PORTUGUESES SUPERVISIONAM OBRAS EM OECUSSI

por Arsenio Reis

 

Cerca de 90% dos grandes projetos públicos de construção em Timor-Leste têm sido adjudicados a empresas chinesas, segundo o ministro das Obras Públicas do país, Gastão Francisco de Sousa. Em entrevista ao Plataforma Macau, o responsável timorense, que esteve na RAEM para participar no 2.º Congresso de Engenheiros de Língua Portuguesa, realçou que há também um crescente “interesse do setor empresarial português em participar no desenvolvimento do país”. De acordo o ministro, a empresa portuguesa Tecproeng e a Dalan, uma sociedade luso-timorense, vão assinar com o Governo um acordo para a supervisão de três obras na Zona Especial de Economia Social de Mercado de Timor-Leste (ZEESM) no enclave de Oecusse. No que diz respeito à recente polémica causada pela expulsão dos magistrados portugueses de Timor, a cooperação entre os países na “área das infraestruturas não foi afetada”.

 

PLATAFORMA MACAU – A China recebeu a candidatura de 50 projetos de países lusófonos para financiamento ao abrigo do Fundo de Cooperação para o Desenvolvimento entre a RPC e os países de língua portuguesa, dos quais dez já receberam luz verde. Timor está nesta lista?

GASTÃO FRANCISCO DE SOUSA –  Antes de vir a Macau passei por Pequim, onde tive um encontro com o Banco Exim da China (Export-Import Bank of China). Falou-se desse fundo e, infelizmente, ainda não houve nenhuma colocação do setor privado de Timor-Leste nesse fundo. O nosso setor privado deveria ser mais ativo para poder ter acesso ao fundo. Durante a reunião com o vice-presidente do Banco Exim fiz saber que, no regresso, vou falar com os empresários com maior qualificação técnico-financeira e com a secretaria de Estado do setor privado para ver como podemos facilitar o acesso desse fundo ao setor privado. Penso que é muito importante para o desenvolvimento do país.

 

P.M. – Como está a evoluir o investimento chinês em Timor-Leste na área da construção?

G.F.S. – Atualmente, os grandes projetos do Governo estão a ser implementados por empresas chinesas. Nos concursos públicos, quem tem a melhor qualificação técnica e apresenta a melhor proposta financeira é quem ganha a adjudicação. Têm sido as empresas chinesas. Mas, ultimamente também as empresas portuguesas estão nesse caminho.

 

P.M. – A nível percentual, quantos projetos públicos estão neste momento nas mãos de empresas chinesas? 

G.F.S. – Se formos ver os grandes projetos – atualmente a prioridade do Governo é nas infraestruturas básicas, portanto a reabilitação das estradas – a maioria tem sido adjudicada a empresas chinesas. Posso dizer que à volta de 90% foi adjudicado a empresas chinesas e estes projetos são financiados através do Banco Mundial e do Banco Asiático de Desenvolvimento e também pelo Governo japonês. Na minha viagem a Pequim, assinei um contrato com uma empresa chinesa – a China Shandong International – no valor de cerca de 70 milhões de dólares. É um número pequeno em relação aos outros países.

 

P.M. – E que objetivo tem esse acordo?

G.F.S. – A China Shandong International vai implementar a drenagem próxima de Díli. Durante a época de chuva existem muitas inundações, ainda temos esse problema.

 

P.M. – Em relação à criação da Zona Especial de Economia Social de Mercado de Timor-Leste (ZEESM) no enclave de Oecusse. Os chineses demonstraram interesse em comprar o projeto. Alguma novidade nesse sentido?

G.F.S. – Por parte do Ministério das Obras Públicas, temos quatro grandes projetos em curso, que já foram adjudicados e cujos contratos já foram assinados: um projeto de construção da central elétrica de 17 mega watts, que foi adjucicado à empresa finlandesa Wärtsilä e outros três projetos – a construção de uma ponte de 360 metros e dois troços de estrada com um comprimento respetivamente de vinte e tal quilómetros – foram adjudicados a empresas indonésias.

Foi um concurso restrito em que convidámos também empresas chinesas, mas não conseguiram passar. Em conjunto com o Dr. Mari Alkatiri decidimos ainda que a supervisão destas obras fosse feita por empresas portuguesas [A Dalan para supervisão do projeto das estradas e Tecproeng para a ponte] e espero assinar o contrato no regresso para a implementação desses projetos.

Há outros projetos, como um hotel, e se não me engano o contrato já foi assinado e é uma empresa de Singapura que vai implementar. Existem outros projetos, mas que não são da minha tutela.

 

P.M. – Como vê o futuro de Oecusse?

G.F.S. – Tudo dependerá da implementação dos projetos das infraestruturas básicas. Desde que haja boas infraestruturas e esteja tudo pronto – estradas, eletricidade, telecomunicações, água e um aeroporto que também está em fase de concurso público e esperamos que em dezembro possamos já assinar contrato – há um grande interesse por parte dos investidores internacionais para poderem investir nessa área.

