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Portugal e Macau reveem acordo de troca de informações fiscais

O secretário de Estado português para os Assuntos Fiscais visita a região no próximo dia 5. Fernando Rocha Andrade vai assinar um protocolo que no futuro permitirá a bancos de Portugal e Macau partilharem o saldo das contas dos clientes com as autoridades tributárias nas duas jurisdições.

– Portugal e Macau mantêm há vários anos acordos de natureza fiscal, sejam relativos à troca de informações fiscais seja no que diz respeito a evitar a dupla tributação. Que balanço é feito da aplicação destes acordos? Há necessidade de algum novo enquadramento nesta relação?

Fernando Rocha Andrade – Existe como se sabe uma convenção para evitar a dupla tributação e a evasão fiscal, em vigor desde 1 de Janeiro de 1999, que tem sido aplicada sem problemas e ao abrigo da qual também existe troca de informações nos mecanismos normais de dupla tributação. Estão em curso negociações de um protocolo de revisão desta convenção sobre dupla tributação e o foco essencial dessas negociações é precisamente a questão das trocas de informações. Se essas negociações forem concluídas a tempo, tenho esperança de que no quadro da minha visita possa ainda ser possível proceder à assinatura desse protocolo de revisão da convenção de dupla tributação.

– Este aspecto de revisão, que diz respeito em particular à troca de informações, tem já a ver com a adopção de novos critérios no quadro da OCDE, os Common Reporting Standards, no futuro por Macau?

F.R.A. – O protocolo de revisão abre a porta a que essa aplicação possa ser feita. Macau, tal como a China, não é signatária da convenção de troca multilateral de informações, tendo optado por aquilo que designa como uma abordagem bilateral. Este protocolo de revisão não implementa desde já uma troca de informações com base nos Common Reporting Standards da OCDE, mas possibilita que no futuro seja celebrado um acordo administrativo entre Macau e as autoridades portuguesas no sentido de existir essa troca bilateral de informações no modelo da OCDE. Nós sabemos que Macau tem o compromisso político formalizado junto da OCDE para que existam trocas de informações no seio deste mecanismo até 2018.

– Que tipo de informação é que poderá ser partilhado no futuro e para que efeitos?

F.R.A. – A legislação fiscal portuguesa não tributa diretamente a detenção de património financeiro. Portanto, a obtenção de informação sobre património não determina só por si a aplicação de nenhum imposto. Todavia, é uma informação importante no sentido de apoiar a determinação dos rendimentos daquelas pessoas que são residentes em Portugal, e como tal são sujeitos passivos do nosso imposto de rendimento. É essa a perspetiva, porque os Common Reporting Standards referem-se sobretudo a património financeiro. Ou seja, contas bancárias e outras contas financeiras detidas em instituições financeiras. 

– Portanto, de futuro as instituições financeiras irão partilhar essa informação com as autoridades tributárias portuguesas?

F.R.A. – No caso de Macau, ainda não existe o acordo para a partilha dessa informação. Neste momento, o único mecanismo que existe é o da convenção de dupla tributação. Mas, no acordo multilateral que já está em vigor e de que Portugal faz parte, aquilo que é fornecido por troca automática de informações são as contas financeiras detidas por residentes em Portugal em países no estrangeiro que sejam também subscritores do acordo. Essa informação é fornecida num formato muito bem determinado, que é o saldo dessas contas uma vez por ano, ao dia 31 de Dezembro. Esta é a informação partilhada neste momento.

– Aplicando-se a Macau não visará os cidadãos portugueses com residência em Macau, mas sim aqueles que têm residência em Portugal?

F.R.A. – O foco do acordo da OCDE é a tributação relativa a residentes. Os cidadãos portugueses que estão em Macau e aí desenvolvem a sua atividade pagam os impostos de rendimento em Macau. Não são sujeitos do nosso IRS, pelo menos enquanto residentes. Os acordos de troca de informação não alteram essa situação.

– O Governo de Macau pretende negociar com autoridades do Governo da República Popular da China a possibilidade de os produtos portugueses e de outros países de língua portuguesa gozarem de isenções na exportação para a China Continental, mediante a condição de serem parcialmente processados em Macau. Como veem as autoridades portuguesas esta possibilidade do ponto de vista da cooperação fiscal e aduaneira?

