PORTUGAL POUCO CONHECIDO NA CHINA

por Arsenio Reis

 

Apesar de 500 anos de relações e de o investimento chinês se multiplicar em terras lusas, Portugal é ainda um país sobre o qual os chineses pouco sabem. Os empresários portugueses queixam-se de dificuldades na afirmação dos seus produtos e concretização de negócios da China e importadores chineses apontam o dedo à fraca promoção da marca Portugal.

 

Shenzhen, cidade da província de Guangdong, adjacente a Hong Kong, que foi a primeira Zona Económica Especial da China e tem hoje um dos PIB per capita mais elevados do país e a mesma população que Portugal inteiro – cerca de 10,6 milhões de residentes permanentes – foi esta semana palco de uma ação de charme de produtos portugueses.

A iniciativa, organizada pela Associação de Jovens Empresários Portugal-China (AJEPC), pela importadora e distribuidora de vinhos Chateau Mary, originária da região francesa de Bordeaux, e pela empresa de logística DCH, apresentou a empresários chineses 75 marcas de vinho português e cerca de 200 produtos entre enlatados, queijos e azeites, além dos néctares, produzidos de norte a sul de Portugal.

O dono de uma empresa de importação e distribuição, sediada em Shenzhen, que não se quis identificar, trocava impressões com um produtor português enquanto saboreava vinhos lusos. “Foi a primeira vez que provei vinho português, acho que é muito bom”, disse ao Plataforma Macau. O empresário vende atualmente sobretudo vinho francês, “o mais famoso na China”, mas está agora interessado “em começar a vender produtos portugueses”. “Penso que se adaptam ao gosto chinês”, sublinhou.

Ao apontar que os “chineses ainda não conhecem bem os vinhos portugueses”, este empresário considera que isso se deve ao facto de “talvez não serem muito promovidos”.

Timothy Lam foi desafiado por um amigo a acompanhá-lo na prova de produtos portugueses. Com um copo de branco na mão e pão e queijo noutra, Timothy recordou que foi numa visita a Macau que descobriu o vinho português. “Bebo desde então vinho do Porto regularmente e desta vez provei o queijo e gostei muito”.

O vinho francês é famoso na China “por causa da publicidade”, salientou ao constatar que a promoção lusa em Shenzhen “foi a primeira” de que teve conhecimento.

Richard Han, jornalista do Shenzhen Daily, que fazia a cobertura da ação promocional, “nunca tinha experimentado vinho português nem tinha ouvido falar dele”. Ao considerar que, na China, “quando se fala de Macau pensa-se em Portugal”, o jornalista reparou, no entanto, que os produtos lusos são ainda pouco reconhecidos. “O mercado chinês é muito grande, mas não tem muitos produtos portugueses. É preciso uma maior promoção”, defendeu, sublinhando que “os produtos importados são hoje muito populares na China”.

Atenta ao sabor do vinho português, Rita Chan, detentora da importadora Shenzhen Enjoy, que vende diretamente a famílias chinesas com posses e empresas, procura novos néctares para o seu catálogo. “O vinho do Porto até é conhecido, mas outros nem por isso”. A empresária participa regularmente em grandes exposições chinesas de vinho, mas lamenta o facto de raramente encontrar aí vinhos portugueses.

 

ESPAÇO PARA NOVOS SABORES

A Chateau Mary distribuía exclusivamente vinhos franceses na China até ao ano passado, mas o aumento do consumo e a curiosidade do mercado por novos sabores levou a empresa a alargar o negócio. Os vinhos portugueses são a sua mais recente aposta, tendo iniciado a comercialização esta semana, em Shenzhen.

“O vinho francês era como uma lenda na China, mas com a abertura das fronteiras, as pessoas começaram a experimentar outras marcas”, disse ao Plataforma Macau a diretora de operações, Meko Tam.

Ao constatar que “tal como na Europa há cada vez mais lojas de chá, na Ásia há cada vez mais lojas de vinho”. “Os chineses estão muito abertos a produtos novos e esta é uma boa oportunidade” para os vinhos portugueses, apontou.

Portugal é o sexto produtor de vinhos em que a Chateau Mary aposta na China, ao fim de oito anos de presença no mercado.

Ao salientar que Portugal “é um dos mais antigos produtores de vinho do mundo”, Meko Tam realça, porém, que a cultura lusa “é ainda algo de muito novo para os chineses”. “A marca Portugal está ainda a ser construída na China, mas à medida que conhecerem melhor o país, vão querer comprar mais os seus produtos”, defendeu a responsável.

Os licores portugueses despertaram maior interesse na prova em Shenzhen e Meko Tam adiantou que a Chateau Mary vai começar a vender os néctares lusos no sul da China, em Xangai e Pequim.

A organização da Interwine, a maior feira chinesa de vinhos importados, em Cantão, reuniu esta semana cerca de 20 importadores e distribuidores chineses em Shenzhen, também num evento para promover os contactos com produtores portugueses. Rita Jia, da organização do certame, acredita que, se for feito um esforço de promoção, os vinhos portugueses “certamente se tornarão famosos nos cinco anos seguintes”.

