Quebras das importações chinesas não preocupam Portugal

por Arsenio Reis

As exportações portuguesas para a China caíram 32,7 por cento durante o primeiro trimestre deste ano, período durante o qual o total das compras chinesas ao estrangeiro assistiu a uma quebra de 8,2 por cento. A tendência deverá continuar em Abril, mas para já os exportadores portugueses não mostram sinais de preocupação com o abrandamento do mercado chinês.

Os dados da balança comercial portuguesa, divulgados na última terça-feira, indicam que, depois de Angola, a China foi o mercado com um maior recuo nas vendas das empresas portuguesas. Em Março, as exportações globais portuguesas caíram em 3,9 por cento – uma quebra que se atenua para 1,3 por cento quando excluído o peso dos combustíveis.

As vendas aos mercados fora da União Europeia – lideradas pelos Estados Unidos, Angola e China – recuaram 14,9 por cento, com uma assinalável quebra de 46,4 por cento nas compras angolanas. No mesmo mês, a China importou menos 7 por cento de bens a Portugal.

Já no conjunto dos três primeiros meses do ano, as compras chinesas a Portugal recuaram de um volume total de 205 milhões de euros para 138 milhões de euros, numa quebra de 32,7 por cento.

Sérgio Martins Alves, secretário-geral da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Chinesa (CCILC),  e Fernanda Ilhéu, antiga responsável neste cargo e atual coordenadora da consultora Chinalogus, defendem que a descida assinalável reflete sobretudo um mau momento nas vendas de veículos portugueses – a componente com maior peso nas vendas de Portugal à China, e que resulta da redução da produção da Volkswagen Autoeuropa com destino ao mercado chinês. 

“Naquela que é a nossa base de associados, não temos qualquer eco disso, e naquela que é a nossa interação com os sectores exportadores que mais cresceram nos últimos anos, como o agroalimentar, não temos tido qualquer notícia de que há uma quebra nas importações chinesas”, afirma Sérgio Martins Alves. 

As vendas de automóveis de passageiros e veículos de transporte portugueses ao exterior recuaram em mais de 20 por cento. Mas, Fernanda Ilhéu, destaca crescimentos noutros sectores. 

“O aspecto mais positivo é que as exportações portuguesas de produtos alimentares, de cerveja, de vinho, e também de calçado, confecções e de mármores, tem tido um crescimento razoável. Nalguns produtos, tem crescido até muito. Há aqui alguma indicação de que o peso dos produtos feitos em Portugal está a crescer”, entende a responsável da consultora criada no âmbito do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), em Portugal.

Depois das quebras do comércio chinês durante o primeiro trimestre deste ano, a atividade de Abril manteve-se abaixo das expectativas. Os dados das Alfândegas chinesas relativos ao mês de Abril foram divulgados no último domingo – sem que haja ainda estatísticas portuguesas para o mesmo período – indicando uma quebra de 10,9 por cento nas importações do país ao exterior, e de 1,8 por cento nas exportações. Uma compilação de estimativas de analistas pela Bloomberg antecipava uma estabilização nas exportações da China e uma quebra de apenas 4 por cento nas importações.

A evolução deste quadro comercial, num contexto de desaceleração da economia chinesa que está atualmente a ser mitigada pelo Governo central com medidas de incentivo ao crédito, poderá ser determinante para as operações de uma parte importante das empresas portuguesas, admite a CCILC.

“As nossas empresas estão ainda longe de atingir uma posição e uma quota de mercado na China que seja significativa. No entanto, admito que para algumas delas uma quebra das importações do mercado chinês possa ter já um efeito altamente condicionador das suas operações, e terão uma dificuldade acrescida em encontrar alternativas. Estamos a falar de empresas que já exportam 30 por cento, 40 por cento, 50 por cento da sua produção para o mercado chinês”, afirma o secretário-geral da organização.

A atividade exportadora portuguesa para a China tem assistido a um crescimento das vendas de produtos transformados para o consumo final, mas mantém-se ainda concentrada sobretudo na venda de matérias-primas para transformação, susceptíveis a um abrandamento da atividade industrial num momento em que a China elege o sector de serviços e a componente de consumo como motores prioritários das expansão da atividade económica. 

“Há ainda um peso muito grande de vendas B2B”, admite Fernanda Ilhéu. “Estamos a vender muitos produtos que depois vão ser transformados. Não é o caso dos automóveis, mas é, por exemplo, o dos minérios, mármores, pastas químicas, pastas de madeira, aparelhos de proteção e tensão eléctrica, fios e outros condutores”, elenca.

No entanto, a coordenadora da Chinalogus nota uma evolução positiva nas vendas de produtos finais para consumo, e também uma abordagem ao mercado chinês mais preparada pelos empresários portugueses que poderá devolver resultados positivos. 

“O que há aqui de positivo é que os bens de consumo final também se começam a posicionar na China. Isto é fruto das empresas que têm começado a ter uma estratégia”, entende Fernanda Ilhéu.

A Chinalogus está envolvida no processo, tendo entre as suas atividade a realização de cursos de língua e cultura chinesa para empresários portugueses, bem como a organização de missões de estudo no país. 

“Nos últimos dois, três anos, tenho percebido que há uma maior sistematização na escolha desse país, com a preocupação das empresas conhecerem o mercado e de se prepararem para esse mercado. Ainda não é a maioria das empresas, mas já são muitas empresas médias e grandes, e algumas pequenas, as que começaram a estruturar equipas para abordar o mercado”, afirma Ilhéu.

A CCILC admite também que parte do setor exportador português – o agroalimentar, que apenas recentemente começou a alargar as suas vendas com o desimpedimento de barreiras à comercialização de alguns produtos no ano passado – conseguirá adaptar-se a uma eventual deterioração das condições na China caso haja melhorias no mercado europeu. 

“Se falarmos no setor agroalimentar, que só há pouco tempo descobriu a China, diria que não é ainda muito relevante o número de empresas portuguesas que tem uma larga dependência desse mercado. Estas empresas viviam até há pouco tempo sem a China, sem Angola, e à medida que o mercado europeu possa recuperar elas poderão ter aí alguma alternativa. Se não, a quebra da China pode eventualmente causar aqui novamente um défice de liquidez e uma estagnação naquele que era um processo de internacionalização que estava a ser sobretudo catalisado pelos mercados emergentes, e em particular pela China”, afirma Sérgio Martins Alves.

Maria Caetano

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