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A ilha do futuro

 

O BNU opera em renmimbi desde o primeiro dia em que a sucursal de Hengquin abrir as portas, na semana passada, uma vantagem competitiva no apoio às empresas que operam no Continente, mas também na internacionalização para o mundo lusófono. O presidente do banco português, Pedro Cardoso, olha com  otimismo para a margem de crescimento na China e para a diversificação da economia em Macau. “Tendências que só podem ser muito positivas”.

 

– Consumado o plano de uma sucursal na Ilha da Montanha (Hengqin), qual é o seu real potencial estratégico, tendo em conta duas das grandes linhas de força para a diversificação económica em Macau: integração regional e ligação entre a China e os países lusófonos?

– Pedro Cardoso – Esta ida para Hengqin segue precisamente essas duas linhas de desenvolvimento. Por um lado, a integração regional, no sentido em que a nova agência procura apoiar os agentes de Macau – empresas e particulares – que investam na China Continental, em particular na província de Guangdong. Temos milhares e milhares de clientes que têm desde uma simples habitação, a fábricas, empresas de prestação de serviço, construção civil, etc. Há muitos anos que nos pedem para estendermos o nosso apoio ao outro lado da fronteira. Por outro lado, o BNU é parte integrante da Caixa Geral de Depósitos (CGD), que tem uma presença absolutamente ímpar no espaço da língua portuguesa – presente em sete países e líder de mercado em cinco deles. A presença da CGD no mundo lusófono representa uma vantagem competitiva e um fator diferenciador que temos cada vez mais de aproveitar, nessa ligação à China – segunda economia mundial e, num prazo não muito longo, a primeira.

 

– Quais são as vantagens competitivas de Hengqin?

P.C. – Queremos aproveitá-las e explorá-las até ao limite. Hengqin é um complemento, porque a esmagadora maioria das operações com os países de língua portuguesa são feitas a partir da China – e não de Macau. Apesar de ser um único país, do ponto de vista monetário e de circulação de capitais são duas entidades separadas. Há muitas operações e apoio que não podemos prestar a partir da Região Administrativa Especial de Macau, mas podemos apostar nelas a partir do outro lado da fronteira. Muitas empresas, mais do que serviços do dia a dia, de banca transacional, precisam de um apoio mais estável e menos diário. Aí, a proximidade geográfica não é tão importante e não excluímos, em algumas circunstâncias, apoiar empresas que não se circunscrevem à província de Guangdong, sendo ou não de matriz portuguesa.

– Desde que apostem no mercado chinês…

P.C. – Que tenham presença física ou que exportem para o mercado chinês. Queremos também aproveitar Hengqin para apoiar empresas chinesas que pretendam abordar os mercados de língua portuguesa, através dos contatos e dos colegas que temos nesses países.

 

– Referiu-se ao princípio “um país dois, sistemas”, mas há quem veja em Hengqin um terceiro sistema, no sentido em que nessa zona económica especial se fundem princípios da China Continental com os das regiões autónomas especiais de Macau e de Hong Kong…

P.C. – Do ponto de vista bancário não vejo grande diferença face ao resto da China. Na regulação, supervisão, fiscalidade… as diferenças são diminutas. O que vemos em Hengqin é um espaço privilegiado de ligação entre Macau e o Continente, que o Governo Central claramente estabeleceu. Partilho um pouco essa visão de um terceiro sistema, porque realmente há em Hengqin muitos elementos mistos. Contudo, no setor bancário, pelo menos até ao momento, não existe grande diferenciação. Onde notamos grande diferença – estamos extremamente agradecidos, tanto ao Governo central como ao de Macau – é no regime CEPA, do qual tanto se fala e tão pouco se aproveita.

– Como é que o CEPA, regime jurídico que derruba barreiras aduaneiras entre as nove províncias do Delta do Rio das Pérolas, Macau e Hong Kong, ajuda o setor bancário?

P.C. – Permitiu-nos um acesso mais fácil e direto e a aprovação da sucursal foi mais expedita, sob dois pontos de vista: primeiro, o estabelecimento do limiar mínimo dos nossos ativos ou da entidade que pode abrir agências na China Continental – o CEPA estabelece um regime especial para Macau – depois, e mais importante ainda, é o facto de nos permitir, desde o primeiro dia, desenvolvermos operações em renminbis. O padrão normal para um banco estrangeiro é primeiro abrir um escritório de representação, mais tarde uma sucursal, depois esperar alguns anos até poder operar em renminbis. Foi aliás o que aconteceu à sucursal da CGD em Zhuhai. Neste caso, como sucursal de uma entidade baseada em Macau, ao abrigo do CEPA, operamos em renminbis desde o primeiro dia.

– Qual é a importância que o renminbi tem para os clientes?

P.C. – A maior parte dos clientes de Macau que investem na compra de habitação permanente, em Hengqin, Zhuhai ou noutras áreas, de uma forma geral tem rendimentos em dólares de Hong Kong ou em patacas; logo, preferem o financiamento nessas moedas. Mas as empresas que vamos apoiar do outro lado da fronteira, como têm os proveitos em renmimbi, querem o financiamento nessa mesma moeda.

– Evitam os riscos da flutuação monetária…

P.C. – Exatamente. Daí que, se não pudéssemos operar em renmimbis, operaríamos só com um braço – e não com os dois. Estaria completamente excluído um segmento muito importante para nós que é o das empresas.

– O renminbi é também importante na relação com os países lusófonos?

