FRONTEIRAS ABERTAS COM VISTA PARA A ECONOMIA

por Arsenio Reis

 

O alargamento dos horários das fronteiras de Macau com a China, anunciado na última semana, poderá ter melhorias significativas, a nível de receitas de casinos e de arrefecimento nos preços do imobiliário.

 

O alargamento dos horários das fronteiras com o continente, anunciado na última semana, pelo governo de Macau, poderá trazer benefícios para a economia local e “ajudar a população”, nomeadamente na descida do preços do imobiliário, atualmente  a níveis estratoesféricos.

Em conferência de imprensa, Alexis Tam, porta-voz do governo explicou que os novos horários entram em funcionamento a 18 de dezembro, e que na fronteira das Portas do Cerco, onde diariamente passam cerca de 300.000 pessoas, o horário será alargado em duas horas, passando a funcionar entre as 06:00 e a 01:00 do dia seguinte, ou seja, abre uma hora mais cedo e fecha uma hora mais tarde.

O mesmo responsável disse ainda que o objetivo de Macau para o futuro será a abertura de todos os postos fronteiriços 24 horas por dia, mas esse objetivo será faseado, como estabelece o acordo quadro de cooperação assinado com a província de Guangdong, adjacente ao território.

Já no Parque Industrial Transfronteiriço, com fronteira aberta 24 horas exclusivamente para os trabalhadores do parque, entre as 00:00 e as 07:00 passará a ser possível aos residentes de Macau, estudantes e Trabalhadores Não Residentes oriundos da China continental atravessar aquele posto fronteiriço.

Nos aterros entre as ilhas da Taipa e de Coloane, a fronteira da Ponte Flor de Lótus passa a estar aberta 24 horas para residentes e turistas embora fechada para mercadorias.

Alexis Tam explicou ser esta uma “aspiração do Governo de Macau e da população” que, tendo outras oportunidades, até na habitação, na China continental, “será beneficiada com o alargamento do horário da fronteira” e admitiu a possibilidade da medida influenciar os preços da habitação em Macau que, tendo uma economia próspera, tem preços elevados.

Por parte das autoridades de Macau haverá o reforço de mais canais eletrónicos e de controlo por pessoal de fronteira nos postos abrangidos neste plano e o reforço com mais 70 agentes para se poder cumprir com as necessidades previstas.

Ao mesmo tempo, será ainda reforçado o sistema de transportes públicos adequando-o ao novo horário.

 

CASINOS ANSIOSOS

Em outubro, os casinos de macau regsistaram uma queda de 23% nas suas receitas, o quinto declínio consecutivo nos lucros durante 2014, após dois anos de impressionante crescimento.

Mais afetado pela campanha anti-corrupção, o setor VIP contribuiu com “apenas” 56% das receitas, a mais baixa média desde sempre. A agência Fitch Ratings previu para 2015 uma contração de 1%, devido ao “persistente enfraquecimento do setor VIP”. Na apresentação e votação da proposta de Orçamento para 2015, o Secretário para a Economia e Finanças, Francis Tam, afirmou que no cálculo das receitas da Administração foi adotada uma postura conservadora em relação à verba a arrecadar com os impostos diretos cobrados ao setor do jogo.

“Em termos reais irá registar-se um decréscimo significativo de 30 mil milhões de patacas para 27,5 mil milhões de patacas (de três mil milhões de euros para 3,3 mil milhões de dólares)”, disse Francis Tam, numa previsão da média mensal das receitas de jogo.

“Acreditamos que será positivo em termos de número de horas diante de uma mesa de jogo pelos turistas de um só dia, e terá um potencial para os operadores de casinos”, escreveram analistas do Barclays, citados pela CNBC.

Os mesmos analistas consideram que “as mudanças na fronteira de Henqing [ilha da Montanha, que  passará a funcionar 24 horas por dia] terão um limitado impacto no médio prazo mas tornar-se-ão positivas a longo termo, quando estiverem finalizados os projetos de desenvolvimento, com um potencial de atração de mais residentes e visitantes para aquela área.

