O Governo está a ter uma atitude mais pró-negócios

por Arsenio Reis

Desde o início do mês, várias províncias da China estão autorizadas a reduzir as contribuições para pensões dos trabalhadores. O Governo é visto a apoiar cada vez mais as empresas em tempo de abrandamento, num sinal preocupante para os direitos dos trabalhadores.

Várias cidades e províncias do país estão desde o início deste mês autorizadas a reduzir as contribuições devidas por empresas aos fundos de pensões de 20 por cento para 19 por cento, quando os respectivos fundos tenham uma capacidade de pagamento das prestações sociais assegurada por um mínimo de nove meses. A medida é adoptada por um período de dois anos, e acompanhada de reduções também nas contribuições para subsídios de desemprego (de 2 por cento para até 1 por cento do salário do trabalhador) e da fusão dos subsídios de nascimento com o seguro de saúde, que passam a ser dotados com uma contribuição única.

As medidas foram anunciadas no passado dia 14 de Abril pelo Ministério dos Recursos Humanos e da Segurança Social, com o Governo Central a responder às queixas dos patrões perante o que consideram ser elevados custos de trabalho num período de abrandamento económico. No primeiro trimestre deste ano, o PIB chinês expandiu-se em 6,7 por cento, acima das expectativas, mas também no nível mais baixo de 2009.

As mudanças no regime de contribuições, numa altura em que vários fundos de pensões do país enfrentam dificuldades em cobrir compromissos – em nove províncias, registaram défices no ano passado – e em que o sistema de segurança social continua a não assegurar cobertura a grande parte dos trabalhadores migrantes e das zonas rurais –, são vistas como mais um sinal preocupante pela China Labour Bulletin, organização sedeada em Hong Kong que monitoriza o movimente de trabalhadores do país na defesa dos direitos laborais.

“São tempos preocupantes. As autoridades locais estão preocupadas com o abrandamento económico, e querem assegurar que as comunidades empresariais das respectivas regiões estão protegidas. Infelizmente, isso significa que os direitos dos trabalhadores estão a ser esquecidos”, afirma Geoffrey Crothall, porta-voz da organização.

Guangdong, que desde o ano passado gere os valores gerados em contribuições com aplicações no mercado de obrigações através do Conselho Nacional do Fundo de Segurança Social da China, é uma das províncias onde o nível de pagamentos de patrões para pensões e outras prestações sociais poderá baixar. Isto acontece depois de os valores de salários mínimos nas diferentes cidades de Guangdong terem sido mantido congelados por um período de dois anos, em níveis inferiores a dois mil yuan mensais, nota o responsável da China Labour Bulletin.

 “Há sinais – em Guandong, em particular – de que o Governo está a ter uma atitude mais pró-negócios em termos de políticas e legislação. Decidiram congelar o salário mínimo pelos próximos dois anos. Houve decisões judiciais que tornam mais fácil aos empregadores despedirem os seus trabalhadores.

No início deste mês, o primeiro-ministro Li Keqiang visitou o Ministério dos Recursos Humanos e Segurança Social, participando num simpósio durante o qual afirmou que o Governo deve apoiar “as regiões que enfrentam dificuldades económicas a resolverem os seus problemas e a prevenir o desemprego em larga escala”, segundo noticiou a CCTV. Em Guangdong, o PIB crescia acima da média nacional no primeiro trimestre, a uma taxa de 7,3 por cento.

Apoiantes da medida de reduções atual notam que os pagamentos com contribuições sociais pelas empresas representam 40 por cento dos custos com a mão-de-obra e defendem que diminuição de contribuições é compensada pelo crescimento dos rendimentos dos trabalhadores, que manteve no últimos anos um média de 10 por cento, segundo os dados oficiais. As contribuições dos trabalhadores para subsídio de desemprego também caem de 1 por cento para 0,5 por cento do salário, aumentando marginalmente o rendimento disponível.

Mas, a China Labour Bulletin alerta que, com o período de abrandamento, o nível das prestações está também a descer. “Há pressão sobre o Governo para que reduza as contribuições, mas ao mesmo tempo o valor efetivo total das pensões em muitas províncias da China está a descer. O Governo tem de encontrar meios para, simultaneamente, manter as empresas satisfeitas e manter um nível sustentável de fundos para este tipo de prestações sociais”, diz Crothall.

Por outro lado, o sistema continua a deixar muitos trabalhadores de fora, estimando-se que apenas 16 por cento dos trabalhadores migrantes beneficiem da pensão por aposentação que, em condições normais, é garantida àqueles que tenham um mínimo de 15 anos de contribuições e atinjam os 60 anos, no caso dos homens, ou 50 anos, no caso das mulheres. Para 166 milhões de migrantes que trabalham fora da sua província de origem, apenas 12 por cento das contribuições pagas por empregadores são transferíveis quando estes retornam a casa no momento de reforma. Muitos não chegam a fazer contribuições.

Geoffrey Crothall diz que o principal problema com o atual sistema de segurança social é que a lei não está a ser cumprida. “Aquilo que é óbvio que tem de acontecer é simplesmente que a lei, tal como está, seja respeitada; que cada trabalhador receba a pensão, seguro médico e de habitação, e outras prestações sociais, a que tem direito por lei. É muito simples”, afirma.

Mas a atividade de revindicações laborais, acompanhada de perto pela China Labour Bulletin com relatórios regulares, leva a que a organização acredite que, apesar de alguns recuos e situações de incumprimento, a cobertura dos trabalhadores do país tenha tendência para aumentar.

“Inevitavelmente, a cobertura continuará a aumentar, apesar do abrandamento económico. Mas, claramente, o abrandamento não está a ajudar. A razão para prever que a cobertura aumentará é porque cada vez mais trabalhadores a vão exigir. A mão-de-obra chinesa está a envelhecer, e à medida que envelhecemos prestamos mais atenção à necessidade de ter uma pensão, um seguro de saúde. Há muito maior consciência e necessidade de cobertura de segurança social. Os trabalhadores têm noção do que está na lei e daquilo a que têm direito, e vão exigi-lo cada vez mais”, diz o porta-voz.

Estima-se que mais de 40 por cento do total de 268 milhões de trabalhadores migrantes do país tenham atualmente mais de 40 anos.

Maria Caetano 

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