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Esperar a verdade sobre a invasão norte-americana do Panamá

No dia 20 de dezembro de 1989, os Estados Unidos enviaram 30.000 soldados e 300 aviões de combate num ataque militar ao estado soberano do Panamá, ocupando rapidamente o país e derrubando o seu governo militar. Manuel Noriega, líder do governo militar, foi capturado e enviado para os Estados Unidos para ser julgado e condenado. Esta invasão causou um grande número de mortos e feridos entre os soldados e civis do Panamá, tendo também destruído numerosas casas e edifícios.

Passaram-se 26 anos, mas o tempo não conseguiu apagar os danos causados ao povo do Panamá pela invasão militar. Entre incessantes vozes do povo panamense ao longo dos anos, o governo do Panamá criou no dia 20 de julho de 2016 uma comissão independente de investigação para averiguar a verdade relativamente aos mortos e feridos causados pela invasão norte-americana e para oferecer explicações ao povo do país.

Durante um discurso dirigido aos meios de comunicação, a vice-presidente e ministra dos negócios estrangeiros do Panamá, Isabel Saint Malo, admitiu que não houve até hoje um relatório oficial relativamente à invasão norte-americana de 1989. “Sem a verdade, como pode existir uma resolução?”, questionou.

Porque é que o Panamá nunca realizou ao longo destes anos uma investigação sobre o incidente da invasão militar? Nadia Montenegro, Subdiretora Geral de Assuntos Jurídicos e Tratados, referiu que existem razões históricas. A invasão militar norte-americana, denominada “Operação Justa Causa”, pôs fim ao governo de um poderoso líder militar do Panamá, tendo recebido a aceitação do governo posterior. Para além disso, depois da invasão, os Estados Unidos ofereceram ao governo do Panamá 3,5 mil milhões de dólares de ajuda financeira, cuja maioria foi usada para pagar a dívida externa. Os governos posteriores formaram uma relação cada vez mais próxima com Washington, e o lado governamental minimizou a importância desta tragédia sangrenta.

Trinidad Ayola, presidente da Associação de Familiares e Amigos das Vítimas do 20 de Dezembro de 1989, contou que a invasão norte-americana fez com que perdesse o seu marido e destruiu uma família outrora feliz, deixando também efeitos profundos na sua filha jovem. “Nós só queremos saber com clareza quantas mulheres perderam os seus maridos, quantas famílias perderam os seus entes queridos”, afirmou.

“A invasão militar norte-americana causou-nos danos irreparáveis, pode dizer-se que todo o país foi vítima deste incidente, e nós cujas famílias perderam entes queridos somos os que possuem as feridas mais profundas, não há forma de as sarar”, afirmou Ayola.

A Associação de Familiares e Amigos das Vítimas tem ao longo dos últimos 26 anos pedido incessantemente ao governo que realize uma investigação ao incidente, oferecendo assim uma clarificação relativamente aos mortos e feridos.

Depois de muitos anos de tentativas e apelos, os pedidos de investigação finalmente surtiram efeito, e o presidente do Panamá, Juan Carlos Varela, anunciou no dia 20 de dezembro de 2015 a realização de uma investigação da invasão.

A comissão da verdade é constituída por cinco académicos com larga experiência em questões de direitos humanos, tendo como presidente Juan Planells Fernández, reitor da Universidade Santa María La Antigua. Para além disso, a comissão recebeu também o apoio das Nações Unidas. “Queremos averiguar a verdade sobre aqueles que morreram. Quais os números? Onde estão os restos mortais? Isto é para que toda a sociedade possa carregar em conjunto este sofrimento, e para que possamos avançar rumo a uma nova nação com base na união e segurança.”, afirmou Planells.

Segundo Planells, a comissão irá investigar os crimes e violações dos direitos humanos durante a invasão norte-americana, apresentando também sugestões de resolução ao país e prevenindo que situações semelhantes voltem a acontecer. A comissão poderá também solicitar ao governo norte-americano a publicação de documentos classificados, e estaria previsto para 20 de dezembro de 2016 o primeiro relatório de investigação.

Até hoje esse relatório ainda não foi publicado, por razões que ainda não foram divulgadas. Passados 13 meses, poderão os Estados Unidos assumir uma abordagem cooperativa relativamente à investigação? Noriega, preso há mais de 26 anos, é ou não ainda vivo? Ou será que já faleceu há muito? Acredito que estas talvez sejam razões para que os Estados Unidos não revelem a verdade à comissão de investigação do Panamá. O novo presidente Donald Trump fez hoje o juramento de tomada de posse. Irá ele deixar os panamenses folhear as contas antigas da Casa Branca? Os Estados Unidos já realizaram no passado diversas invasões militares a estados soberanos, e em muitas ocasiões não ofereceram explicações à história. Uma vez que nem mesmo o assassinato do presidente Kennedy mereceu explicações, a invasão do Panamá não será com certeza um assunto para levar a sério. É esperar para ver. 

DAVID Chan 

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Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

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