F.R.A. – Vemos sempre com bons olhos quaisquer medidas que facilitem as trocas que envolvam Portugal, Macau e a República Popular da China. Nós não podemos unilateralmente fazer muito no que toca às políticas de direitos aduaneiros, uma vez que eles são definidos pela União Europeia e não por Portugal. Também não podemos determinar as relações que existem entre Portugal e a China. O que fazemos é um esforço no sentido de eliminar tanto quanto possível os obstáculos administrativos que por vezes prejudicam as trocas comerciais entre os nossos países. 

– No quadro das relações de investimento Portugal-China, as empresas energéticas portuguesas participadas por capitais chineses encontram-se neste momento a contestar a Contribuição Extraordinária do Setor Energético. Como antecipa que se venha a resolver este diferendo?

F.RA. – Todas as empresas energéticas foram sujeitas a uma contribuição extraordinária no quadro de um conjunto de medidas extraordinárias que Portugal tomou nos anos da crise financeira. Desde logo, vamos esclarecer que não foram dirigidas a empresas que fossem participadas por outras empresas estrangeiras. Algumas empresas contestam a medida judicialmente e, portanto, essa é uma questão que os tribunais portugueses resolverão. Quanto à contestação ao nível político, o que posso dizer é que este Governo tem procedido a uma progressiva eliminação das várias medidas extraordinárias que foram tomadas no âmbito da crise financeira. Essa eliminação é progressiva, não incidiu ainda sobre esta medida extraordinária em concreto.

– Quando é que irá incidir?

F.R.A. – Não existe neste momento qualquer compromisso quanto a esse calendário.

– Estão previstos mecanismos de simplificação no que diz respeito às obrigações fiscais no transporte de bens para cidadãos com mobilidade entre Macau e Portugal?

F.R.A. –  Há uma questão de fundo que não pode ser alterada, que é dos direitos aduaneiros e do imposto sobre valor acrescentado nestas operações, porque os direitos aduaneiros são definidos pela União Europeia e o IVA é um imposto harmonizado a nível comunitário. Portugal não pode tomar medidas no que diz respeito ao imposto na entrada desses bens. A saída desses bens é naturalmente livre. Agora, podemos de facto simplificar os procedimentos administrativos. Queria chamar a atenção para dois aspectos. Um, que já está na lei portuguesa e que começará a ser implementado a partir de 1 de Julho. Tem a ver com as compras em Portugal e com o regime de ‘tax free’. Beneficiará aquelas pessoas que fazem compras e depois têm que enfrentar longas filas de espera no aeroporto de Lisboa para obterem a devolução de imposto. Uma outra questão, que também terá eventualmente incidência nessa matéria, é uma negociação que temos em curso tanto com Hong Kong como com a República Popular da China, com incidência nas mercadorias que vêm por via marítima. Gostaríamos de ter implementado com portos chineses um mecanismo simplificado de procedimentos alfandegários, que designamos por SFTL. Significa que os procedimentos alfandegários, desde que exista uma adesão de um porto português e de um porto chinês ou de Hong Kong, são muito simplificados. Como cumprir os procedimentos também representa custos, isso traduzir-se-á em menores custos na passagem pela alfândegas. Neste caso, o SFTL trata-se da adesão dos portos portugueses a um programa que aliás já existe no âmbito da União Europeia, com outros portos europeus já aderentes. Beneficiará também essas pessoas cujo trânsito é mais entre Macau e Portugal.  

– Haveria termos recíprocos com os portos chineses e de Hong Kong?

F.R.A. –  A reciprocidade significa que é um mecanismo cujo alcance é muito mais geral do que simplesmente os cidadãos que dividem a sua vida entre Portugal e a China. Terá implicações também no trânsito de mercadorias, se for implementado como nós esperamos, nos dois sentidos entre portos portugueses e portos chineses, ou o porto de Hong Kong.

 – Há uma negociação com as autoridades centrais ou com portos particulares?

F.R.A. –  A questão é com as autoridades centrais e, portanto, essa definição mais de pormenor é posterior. No caso de Hong Kong, só há um porto na jurisdição.

– Consegue antecipar quando poderá haver um desenlace dessas negociações?

 F.R.A – Vou abordar a questão durante a minha visita, mas ainda é cedo para antecipar um momento de conclusão.

Maria Caetano

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Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

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