São Paulo apenas puderam através de bunrei (divisão espiritual) trazer o espírito de Na Tcha para um novo templo que construíram na sua zona. Passada a epidemia, a população das Ruínas de São Paulo manteve algum rancor em relação aos residentes da Calçada das Verdades que lhes recusaram prestar ajuda. Porém, continuaram a venerar o trono de Na Tcha no novo templo como agradecimento pela erradicação da epidemia, dando origem a um grande número de peregrinos que visitam o templo de há vários séculos para cá.

Embora Na Tcha seja um deus protetor que afasta os males, a sua natureza é rebelde e agressiva, tendo este tendência em meter-se em apuros e em dar preocupações à sua família. O clássico literário “Fengshen Yanyi” (Investidura dos Deuses) narra a história de como Na Tcha, depois de causar problemas no Mar do Leste da China, retirou os seus ossos para os devolver ao seu pai e as suas entranhas para as devolver à sua mãe.

Embora a Calçada das Verdades e as Ruínas de São Paulo sejam duas áreas residenciais distintas, os dois locais situam-se perto da Fortaleza do Monte e ambos veneram Na Tcha como deus de proteção. A natureza competitiva e rebelde da divindade parece refletir-se nas crianças de ambos os locais, sendo que em ambos os sítios elas são em geral bastante enérgicas e atrevidas. Nas últimas quatro ou cinco décadas, surgiram em ambas as zonas vários atletas de renome, como Lei Ip na Calçada das Verdades ou Ho Kam Wa nas Ruínas de São Paulo. Contudo, as crianças das duas zonas também causaram problemas devido à sua rebeldia. Na segunda metade da década de cinquenta ocorreu um conflito entre as crianças das duas zonas, e ambas as partes travaram uma “guerra das pedras” arremessando pedregulhos na zona da Fortaleza do Monte. De acordo com os relatos, ambas as fações tinham membros que usavam lenços e paus de bambu de pendurar a roupa como bandeiras. Esta “guerra das pedras” manteve-se durante dois dias, até que um jornalista deu conta do incidente e fez o relato da situação, levando as autoridades a “deterem” os pequenos belicistas responsáveis. Os jovens fugiram de volta para as suas casas, não se atrevendo a sair, e colocando um fim a esta guerra.

Já se passaram 338 anos desde a construção do Templo de Na Tcha na Calçada das Verdades, e o templo das Ruínas de São Paulo já tem quase dois séculos. Nos últimos anos, devido ao desenvolvimento do setor turístico por parte do Governo, as Ruínas de São Paulo tornaram-se num local de visita essencial para os turistas, e como consequência também o Templo de Na Tcha beneficiou desta atenção especial, mantendo constantemente acesas as chamas dos seus incensos. O Templo de Na Tcha da Calçada das Verdades, por outro lado, seguiu o rumo das artes marciais e da dança do leão. Ainda assim, os responsáveis de ambos os templos manifestaram a esperança de que as autoridades reforcem o apoio para promover a cultura dos templos de Macau. 

DAVID Chan 

Pode também interessar

Contate-nos

Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

Plataforma Studio

Newsletter

Subscreva a Newsletter Plataforma para se manter a par de tudo!