 

P.M. – Quando esteve em setembro em Portugal falou na necessidade de encorajar o investimento em Timor-Leste. Como está de saúde o investimento português no país?

G.F.S. – Há muito interesse do setor empresarial português em participar no desenvolvimento e posso dizer que temos agora a presença dos empresários portugueses na área das obras públicas, como na área da água e do saneamento. Temos a Águas de Portugal, que está a fazer o desenho detalhado para a implementação do tal projeto que mencionei e temos também uma empresa portuguesa  que está a fazer o plano espacial de Timor-Leste e a elaborar duas legislações na área da habitação e da urbanização, além das empresas envolvidas na supervisão dos projetos das estradas e pontes em Oecussi.

 

P.M. – A recente polémica entre os dois países [expulsão de magistrados portugueses de Timor-Leste] veio afetar a cooperação entre os Governos nesta área?

G.F.S. – Não, estamos num bom caminho e também estamos a implementar o protocolo de entendimento que assinei no mês de fevereiro com o Ministro do Meio Ambiente, especialmente na área da água e saneamento para a capacitação dos nossos funcionários públicos. A área das infraestruturas não foi afetada.

 

GOVERNO TIMORENSE CRIA FUNDO PARA APOIAR EMPRESAS NACIONAIS

P.M. – Veio a Macau para participar no Congresso de Engenharia dos Países de Língua Portuguesa. Que balanço faz desta reunião?

G.F.S. – O congresso é uma boa oportunidade para partilhar experiências e explorar oportunidades de cooperação, especialmente entre os membros das nações da CPLP. A participação da Associação de Engenheiros de Timor-Leste deveria ser mais ativa. Infelizmente ainda não vi nenhum elemento da associação, mas espero que no futuro possam também participar ativamente em encontros deste género.

Atribuo grande importância a este tipo de reuniões e, por isso, aceitei o convite para vir cá, para podermos trocar impressões e ver oportunidades em como as associações e os engenheiros dos outros países podem ajudar Timor-Leste na área da capacitação, da supervisão dos projetos, visto que o país, apenas com 12 anos de independência, precisa de muita ajuda de outros países, especialmente das nações da CPLP e das suas associações dos engenheiros. Farei chegar essa minha preocupação à Associação dos Engenheiros de Timor-Leste, que tem de participar mais ativamente, senão vamos ficar para atrás.

 

P.M. – Timor-Leste tem falta de engenheiros?

G.F.S. – Com certeza. Fico muito contente quando percebo que há timorenses que vão estudar para o estrangeiro, principalmente em áreas técnicas, como a civil, mecânica, eletrotécnica ou geologia. De momento há muita vontade por parte dos timorenses em estudar a área da geologia e do petróleo, visto que temos uma reserva – não assim tão grande mas com a qual podemos contar para o desenvolvimento futuro do país.

 

P.M. – E existem problemas ao nível do reconhecimento das qualificações dos engenheiros timorenses?

G.F.S. – Sim, há problemas com as qualificações dos nossos técnicos, especialmente os que tiveram uma formação na Indonésia. Não estou a dizer que não têm formação técnica qualificada, alguns sim. E, por isso, estou sempre a encorajar os jovens e mesmo os funcionários públicos do ministério a estudar mais e a fazer uma pós-graduação para poderem regressar e ajudar o Governo no desenvolvimento do país. É muito importante a capacitação dos nossos técnicos, como também dos jovens que estão a estudar nas escolas secundárias e universidades.

 

P.M. – Grande parte dos empresários em Timor está ligado à área da construção e muitos queixam-se da dificuldades em obter financiamento junto das instituições bancárias do país. O que é que pode ser feito para contornar esta limitação?

G.F.S. – Em Timor-Leste, temos um grande número de empresas, mas a sua capacitação técnico-financeira é muito baixa. O setor privado está muito dependente dos projetos públicos do Governo. Penso que deveriam diversificar o negócio que têm, não pensar apenas nos projetos públicos, mas sim na forma como criar empregos, negócios em diferentes áreas como a hotelaria para poderem também absorver mão de obra e diminuir o desemprego que é elevado.

Em relação à qualificação dos técnicos dessas empresas, posso dizer-lhe que é mínima, por isso a formação dos timorenses nas áreas técnicas é muito importante. De momento, temos um número significante de empresas, mas com qualificações muito baixas e, por isso, este ano o Governo concedeu um montante de dez milhões de dólares a um banco comercial de Timor Leste para dar acesso ao empréstimo aos empresários que querem implementar projetos do Governo.

 

P.M. – Qual o valor dos empréstimos concedidos?

G.F.S. – Não conheço o número exato, mas já há muitos interessados. Isto é responsabilidade da Secretaria de Estado para o Apoio e Promoção do Setor Privado, que faz a gestão desse dinheiro.

 

Catarina Domingues 

 

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