Por outro lado, o Citi interpreta esta decisão como uma prenda oferecida a Macau pelo Presidente chinês Xi Jinping, nas vésperas da sua visita à RAEM, por ocasião da comemoração do 15º aniversário do seu regresso à Pátria.

O banco recorda que a província de Cantão fornece 40% de todos os chineses do continente que visitam Macau, ficando assim garantidas mais oportunidades de eles passarem mais tempo nas mesas de jogo da RAEM.

 

REPERCUSSÃO NO IMOBILIÁRIO

O alargamento dos horários pode ter efeitos de arrefecimento nos preços de casas em Macau, cuja média entre janeiro e julho cresceu para 100,867 patacas por metro quadrado, num aumento homólogo de 22%.

Nos próximos três anos, Macau vai abrir 17 mil novos quartos de hotel, mas apenas está prevista a construção de quatro mil casas a preços acessíveis para a população. “Pensamos que a progressiva extensão das horas de funcionamento das fronteiras possa aliviar a escassez de casas em Macau e os problemas relacionados com a inflação nos seus preços, uma vez que os trabalhadores podem decidir residir na China e atravessar a fronteira para trabalharem em Macau”, refere a mesma nota, citada pela CNBC.

Agências imobiliárias contactadas pelo Plataforma Macau, acreditam que a abertura das fronteiras por mais tempo vai ter um impacto benéfico não só em Macau, como também em Zhuhai.

“Nos últimos anos, tem havido falta de terrenos para um maior desenvolvimento de Macau, portanto, com estas medidas Macau poderá ganhar mais terrenos para desenvolvimento nos próximos anos. Na perspetiva de Zhuhai, da ilha da Montanha, penso que nós poderemos contribuir para o desenvolvimento destas áreas. Temos o capital e as pessoas, portanto, julgo que esta é uma situação com benefícios mútuos”, disse ao Plataforma Macau Jeff Wong Chi Wai, diretor da agência Jones Lang LaSalle em Macau.

O responsável disse prever que algumas pessoas que residem atualmente em Macau se mudem para a ilha da Montanha, mas não numa base considerável. “Haverá, certamente, algumas pessoas a mudarem-se para lá. É muito difícil fazer previsões quanto ao número de pessoas que se poderá mudar, mas funcionários do Governo na ilha da Montanha preveem que cerca de um terço da população da região em 2020 seja de Macau”.

Jeff Wong Chi Wai considerou que, especialmente, a mão-de-obra importada, que arrenda casa em Macau, irá mudar-se para a ilha da Montanha, passando a arrendar aí casa, num movimento que poderá arrastar alguns residentes de Macau, que compraram ou vão comprar casa do outro lado da fronteira, com preços mais atrativos.

“Prevejo que a taxa de crescimento dos preços do imobiliário em Macau vai abrandar porque haverá mais oferta na ilha da Montanha. Dado que o número de pessoas que virão trabalhar para Macau vai aumentar dramaticamente nos próximos anos, devido aos novos projetos no Cotai, considero que estas medidas são uma boa solução para alojar a nova mão-de-obra importada. Diria então que estas medidas vão ter efeitos sobre o mercado imobiliário de Macau, mas julgo que passarão apenas por um abrandamento da taxa de crescimento dos preços e não por uma queda significativa dos preços, especialmente do arrendamento”.

 

CORREÇÕES NOS PREÇOS

O responsável pela agência Jones Lang LaSalle prevê que esta medida, a curto prazo, introduza correções, “de, talvez, 5% ou até 10% no caso de algumas propriedades”. Mas, a longo prazo, disse, “continuará a verificar-se um aumento, mas não tão dramático como o dos últimos três anos, em que se registou um aumento de 20 ou 30% ao ano e os preços duplicaram”. E acrescentou: “Este tipo de situação julgo que não se vai verificar novamente no futuro. Prevejo, assim, que a taxa de crescimento será mais sustentável, na ordem dos 5 a 10%.

O diretor da empresa recordou que, na ilha da Montanha, os preços quase duplicaram nos últimos dois anos, estão hoje na ordem dos 3000 a 4000 dólares de Hong Kong por pé quadrado, ainda assim cerca de metade do que se verifica em Macau.