P.C. – Também, porque um dos desígnios claros do Governo Central é a internacionalização do renminbi. E cada vez mais se estabelecem acordos preferenciais entre a China e outros países para a utilização do renminbi em termos das transações cross-border. Daí querermos cada vez mais fazer esse tipo de operações – financiamento, exportação, importação, transferências, etc – na moeda chinesa. Conhecendo a realidade de alguns países de expressão portuguesa, onde existem restrições à movimentação de capitais, poderá ser uma valência ainda mais importante. A China procura também com esses países ter acordos preferenciais que facilitem a vida aos importadores e exportadores que sejam contraparte das empresas chinesas.

– A CGD vai manter a operação em Zhuhai?

P.C. – Com a entrada do BNU em Hengqin a CGD vai encerrar a sua operação em Zhuhai.

Onde notamos grande diferença – estamos extremamente agradecidos, tanto ao Governo central como ao de Macau – é no regime CEPA, do qual tanto se fala e tão pouco se aproveita.

 

Com a entrada do BNU em Hengqin a CGD vai encerrar a sua operação em Zhuhai.

 

BNU CEO 9 

“Indicadores em Macau extremamente encorajadores”

 

– O Fundo Monetário Internacional prevê 6,5 por cento de crescimento do PIB; aparentemente, Pequim troca reservas em dólares por ativos no exterior… A aposta na economia real muda as perspetivas de negócio?

P.C. – Não tenho totalmente a certeza; essa é uma informação difícil de analisar, até porque há duas interpretações: a que referiu, e outra segundo a qual a China tem vindo a perder reservas por força do esforço de estabilização do renminbi. Dependendo de qual é a razão predominante, as conclusões serão diferentes. De qualquer forma, a China – embora crescendo menos – tem um enorme potencial. Do ponto de vista dos índices de desenvolvimento, como o do rendimento per capita, está ainda a cerca de um terço do patamar inferior dos chamados países desenvolvidos, como Portugal. Só aí se mostra a margem de crescimento. Por outro lado, tem uma estratégia económica muito clara, bem como um plano de internacionalização. Pouco se fala, mas quem cá está observa claramente, que a China começa também a dar cartas em muitas áreas de ponta. O modelo das manufaturas baratas e sem grande sofisticação está completamente ultrapassado e dá lugar à China de vanguarda, que compete com os países mais avançados do mundo nas tecnologias de ponta.

– Essa mudança é decisiva?

P.C. – É um país em transformação e a tentar reequilibrar-se em vários sentidos. A tecnologia é um ponto crucial; outro é passar de um país importador para exportador de capital. Muito em breve haverá mais investimento no exterior do que investimento externo na China. E isso muda completamente o paradigma. A política one belt one road vai precisamente no sentido da internacionalização das empresas chinesas, que estabelecem ligações duradouras com parceiros internacionais, através de um conjunto de infraestruturas que darão à China acessos privilegiados. Depois há todas as questões do dia-a-dia, como a poluição e outras. É um país que está a reequilibrar-se; felizmente, mantendo um ritmo de crescimento muito assinável e afastando todos aqueles fantasmas que lhe vaticinavam um hard landing. Os indicadores económicos e os índices de confiança e de procura na indústria são bastante animadores – melhores do que se esperava.

 

– Ainda há muitas dúvidas…

P.C. – A pergunta de um milhão, neste momento, é o que vai acontecer ao renmimbi. A outra é saber o que a nova administração norte-americana significa em tudo isto.

– Qual é a sua opinião sobre o efeito Trump?

P.C. – Parafraseando pessoas ilustres, totobola só à segunda-feira. Mas vai imperar o bom senso. Só posso acreditar numa estratégia de cooperação e de construção de um melhor futuro em conjunto.

– A resiliência da economia chinesa é uma boa notícia para Macau. E há também sinais de adesão mais consistente à lógica das ligações lusófonas. Este contexto influencia as projeções do BNU?

P.C. – Temos vindo a crescer de forma sustentada, nestes últimos anos, e pensamos continuar nessa senda. Em breve divulgaremos a nossa evolução no ano transato, bastante positiva; e os indicadores em Macau são extremamente encorajadores. Está-se efetivamente a passar para o modelo que todos desejamos, que é ter menos visitantes que não pernoitam e mais daqueles que pernoitam e deixam aqui valor acrescentado. Vê-se um grande número de iniciativas impulsionadas pelo Governo, mas também pelos empresários e pela sociedade civil em geral, no sentido de apostarem em projetos que não têm diretamente a ver com o jogo. Nesse conjunto de projetos está a ligação aos países de expressão portuguesa e, principalmente, a Portugal. Para o BNU, estas duas tendências só podem ser muito positivas.

– O secretário para a Economia a Finanças, Lionel Leong, quer transformar Macau numa plataforma financeira internacional. Esse debate já corre nos bastidores da banca?

P.C. – O BNU está a trabalhar afincadamente em algumas das áreas que têm sido referidas como impulsionadoras do novo desenvolvimento do setor financeiro em Macau. São áreas nas quais também pensamos ter factores diferenciadores e vantagens competitivas. As áreas amplamente referidas são as do leasing e as do health management. Estamos já a trabalhar internamente no sentido de estarmos preparados quando algumas conjugações de fatores se vierem a verificar no sentido um grande impulso nessas áreas aqui em Macau.

– O BNU teve lucros superiores a 260 milhões de patacas (31 milhões de euros) no primeiro semestre de 2016. O ano fechou com a mesma performance?

P.C. – Os nossos principais indicadores serão revelados a 8 de Fevereiro, quando publicarmos os balancetes em Boletim Oficial. Mas não prevemos grandes surpresas.

Paulo Rego

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Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

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