A nova economia de Jack Ma

por Arsenio Reis

 

A partir de Hangzhou, o grupo Alibaba quer conquistar consumidores internacionais e desenvolver novos serviços financeiros.

Em Março, pouco depois das principais reuniões políticas do país, em Pequim, e do encontro anual do Fórum Boao, a comunicação institucional do Governo Central fazia as contas ao número de vezes que o primeiro-ministro Li Keqiang empregava a expressão “nova economia”: seis, no encontro asiático de Hainão. 

O conceito alberga desde a automação industrial ao comércio electrónico, passando por serviços de cloud, e também aloja a ideia de que a China está no caminho para transformar um crescimento que era até aqui apoiado por investimento em infraestruturas e exportações de manufactura num modelo de expansão predominantemente suportado pela procura interna e pela atividade do sector dos serviços. 

Em Hangzhou, a duas horas e meia de uma viagem de carro a partir de Xangai, está um dos exemplos mais conseguidos do que se pretende para esta nova economia. 

A cidade acolhe a primeira zona-piloto de comércio electrónico transfronteiriço do país, que tem entre as principais atrações o campus do grupo Alibaba – a empresa privada fundada por Jack Ma em 1999 que tem o maior volume de vendas online do mundo, cujas ações estão cotadas no mercado de Nova Iorque, e que atualmente persegue um roteiro de investimentos globais e de diversificação de negócios assentes na inovação.

Mais de nove mil funcionários ocupam um complexo de edifícios modernos entre os quais serpenteia um pequeno canal. A cor laranja, imagem do grupo, enche canteiros de flores e marca toda a sinalética do lugar, percorrido por bicicletas da mesma cor, por vezes segways, em que se fazem transportar os trabalhadores cerca da hora de almoço.

Há cantinas e cafés para todos os gostos, esplanadas em que as mesas são cobertas por canópias em forma de gaiola. O elevador que conduz ao sétimo andar de um dos edifícios do complexo, uma sala de conferências para a imprensa e outros visitantes, vai parando em alguns pisos e deixando entrever mesas de matraquilhos à entrada de uma unidade de desenvolvimento de infraestruturas. Enquanto isso, os slogans da empresa adaptam motes da propaganda central: se há um sonho chinês, em Hangzhou ele é uma realidade navegável, ou que se alcança eventualmente por barco (“sailing for the dream” é o tema que inspira diariamente os funcionários do Alibaba).

As visitas para quem vem de fora são circunscritas a poucas áreas do campus. A comunicação do grupo investe ante os maiores esforços num enorme painel electrónico que pretende representar em tempo real a origem, o destino e o número dos principais fluxos de transações operadas através das plataformas geridas pelo gigante de comércio electrónico – cada vez mais envolvido noutras áreas de negócios. O Alibaba descreve-se como um negócio de gestão de um ecossistema de dados e põe à frente de quem o visita não um mapa da China, mas um mapa mundial.

Se as receitas internacionais do grupo são atualmente insignificantes, de futuro o Alibaba pretende que representem 50 por cento da atividade, em pé de igualdade com o mercado doméstico. E não apenas na área do comércio electrónico, à medida que a empresa de Jack Ma investe nas áreas da saúde, media (com a compra do jornal South China Morning Post e proposta de entrada no capital da revista económica Caixin), servidores e espaço de armazenamento para alugar a empresas, e num negócio de financiamento alternativo – ou microcrédito – que tem por trás aquela que se acredita poder ser a mais valiosa companhia de crédito online do mundo: a Ant Financial Services, que opera o serviço Alipay.

O sistema Alipay, criado em 2004 com o estabelecimento do site de vendas Taobao, é detido pela Ant Financial sob gestão independente, mas controlo direto de Ma. O ecrã de dados do grupo em Hangzhou indica que, no ano passado, 29 mil milhões de operações foram feitas através deste sistema, o maior de pagamentos electrónicos no país com 800 milhões de utilizadores registados – 300 milhões dos quais ativos.

O Alipay pode já ser utilizado em Hong Kong e Macau e nalgumas zonas de duty-free da Coreia do Sul, mas o grupo de Jack Ma pretende que o serviço seja internacionalizado e abranja todo o tipo de pagamentos. A mesma plataforma está a ser utilizada para a concessão de crédito a pequenas e média empresas que operam nas plataformas de comércio do Alibaba – AliExpress, 1688.com, Taobao, Tmall.com e Juhuasuan.com. Através da Ant Financial, o grupo criou também já o seu primeiro banco digital, o MyBank, com serviços limitados devido à regulação financeira restrita do país e a rivalizar com o WeBank criado pelo Tencent, principal concorrente do Alibaba.

Com um sector financeiro fortemente concentrado nos bancos estatais, e onde as pequenas e médias empresas vivem dificuldades em obter crédito, o financiamento informal, enquadrado na chamada banca clandestina, tem sido um dos grandes sectores de crescimento – e também de forte desregulação. 

A consultora iResearch, com sede em Xangai, estima que no ano passado a atividade de crédito das plataformas P2P no país tenha crescido 230,2 por cento, com um volume total de 830 mil milhões de yuan em empréstimos, e projeta que o volume de empréstimos alcance os 3,5 biliões de yuan em 2019.

Mas centenas de negócios P2P têm também enfrentado a insolvência, encerrado ou sido sujeitos a investigação, com a Comissão Reguladora dos Bancos Chineses a intervir desde Dezembro para limitar a ação destas plataformas. Estão proibidas de tomar depósitos e obrigadas a maior transparência, ao mesmo tempo que novas empresas não poderão ser registadas comercialmente quando indiquem no nome que oferecem serviços financeiros ou P2P. Os analistas estimam que as novas restrições beneficiem empresas como a Alibaba e a Tencent, com operações já autorizadas.

A área de comércio electrónico do grupo de Hangzhou deverá continuar a crescer, mas não sem desafios também, com a imposição desde Abril deste ano de novos impostos sobre o valor acrescentado e consumo na importação de produtos adquiridos online para o interior da China. A taxa é de 17 por cento e ficam isentas de imposto as compras até dois mil yuan. 

O grupo de Jack Ma deverá dar na próxima semana conta do impacto esperado para as operações, quando anunciar os resultados do último ano financeiro. A Moody’s estima que o Alibaba tenha realizado ganhos antes de impostos, juros e pagamento de dívida superiores a 42 mil milhões de yuan, projetados para crescerem entre 20 por cento a 25 por cento no atual ano.  

 

Maria Caetano 

 

 

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