“Acho que os residentes de Macau vão começar a mudar-se mais para a ilha da Montanha numa fase posterior, depois de as infraestruturas serem concluídas do outro lado da fronteira, talvez dentro de três a cinco anos. Mas a curto prazo, não acho que muitos residentes de Macau se irão mudar para a ilha da Montanha ou para Zhuhai. Na ilha da Montanha ainda há muitas obras e em Zhuhai ainda há um fosso em relação a Macau sobre as expetativas dos residentes quanto às infraestruturas, porque o preço não é o único fator que é considerado na hora de mudar”.

 

ZHUHAI BENEFICIA

Também o diretor executivo da agência imobiliária Midland Realty, Ronald Cheung, acredita que o alargamento dos horários da fronteira vai beneficiar o setor na vizinha cidade de Zhuhai.

“Considero que estas medidas vão ter um impacto positivo sobre o mercado residencial de Zhuhai, especialmente nas áreas junto à fronteira, que ficam a 15 minutos a pé da fronteira. Serão as primeiras beneficiadas, em termos de arrendamento e compra de casa, porque residentes de Macau vão mudar-se para lá e comprar aí casa. Julgo que os preços vão aumentar aí cerca de 10%.”, previu.

“A maior parte das pessoas que arrendam casa em Macau são pessoas que trabalham em Macau e muitas destas pessoas vão mudar-se para Zhuhai”, sustentou Ronald Cheung.

A opinião de que as rendas irão agravar-se nas áreas de Zhuhai mais próximas de Macau é partilhada por Jeff Wong Chi Wai.  “Uma porção significativa da mão-de-obra chinesa importada por Macau tem ido viver para Zhuhai, especialmente na área junto à fronteira. Por isso, quando a fronteira abre de manhã verificam-se enormes filas de espera, de mais de uma hora, para se entrar em Macau. Isto vai continuar a acontecer, porque Macau vai também importar mais mão-de-obra. E perante esta dinâmica de procura, oferta, os preços do imobiliário em Zhuhai vão continuar a aumentar”, disse.

“O importante é então expandir a oferta. Quero dizer com isto que hoje as pessoas estão concentradas na área da fronteira, mas Zhuhai é muito grande e as pessoas poderão futuramente mudar-se para outras áreas da cidade. Isso irá levar tempo, mas vai acontecer, porque já vive muita gente junto à fronteira e as rendas estão aí a aumentar significativamente, portanto, haverá incentivos económicos para as pessoas se mudarem para outras áreas de Zhuhai. Neste sentido, Zhuhai irá beneficiar das medidas anunciadas”, acrescentou Jeff Wong Chi Wai.

 

PREÇOS EM MACAU “MANTÊM-SE”

 

Mas para quem pensa que um maior aumento de preços em Zhuhai arrastará uma descida de valores no imobiliário de Macau, os agentes imobiliários têm uma má notícia. “Esta situação não significa que os preços em Macau vão cair, porque em Macau a maior parte das pessoas tem dinheiro, pode pagar, portanto, julgo que futuramente os preços vão manter-se”, disse Cheung.

Este responsável, que considerou que “a maior parte das pessoas em Macau tem casa própria e apenas menos de 10% arrenda”, associou a alta de preços ao até agora bom desempenho do setor do jogo. “Se a indústria de jogo não estiver bem, os preços não vão aumentar. Apesar de nos últimos dez anos, as pessoas terem enriquecido muito e terem capacidade de compra, penso que os preços não vão subir, vão manter-se estáveis, no mesmo nível dos do ano passado, porque há mais oferta, podem comprar casa em Macau, em Zhuhai e na ilha da Montanha”, disse Ronald Cheung.

“As diferenças de preços na região vão atenuar-se, os preços  tenderão a aproximar-se, porque as fronteiras vão abrir 24 horas no futuro e os carros de Macau vão poder entrar na ilha da Montanha. Nesse sentido, os preços na ilha da Montanha tenderão a aproximar-se dos de Macau, têm, assim, potencial para voltar a aumentar”.

 

Luis Andrade de Sá e Patrícia Neves

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