“Há agora oportunidades para o vinho português na China, porque o consumidor sabe que não são só os franceses que produzem bom vinho”, assinalou. O vinho do Porto, repara, é, de facto, o mais popular “e adapta-se muito bem à comida chinesa”, mas há oportunidades para outros, especialmente no sul da China. “É aqui que se conhece melhor o vinho português, por causa da proximidade de Macau, e também é aqui que se consome mais vinho por as pessoas estarem mais familiarizadas com a cultura ocidental”, sustentou.

 

VENDAS AINDA TÍMIDAS

A Ushopin, desde 2012 na zona de comércio livre de Zhuhai, vende há 15 meses cerca de 40 marcas de vinho português, na sequência de um acordo estabelecido com a AJEPC, e encomendou recentemente um primeiro contentor de azeite, tendo ainda em vista a importação de outros produtos portugueses, como enlatados.

As vantagens desta zona de comércio livre, explicou o presidente da AJECP, Alberto Carvalho Neto, passam pelo facto de o imposto, que, no caso dos vinhos portugueses, ascende a 48,5%, ser pago só depois da venda, o que estimula as encomendas.

Em Jiangmen, também na província de Guangdong, a DCH gere um centro de exposição de produtos de língua portuguesa, também na sequência de um acordo com a AJEPC e com a Associação de Exportadores e Importadores de Macau. A empresa de logística começou a encomendar produtos portugueses, como azeite, vinho, bolachas e chocolates, há cerca de três meses, que distribui por supermercados da região. “As primeiras encomendas foram muito reduzidas, mas a ideia é que as próximas cheguem também a Xangai”, disse Alberto Neto.

Na sequência da cooperação com a DCH e com a Chateau Mary, a AJEPC assinou esta semana um acordo em Shenzhen para vir a ter também um espaço de exposição permanente de produtos portugueses na World Food City, que será a primeira plataforma comercial da China para a distribuição de produtos alimentares de todo o mundo, com 550 mil metros quadrados e abertura prevista para 2015.

 

MAIS AÇÃO DO GOVERNO

À semelhança dos empresários chineses, os produtores portugueses também consideram que, para aumentar as exportações para a China, é necessário dar a conhecer melhor Portugal. “No mercado chinês quem não aparece, esquece-se”, salienta Alberto Neto, apontando que existe um problema de “falta de coordenação das entidades que trabalham a promoção do país”.

A elevada carga fiscal sobre os vinhos portugueses, por exemplo, quando os chilenos estão isentos, e os embargos a produtos como carne de porco, laticínios e fruta são outros entraves à afirmação dos produtos lusos na segunda economia mundial. “Hoje com a posição que Portugal tem ao nível do investimento chinês (…), o Governo devia aproximar-se muito mais do chinês e tentar desbloquear estas situações e promover condições especiais para o país”, defendeu, ressalvando, porém, que questões como a carga fiscal requerem negociações a nível europeu.

O grupo Nogueira, do distrito de Viseu, que vende fruta, charcutaria e tem um espaço de agroturismo com vinhos, já exporta para mercados europeus e africanos e quer agora chegar à China. João Nogueira, o seu representante, integrou a missão da AJEPC em Guangdong, com 68 empresários, e constatou que “os chineses estão muito interessados em fazer negócio com Portugal, mas é preciso dar a conhecer o país”. “O nosso Governo tem de se mexer mais (…) há acordos mal feitos, sentimos dificuldade em entrar em certos mercados”.

A empresa Inovfood, de Lamego, já exporta vinho para a China, mas o diretor, Bruno Cardoso, também considera que a “marca Portugal está mal trabalhada” e que “o facto de não termos queijos, presuntos, compotas na China tem a ver com a falta de trabalho do Governo português”. “Li recentemente que ‘compraram’ o Cristiano Ronaldo para fazer promoção na China, mas se isso tivesse sido feito há cinco anos, se calhar estaríamos ao lado dos franceses”, assinalou.

Ao apontar que esta situação complica o estabelecimento de relações de confiança com os clientes na China, o empresário diz que “é isto que muitas vezes desmotiva os produtores portugueses, pois têm de ir à China cinco, dez vezes”.

Ao alertar que a própria China será “um grande produtor de vinho”, Bruno Cardoso salienta que “enquanto os chineses fazem planos a dez anos, os portugueses fazem a dez dias”. “E isso custa-nos imenso, porque as nossas empresas não param e não mudam com os ciclos políticos”. O empresário sugere a isenção das taxas ou “um acordo para que os produtos entrem por Macau com uma taxa inferior”.

“Julgo que valeria a pena criar um grupo de trabalho plurissetorial que definisse uma estratégia a dez anos para as exportações portuguesas, de modo a sabermos em que mercados apostar”, defendeu ao concluir que “com o produto português, o marketing do Brasil e uma força de vendas espanhola, Portugal conquistava o mundo”.

 

Patrícia Neves

 

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